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Diálogos por rádio mostram ação de grupo em roubo de Araçatuba, diz polícia

30.ago.2021 - Vídeo mostra o marceneiro Clayton Teixeira mexendo em bombas deixadas por bandidos pouco antes de ser atingido por explosão em Araçatuba (SP) - Reprodução/Câmera de segurança
30.ago.2021 - Vídeo mostra o marceneiro Clayton Teixeira mexendo em bombas deixadas por bandidos pouco antes de ser atingido por explosão em Araçatuba (SP) Imagem: Reprodução/Câmera de segurança

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

13/12/2021 04h00Atualizada em 13/12/2021 13h51

Diálogos captados por interferência de rádio amador mostram como agiu a quadrilha que atuou em um mega-assalto em Araçatuba (SP) na madrugada de 30 de agosto, aponta investigação conduzida pela Polícia Federal.

A troca de mensagens —obtida pelo UOL— revela como o grupo discutiu imprevistos, como o resgate de um homem baleado com auxílio de drone, a logística de fuga com monitoramento de comparsas a pé e até mesmo o deslocamento dos suspeitos pela cidade.

Uma das mensagens é atribuída pelos investigadores ao ex-militar Ademir Luís Rondon, apontado como um dos chefes do ataque e identificado devido à coleta de material genético em um dos veículos usados no crime, encontrado com explosivos e armas de grosso calibre em frente a uma instituição financeira.

"É a voz dele. O ex-militar estava dentro do veículo quando um indivíduo foi baleado. Ele era o principal encarregado pelos explosivos do grupo e estava perto de uma agência bancária", afirmou o delegado Pedro Ivo Corrêa dos Santos, da 5ª Delegacia de Investigações sobre Furtos e Roubos a Banco, unidade do Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) da Polícia Civil responsável pela captura do ex-sargento.

De acordo com a polícia, a quadrilha agia aos moldes do "novo cangaço", tática também conhecida como "domínio de cidades", que costuma ocorrer em municípios de pequeno ou médio porte, onde criminosos com fuzis e explosivos dominam as forças de segurança, roubam as instituições financeiras e fazem moradores reféns em ações marcadas pela escalada da violência nos últimos meses.

A reportagem do UOL ligou para os escritórios de dois advogados vinculados a Rondon em processos anteriores, mas não obteve retorno.

Uso de drone em fuga, 'resgate' e monitoramento

"Levanta o drone e vamos embora! Parceiro está baleado", disse um dos envolvidos no roubo. Segundo as investigações, era o ex-sargento do Exército, preso pela Polícia Civil no fim de outubro por suspeita de envolvimento em uma tentativa de assalto a um carro-forte no pedágio de São Carlos (SP) com o uso de explosivos, em abril.

Apesar da voz de liderança, a ordem foi contestada pelo comparsa, ainda não identificado. "Nós vai [sic] levantar o drone na hora que nós for [sic] sair. Não adianta levantar o drone e depois não conseguir levantar mais pra nós [sic] sair", respondeu, enquanto outros criminosos de menor escalão davam cobertura para a ação portando fuzis, diz a polícia.

Nas mensagens, o grupo cita o drone, que monitorou toda a ação de um roubo planejado para arrecadar ao menos R$ 90 milhões em uma central de distribuição de cédulas, apontam os investigadores.

Outro criminoso também se refere a um episódio envolvendo um ferido. Mas não é possível afirmar que os suspeitos citam o mesmo caso. "Vamos embora! Tá baleado lá". Um vídeo obtido pelo UOL mostrou o momento em que o suspeito foi atingido enquanto mantinha reféns.

Também por rádio, o suspeito discute o resgate de um comparsa com refém, fazendo analogia à hierarquia com base em linguagem militar para identificá-lo. "Zero três tá de a pé [sic] com o refém. Quem mais vai resgatar o zero três lá?", pergunta. Outro homem complementa, reforçando o alerta: "Tem um parceiro que tá sem carro".

PF prendeu ao menos 16 suspeitos por roubo

Segundo a PF, ao menos 16 pessoas com suspeita de participação no crime já foram presas. No fim de outubro, agentes cumpriram um mandado de prisão temporária na cidade de Guararapes (SP). A identidade do suspeito, contudo, foi preservada.

Um dos suspeitos de liderar a organização foi preso na fronteira do Brasil com o Paraguai. Anderson Meneses de Paula, o "Tuca", foi um dos quatro alvos de uma operação contra o tráfico na divisa entre Ponta Porã (MS) e Pedro Juan Caballero, no país vizinho.

Ele é suspeito de participar da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), que atua dentro e fora de presídios brasileiros, junto a um outro preso preventivamente na ação: William Meira do Nascimento, o "Bruxo".

Como foi a ação em Araçatuba

De acordo com a SSP (Secretaria de Segurança Pública), foram deixados explosivos em ao menos 14 pontos em Araçatuba (SP), para o assalto. Um deles foi detonado quando um homem de 25 anos passou pelo local. A vítima sofreu amputações nos dois pés e teve dedos das mãos cortados.

O alvo principal era uma central dentro de uma unidade do Banco do Brasil com ao menos R$ 90 milhões em cédulas armazenadas —uma espécie de reserva para agências bancárias. Mas um mecanismo de segurança explodiu e destruiu o dinheiro.

Os criminosos invadiram outras duas agências. A estimativa é que tenham arrecadado R$ 2 milhões em dinheiro e outros R$ 5 milhões em joias.

A ação deixou três mortos e quatro feridos. Na fuga, os criminosos incendiaram veículos em pontes de acesso à cidade, para isolar o local. Artefatos de metal conhecidos como "miguelitos" foram deixados nas pistas para furar pneus de veículos para dificultar a ação da polícia.

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