Topo

Jamil Chade

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

ONU considera abrir inquérito contra Rússia e Brasil terá de se posicionar

Retrato de Putin é manchado com tinta vermelha durante protesto do lado de fora da Embaixada da Rússia, em Bucareste, na Romênia - Inquam Photos/Reuters
Retrato de Putin é manchado com tinta vermelha durante protesto do lado de fora da Embaixada da Rússia, em Bucareste, na Romênia Imagem: Inquam Photos/Reuters

Colunista do UOL

01/03/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O Conselho de Direitos Humanos da ONU irá avaliar na próxima quinta-feira (3) um projeto de resolução que vai propor a criação de uma comissão internacional de inquérito para examinar os crimes cometidos na Ucrânia.

O texto do projeto, obtido pela reportagem do UOL, foi elaborado pela diplomacia ucraniana e conta com apoio de países ocidentais. Negociadores de Kiev que conversaram com a coluna explicaram que "ainda precisam trabalhar" para conseguir o apoio do Brasil. Mas afirmam estar confiantes na aprovação do texto.

Se criada, a comissão amplia a pressão internacional contra o governo de Vladimir Putin. Mecanismos parecidos existem apenas para casos como a Síria, Coreia do Norte, Mianmar ou Venezuela.

Se o governo brasileiro vinha tentando se equilibrar entre uma postura de evitar críticas diretas a Vladimir Putin e outra de manter sua tradicional linha de defesa do direito internacional, a nova resolução pressionará Brasília a tomar uma decisão.

O Itamaraty já deixou claro que teme que sanções, envio de armas e um isolamento total de Moscou possa ampliar a guerra, e não a frear.

Além de condenar os russos e pedir a retirada imediata das tropas, a principal inovação do texto submetido à ONU é o estabelecimento de um mecanismo de investigação.

No rascunho do projeto, os governos decidem "estabelecer urgentemente uma comissão de inquérito internacional independente, constituída por três especialistas em direitos humanos, a ser nomeada pelo Presidente do Conselho de Direitos Humanos por um período inicial de um ano".

Na prática, a iniciativa coloca a Rússia sob exame permanente por um período longo. A comissão teria como função "investigar todas as alegadas violações e abusos dos direitos humanos e violações do direito humanitário internacional na Crimeia e em certas áreas das regiões de Donetsk e Luhansk desde 2014 e em outras áreas da Ucrânia desde 22 de fevereiro de 2022".

Caberá à comissão "estabelecer os fatos e circunstâncias que podem significar violações e abusos dos direitos humanos ou violações do direito humanitário internacional na Ucrânia".

Para isso, terão de "coletar, consolidar e analisar provas de tais violações e abusos, e sistematicamente registrar e preservar todas as informações, documentação e provas, incluindo entrevistas, depoimentos de testemunhas e material forense, de acordo com os padrões do direito internacional".

Um dos objetivos poderia ser o uso desses dados em qualquer processo legal futuro em tribunais ou tribunais nacionais, regionais ou internacionais.

A comissão ainda terá a missão de "identificar, quando possível, os responsáveis por violações ou abusos dos direitos humanos ou violações do direito humanitário internacional na Ucrânia, com o objetivo de garantir que os responsáveis sejam responsabilizados".

A resolução, se aprovada, dará poderes para que a comissão apresente recomendações para responsabilizar de forma criminal e individual os autores de violações de direitos humanos. Ou seja, abre-se a possibilidade de uma denúncia direta de generais, ministros e do presidente Vladimir Putin.

Também pede-se a operacionalização imediata do mandato e solicita ao Secretário-Geral da ONU que forneça todos os recursos necessários para permitir que a Comissão de Inquérito cumpra seu mandato.

De acordo com fontes na ONU, governos como o de Cuba, Venezuela e outros não apoiarão o texto, enquanto Europa e EUA tentarão reunir votos suficientes para garantir a aprovação do projeto.