Baixo Clero #88: Mortes no Jacarezinho são retrato do Brasil não melhorando
Colaboração para o UOL
29/05/2021 04h00
Para a colunista do UOL Maria Carolina Trevisan, a operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro que deixou 28 mortos na comunidade do Jacarezinho, no dia 6 de maio, mostra que o Brasil não vem melhorando em nada no que diz respeito à violência policial.
Na última quarta-feira (26), o UOL revelou que ao menos dois homens que foram presos na operação relataram em audiência de custódia terem sido obrigados pela polícia a carregar dez corpos em um dos becos da favela.
"Essas cenas me lembram muito o que foi o maior marco de violência policial no nosso país, e talvez uma das mais graves violações dos direitos humanos sobre pessoas sob custódia do Estado, que é o massacre do Carandiru. Essa ideia de pessoas que foram detidas carregando corpos aconteceu também no massacre do Carandiru, que foi em 1992. A gente não melhorou nada", afirmou a colunista durante o episódio desta semana do Baixo Clero, o podcast de política do UOL (veja a partir de 15:54).
Na avaliação de Trevisan, é fundamental entender como o racismo está envolvido em ações como essa. "Num país racista como o nosso, que teve a maior escravidão, a que mais durou no planeta e que mais pessoas trouxe como escravos, a gente precisa considerar que isso é um fator que nos move o tempo inteiro, que existe dentro da nossa sociedade", afirmou (veja a partir de 18:28).
A colunista ainda lembrou que, nesta semana, completou um ano da morte de George Floyd, homem negro que foi assassinado por Derek Chauvin, um ex-policial branco, durante uma abordagem nos Estados Unidos em maio de 2020. Chauvin permaneceu por mais de 9 minutos com o joelho sobre o pescoço de Floyd. O caso foi o estopim para uma série de protestos antirracistas e contra a violência policial contra negros nos Estados Unidos e no mundo.
"Isso lá nos Estados Unidos gerou aquela onda de protestos, mesmo no meio da pandemia, que foi muito importante por uma série de questões, mas primeiro porque foi o motor que derrubou [o ex-presidente] Donald Trump. O Trump era um presidente que negava o racismo. Negando o racismo, você não tem como fazer política pública [contra ele]" (veja a partir de 17:10).
O colunista do UOL Diogo Schelp ponderou ainda que há indicativos de que, desde o início, a investigação sobre o ocorrido no Jacarezinho já tinha um viés.
"A gente precisa lembrar que, logo que aconteceu essa operação policial, quando se revelou que havia tantos mortos, a primeira resposta da Polícia Civil já foi, antes de qualquer investigação, a de que não havia ocorrido nenhum tipo de execução. Inclusive, o delegado que seria responsável por essa investigação já declarou de antemão que não houve execução. Isso já desmoraliza a investigação de cara" (veja a partir de 9:11).
Frigideira
A cada semana, os colunistas do UOL Maria Carolina Trevisan e Diogo Schelp escolhem o personagem da política nacional que merece ir para a frigideira. Neste programa, os eleitos foram o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli e o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
A motivação da escolha de Schelp foi o resultado de um julgamento do Supremo que anulou a delação do ex-governador do Rio Sérgio Cabral.
Nela, o ex-governador implicava uma série de autoridades —entre elas, o próprio Toffoli, a quem acusava de ter vendido decisões judiciais à época em que presidiu o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), de 2014 a 2016. Apesar de ser citado na delação, Toffoli não se declarou impedido e votou no julgamento.
"A decisão já era favorável à anulação da delação. E o ministro Toffoli, mesmo assim, deu seu voto pela anulação, o que ensejou até críticas por parte do ministro Marco Aurélio Mello, chamando isso de julgar em causa própria", afirmou (veja a partir de 46:42).
Para Schelp, a atitude de Toffoli descredibiliza a imagem do STF. "O Cabral, por vários motivos, entre eles ter centenas de anos de condenação por corrupção, já é considerado alguém sem credibilidade nenhuma. Mas evidentemente esse tipo de situação enseja aqueles argumentos contrários ao STF, aquelas críticas de que o STF julga em causa própria, de que é corporativista e assim por diante. Foi totalmente desnecessário, ele [Toffoli] poderia ter se declarado impedido de dar esse voto" (veja a partir de 47:47).
Já a colunista do UOL Maria Carolina Trevisan optou pelo nome de Queiroga porque o ministro, segundo ela, vem cumprindo com um papel de "propaganda" que não condiz com a realidade do país.
"[Queiroga] Está aí na maior propaganda de 600 mil vacinas que chegam no Brasil —600 mil vacinas são gastas em um dia de vacinação no nosso país", disse ela (veja a partir de 49:01).
"Hoje, por exemplo, ele estava em um carro e aí ele anuncia que o presidente Jair Bolsonaro determinou que os professores entrem na lista de prioritários para vacinar, como se isso não tivesse sido muito mais fruto de uma pressão do que do próprio Bolsonaro. Nunca vi Bolsonaro falar de professores na vacinação", ponderou (veja a partir de 49:26).
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