PF diz que Brazão ameaçou matar familiares de colega: 'Começo por neto'

Domingos Brazão, um dos suspeitos de mandar matar a vereadora Marielle Franco, já ameaçou até familiares de um colega, de acordo com o relatório da Polícia Federal sobre o assassinato. Ele teria dito que mataria um conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro) e sua família.

O que aconteceu

No relatório final do caso Marielle, a PF reuniu denúncias de outros políticos contra os irmãos Brazão. Uma delas é sobre um caso ocorrido em 2017, quando Domingos era conselheiro do TCE-RJ. O órgão é auxiliar do Poder Legislativo e tem como função fiscalizar a movimentação financeira do estado.

Na época, Domingos teria ameaçado de morte outro conselheiro e sua família. José Maurício de Lima Nolasco havia feito um acordo de delação premiada com a PF em uma investigação sobre um esquema de corrupção no tribunal.

Delação levou à investigação de Domingos e de outros conselheiros. A operação Quinta de Ouro apurou que conselheiros do TCE-RJ recebiam propina de empresários para não fiscalizar obras e uso de verbas públicas do governo do Rio de Janeiro.

Domingos teria feito as ameaças a outro colega, enquanto almoçavam. Jonas Lopes de Carvalho Júnior deu depoimento relatando as ameaças que ouviu a Nolasco e sua família.

Se ele fizer isso, ele morre. Eu começo por um neto, depois um filho. Faço ele sofrer muito. Por último, ele morre.
Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, em 2017

O relato de Carvalho Júnior resultou na prisão cautelar de Domingos Brazão, junto com outros quatro conselheiros. Mas ele foi solto e, em 2023, voltou a ocupar cargo no conselho do TCE.

Deputada diz que era ameaçada nos corredores da Câmara

Outro caso apontado pela PF é o da então deputada estadual Cidinha Campos (PDT). Ela relata que Domingos, também deputado na época e insatisfeito com as posições da colega na Câmara, a ameaçava de morte quando eles se cruzavam nos corredores.

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Domingos chamou a deputada de "vagabunda e puta" no plenário, em 2014. Segundo a PF, as ofensas aconteceram durante a discussão de um projeto na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro). A deputada retrucou, dizendo que "é melhor ser puta do que assassino e ladrão", e teria recebido ameaças a partir de então.

Mando matar vagabundo mesmo. Sempre mandei. Mas vagabundo. Vagabunda, ainda não mandei matar.
Domingos Brazão, então deputado estadual do Rio de Janeiro, em 2014

A hoje ex-deputada relembrou as ameaças em participação no UOL News, após a conclusão do inquérito do caso Marielle. "Ele [Domingos] passava por mim e dizia o tempo todo 'eu vou te matar, sua filha da p...". A deputada diz que chegou a andar armada, com medo. "É perigoso ser político", diz.

Quando vi o avião da Polícia Federal e ele [Domingos] descendo a escada, senti um conforto de saber que não foi em vão. Denunciamos tantas coisas erradas que 'não dão em nada', e essa poderia ter sido mais uma. [...] Temo pelo que pode acontecer. Só tenho certeza de uma coisa: eles [irmãos Brazão] são bandidos e merecem estar onde estão hoje. E merecem permanecer, mas não sei se vão permanecer.
Cidinha Campos, ex-deputada estadual do Rio de Janeiro

A ex-deputada, porém, diz que ainda teme a impunidade, devido ao poder político que os irmãos têm. "Não tenho certeza do que vai acontecer daqui para frente com eles, pode não dar em nada", diz.

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Irmãos Brazão e ex-chefe da Polícia Civil estão presos preventivamente. Além do conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado) Domingos Brazão, a PF prendeu ontem seu irmão Chiquinho, deputado federal, e o delegado Rivaldo Barbosa. A PF considera que os três são autores crime, que também matou o motorista Anderson Gomes, em 14 de março de 2018, na região central do Rio.

Procurado pelo UOL para falar sobre as acusações de ameaça, o advogado de Domingos Brazão não respondeu até a publicação deste texto. Ontem, o advogado Ubiratan Guedes afirmou que seu cliente é inocente no caso Marielle.

'Possibilidade de serem soltos é remota'

Risco de os irmãos Brazão interferirem nas investigações agora é menor. Para especialistas, a federalização das investigações distancia a Polícia Civil do Rio de Janeiro do caso. "No Rio, eles conseguiram intervir mais no processo, como vimos com o próprio delegado Rivaldo Barbosa, que investigava o caso e estava envolvido no crime", afirma Alessandra Garcia Lucio, especialista em processo penal pela USP.

A possibilidade de eles serem soltos é muito remota. Agora que o processo está no STF e com a PF, os irmãos Brazão não conseguirão intervir. A articulação dentro da Polícia Civil do RJ dificultava a investigação. Nesses longos cinco anos, antes de o processo ser federalizado, tivemos poucas respostas. Mas assim que o caso foi para a Polícia Federal, ganhou um desfecho, e outros envolvidos devem aparecer.
Alessandra Garcia Lucio, especialista em processo penal pela USP

Mais respostas sobre o caso Marielle devem aparecer a partir da prisão dos irmãos Brazão. "Agora temos os mandantes e quem articulou. As penas devem ser muito altas, já que eles são apontados como mandantes, e isso influencia na decisão de fazer uma delação, para atenuar as penas", diz.

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