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Chefe do PCC em Santos e líderes da máfia italiana contratam mesmo advogado

André do Rap (esq.), acusado de ser chefe do PCC, e Patrick Assisi (dir.), acusado de ser da máfia italiana "Ndrangheta - Reprodução
André do Rap (esq.), acusado de ser chefe do PCC, e Patrick Assisi (dir.), acusado de ser da máfia italiana 'Ndrangheta Imagem: Reprodução

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

14/05/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Brasileiro André de Oliveira Macedo, 42, e italianos Nicola Assisi, 61, e Patrick Assisi, 37, têm os mesmos advogados contratados no Brasil
  • Eles são suspeitos de chefiar a exportação de drogas para a Itália a partir de Santos
  • Santos é considerada a principal cidade do mundo para o PCC e a máfia italiana 'Ndrangheta
  • A contratação do mesmo escritório não é ilegal. Interlocutores dos acusados dizem ser uma coincidência, mas investigadores negam

Investigações brasileiras e europeias apontam Santos como a principal cidade do mundo para os negócios entre a facção criminosa brasileira PCC (Primeiro Comando da Capital) e a máfia italiana 'Ndrangheta, considerada a maior organização criminosa do planeta atualmente. É de lá que partem, por meio de navios de carga, grandes remessas de cocaína para países da Europa, África e Ásia. Os três homens apontados como os principais chefes desse negócio têm no Brasil o mesmo escritório de advocacia contratado, o Malavasi Sociedade de Advogados.

São eles o paulista André de Oliveira Macedo, 42, o André do Rap, acusado de chefiar o PCC em Santos desde fevereiro de 2018, mas detido em setembro do ano passado e recluso atualmente na penitenciária 2 de Presidente Venceslau (SP), e os italianos Nicola Assisi, 61, e Patrick Assisi, 37, acusados pelo governo italiano de serem os principais chefes da 'Ndrangheta na América do Sul, mas detidos na Praia Grande (SP) em julho de 2019 e aguardando processo de extradição no presídio federal de Brasília.

A contratação do mesmo escritório não é ilegal. Segundo interlocutores dos três, trata-se de uma coincidência, uma vez que o escritório tem uma lista de clientes acusados de integrar organizações criminosas. Inclusive, afirmam que a convivência entre o chefe brasileiro e os dois italianos não era boa. Porém, investigadores discordam que seja coincidência.

Entre a cartela de clientes dos mesmos advogados estão outros homens apontados como líderes importantes do PCC, a exemplo de Elton Leonel Rumich da Silva, o Galã, que atuava pela facção na fronteira do Brasil com o Paraguai, mas também há policiais militares acusados de homicídio e até Edinho, filho de Pelé. Um interlocutor comparou o escritório com uma clínica cardiologista: "se você estiver mal do coração, vai procurar a melhor clínica".

O advogado Eugênio Malavasi disse não que não falaria com a reportagem sobre a defesa dos três homens, por não estar mais nos processos de conhecimento de André do Rap, apenas no de execução penal.

Sócio de Malavasi, o advogado Patrick Raasch Cardoso disse que conversaria com seus clientes antes de se posicionar a respeito. Não houve retorno até esta publicação.

Conexão Santos-Gioia Tauro

Para operar no Brasil, a 'Ndrangheta estabeleceu acordos com o PCC. Em dois anos, ao menos três homens com cargos de liderança na máfia italiana estiveram com chefes da organização brasileira, incluindo Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, preso em 13 de abril deste ano em Moçambique. Polícias europeias suspeitam que outros dois mafiosos italianos também estão, ou pelo menos passaram por São Paulo, nos últimos anos com a mesma finalidade.

Os Assisi, segundo a Polícia Civil de São Paulo, negociavam drogas junto a Fuminho, que não é considerado integrante do PCC, mas sócio e braço direito de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, apontado como chefe do grupo. Fuminho seria o principal fornecedor de drogas — que chegam de países como Peru, Bolívia, Colômbia e Paraguai — para o PCC. Em Santos, a polícia diz que André do Rap era a ponte entre os italianos e Fuminho.

O cargo de quem chefia o PCC em Santos é considerado de extrema confiança. Por ser uma região estratégica para o tráfico internacional de drogas feito pelo PCC, Santos era administrada até 2018 por Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, assassinado em fevereiro de 2018, quando tinha 41 anos. Segundo investigação da Promotoria paulista, ele morreu por desviar dinheiro proveniente do tráfico de drogas na cidade. O homicídio surpreendeu, à época, a polícia paulista, uma vez que Gegê do Mangue era tido como o principal chefe da facção paulista em liberdade.

Segundo investigações brasileiras, desde que houve o homicídio de Gegê do Mangue, André do Rap passou a ser o chefe do PCC na "célula porto" da facção, administrando a exportação da cocaína em Santos.

De acordo com investigações italianas, Nicola e Patrick Assisi eram os responsáveis por negociar a compra da cocaína que partia de Santos para a Europa, sobretudo na conexão entre os portos de Santos e de Gioia Tauro, no sul da Itália.

Apontou a investigação italiana que, em um período de apenas quatro meses, a organização brasileira "enviou à Itália no total 919 quilos de cocaína, dos quais foram apreendidos 419 quilos. O entorpecente, escondido nos contêineres embarcados nos navios da MSC para o porto de Gioia Tauro, e sucessivamente subdividido entre os clientes calabreses que administram o mercado de cocaína". A MSC disse que colabora com as investigações de todas as autoridades competentes.

Segundo Gaetano Paci, procurador antimáfia da Calábria, "há muitas evidências de uma relação entre a 'Ndrangheta, que atua no cenário internacional, e narcotraficantes sul-americanos, porque muitas cargas de cocaína partem precisamente de portos brasileiros e muitas desembarcam em Gioia Tauro, um dos maiores portos do Mediterrâneo e que é controlado pela 'Ndrangheta".

Ouça também o podcast Ficha Criminal, com as histórias dos criminosos que marcaram época no Brasil. Esse e outros podcasts do UOL estão disponíveis em uol.com.br/podcasts, no Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e outras plataformas de áudio.