Maduro revoga custódia do Brasil em embaixada, mas governo Lula não cede
O governo de Nicolás Maduro decide revogar, de forma unilateral, a custódia do Brasil da embaixada da Argentina em Caracas. O gesto foi tomado depois que o local passou a ser cercado por agentes das forças de ordem a partir da noite desta sexta-feira (6).
O local, que abriga venezuelanos membros da oposição, foi assumido pelo governo brasileiro há poucas semanas, como forma de evitar uma crise ainda mais grave entre os países da região.
O UOL apurou que, diante da situação, a Secretaria Geral do Itamaraty se reuniu em caráter de emergência na noite de sexta-feira para avaliar a situação. O caso ainda está sendo tratado entre a Presidência, o chanceler Mauro Vieira, que está em Omã, e a Secretaria Geral.
De acordo com o Itamaraty, o governo Maduro confirmou a retirada do status do Brasil num comunicado oficial para Brasília. A chancelaria brasileira respondeu, alegando que esperaria a designação de um novo país para assumir a responsabilidade. Ou seja, não iria simplesmente sair.
A atitude de Maduro se contrasta com sua própria postura quando, no começo do ano, denunciou o governo do Equador por invadir a embaixada do México em Quito. Na época, o argumento era de que tal postura violava o direito internacional e os acordos diplomáticos. Como resultado da invasão, Maduro fechou em abril sua embaixada e consulados em Quito, em protesto.
A chancelaria explicou que um gesto unilateral não basta para que essa custódia seja revogada e que o Brasil continua assumindo a responsabilidade pelo local. Pelas regras diplomáticas, o Itamaraty se mantém nesta posição até que um novo governo seja designado para ocupar o local— isso precisa ocorrer em comum acordo entre Argentina e Venezuela, além do próprio Brasil.
Segundo o governo Lula, o Brasil vai continuar representando os interesses e protegendo os refugiados até que se designe um país substituto. A meta é de que não haja um vácuo na situação de inviolabilidade das sedes diplomáticas.
Embaixadores, porém, admitem que não sabem se Maduro vai seguir os protocolos internacionais da diplomacia.
Num comunicado emitido neste sábado, governo brasileiro afirmou que "recebeu com surpresa a comunicação do governo venezuelano de que tenciona revogar o seu consentimento para que o Brasil proteja os interesses da Argentina na Venezuela".
"De acordo com o que estabelecem as Convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas e sobre Relações Consulares, o Brasil permanecerá com a custódia e a defesa dos interesses argentinos até que o governo argentino indique outro Estado aceitável para o governo venezuelano para exercer as referidas funções", explicou.
O governo brasileiro ainda ressaltou "a inviolabilidade das instalações da missão diplomática argentina, que atualmente abrigam seis asilados venezuelanos além de bens e arquivos".
O cerco aumenta a tensão diplomática e passa a ser acompanhado de perto pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O gesto ocorre ainda depois da ordem de captura lançada pela Justiça venezuelana contra o candidato da oposição, Edmundo González.
Nesta semana, foi o governo da Argentina que enviou ao Tribunal Penal Internacional um pedido para que haja uma ação para solicitar a prisão de Maduro.
A oposição venezuelana, nas redes sociais, também denunciou que forças de segurança estão cercando o local. Pedro Noselli, coordenador de internacional da líder opositora María Corina Machado, divulgou a situação nas redes sociais. O homem, que está asilado no local, relatou que homens encapuzados e armados estavam cercando a embaixada por volta das 20h30 (horário local; 21h30, no horário de Brasília).
Às 23h20 (horário de Brasília), Pedro Noselli publicou outro vídeo no Instagram para mostrar a movimentação ao redor da embaixada. Segundo o coordenador, mais agentes encapuzados e armados, e patrulhas chegam ao local. No registro, é possível visualizar ao menos seis carros em movimento e o que seria uma viatura com o giroflex ligado.
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JAMIL CHADE
Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente.
Quero receberNo Instagram, Corina compartilhou o primeiro relato do coordenador no X (antigo Twitter) e um vídeo publicado por Noselli.
Asilado no local, Omar Gonzalez Moreno, aliado de Corina e membro da direção nacional do partido opositor Vente Venezuela, também divulgou um vídeo nas redes sociais e informou que a energia da embaixada foi cortada.
Na manhã deste sábado, policiais continuavam nos portões principais da embaixada, enquanto viaturas eram estacionadas nos muros do prédios.
Segundo os venezuelanos dentro da embaixada, perto do meio dia do horário de Caracas houve um número cada vez maior de agentes encapuzados, com barreiras numa das vias de acesso. O local continuava sem eletricidade.
Como começou a crise?
Logo depois da eleição de 28 de julho, o governo Maduro expulsou os diplomatas argentinos de Caracas. O gesto ocorreu por conta da reação do governo de Javier Milei de não reconhecer a suposta vitória de Maduro e insistir que o pleito havia sido alvo de fraude.
Mas dentro da embaixada estavam seis membros da oposição venezuelana, foragidos da justiça venezuelana.
Na prática, a expulsão dos diplomatas significava que o governo Maduro poderia romper a inviolabilidade da embaixada e capturar os opositores.
Para evitar uma crise ainda mais grave, o governo brasileiro fechou um acordo no qual passou a assumir os interesses da Argentina em Caracas, inclusive da estrutura da embaixada. O Brasil fez o mesmo com a embaixada do Peru, depois da expulsão dos diplomatas daquele país, pelos mesmos motivos.
Ficou estabelecido que, a partir daquele momento, aquela era também uma área brasileira e que continuava fora do alcance das forças de ordem de Maduro. Até mesmo uma bandeira brasileira chegou a ser colocada no local por alguns dias.
Mas a pressão de Maduro contra a oposição levou a uma ação, uma vez mais, contra a embaixada.
O que diz o governo brasileiro
O governo brasileiro indicou que continua representando os interesses da Argentina em Caracas. O posicionamento do Itamaraty é de que se a Venezuela quiser revogar a autorização, tem de esperar a definição de um país substituto. Até lá, o governo Lula garante que continua a assumir essa responsabilidade.
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