André Santana

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Opinião

'Bahia petista é locomotiva do genocídio negro', diz advogado e ex-petista

Em discurso no Rio de Janeiro, o presidente Lula (PT) criticou o preparo dos policiais no combate ao crime. Enquanto isso, na Bahia, o governador petista Jerônimo Rodrigues fala em "equívocos" e promete apurar "eventual excessos" — depois de 31 assassinatos em operações policiais no estado entre 28 de julho e 4 de agosto.

Com o crescimento da letalidade destas operações desde 2015, a Bahia superou o Rio de Janeiro — em 2022, passou a ocupar o primeiro lugar no ranking nacional das polícias que mais matam.

O governador reuniu a equipe, nesta quarta (9), no Farol da Barra, cartão postal de Salvador, para anunciar mais viaturas e a convocação de policiais da reserva para retornarem ao trabalho.

As medidas foram criticadas por ativistas e entidades que denunciam a persistência na política ineficaz de confronto, que tem gerado ainda mais violência e morte de inocentes em comunidades pobres.

Em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, governados por partidos de direita, o Partido dos Trabalhadores se une aos movimentos sociais para denunciar a violência policial e exigir respeito aos direitos humanos.

Sem plano concreto para a violência policial

Na quinta (10), ao fazer referência à morte de Thiago Menezes Flausino, 13, Lula disse que a polícia precisa estar preparada para "saber diferenciar o que é um bandido e o que é um pobre que anda na rua" e defendeu que os policiais tenham treinamento adequado e preparo psicológico.

Foi a primeira vez que Lula falou sobre as mortes em ações policiais que ocorreram nas últimas semanas. Ele e a maioria dos ministros têm evitado falar sobre as chacinas — o governo ainda não tem planos concretos para o combate à violência policial.

Um cidadão que atira num menino que já estava caído não estava preparado do ponto de vista psicológico para ser policial.
Lula

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O governador da Bahia, do mesmo partido do presidente, esperou por mais de uma semana para se posicionar sobre as 31 mortes que ocorreram na região metropolitana de Salvador.

O ministro dos Direitos Humanos e Cidadania do Governo Lula, Silvio Almeida, afirmou, no último fim de semana, que as mortes na Bahia não são compatíveis com um país que se pretende democrático. O ministro informou que acionou a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos para acompanhar os casos.

Governador Jerônimo Rodrigues (PT) e vice, Geraldo Junior (MDB), lançaram mais viaturas: reforço do efetivo é aposta no confronto
Governador Jerônimo Rodrigues (PT) e vice, Geraldo Junior (MDB), lançaram mais viaturas: reforço do efetivo é aposta no confronto Imagem: Matheus Landim/GOVBA

Ex-dirigente petista acusa genocídio da política de segurança na Bahia

O PT iniciou o quinto mandato consecutivo no governo da Bahia. As gestões de Jaques Wagner, atual senador, e de Rui Costa, ministro da Casa Civil do novo governo Lula, não conseguiram controlar a violência no estado, que nos últimos anos registrou números alarmantes, levando as organizações e ativistas considerarem um genocídio.

Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam que a violência policial quadruplicou na Bahia entre 2015 e 2022.No ano passado, o estado registrou 1.464 pessoas mortas em intervenções policiais — o que representa 22,7% do total nacional.

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Estudo realizado pela Rede de Observatórios de Segurança, denominado "Pele alvo: a cor que a polícia apaga", indica que de cada 100 mortos pela polícia baiana, 98 são pessoas negras. Em Salvador, este índice chega a 100%.

Bahia petista é locomotiva do genocídio negro, afirma o advogado Samuel Vida, professor e coordenador do programa Direito e Relações Raciais da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Samuel Vida militou no PT por 33 anos (entre 1983 e 2016) e disse à coluna que se desfiliou por divergências com as políticas de segurança.

Para ele, as gestões petistas no governo da Bahia, iniciadas em 2007, foram conduzidas com a "adesão ao modelo penal do populismo punitivista, materializado, sobretudo, na falácia da 'guerra às drogas' e na explícita orientação da atividade policial para o confronto, como estratégia política", apontou o advogado.

Sobre o anúncio feito pelo governador, de mais viaturas e aumento do efetivo policial, Samuel considera que é "a reafirmação da política de confronto e letalidade que tem motivado a violência policial generalizada nas comunidades negras. Ou seja, o governador aponta para a continuidade da política genocida".

O advogado participou do debate "Atual Estado de Insegurança Pública e o Equívoco da Política de Enfrentamento", organizado pelo Setorial de Segurança Pública do PT Bahia, que reuniu militantes do partido, pesquisadores, representantes comunitários e dos policia, além de ex-filiados à sigla, em duras críticas à Política de Segurança Pública adotada na Bahia.

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"Não estamos aqui para passar pano", disse a socióloga Vilma Reis, pré-candidata petista à Prefeitura de Salvador, em 2020. Ela chamou atenção para o constrangimento que o partido passa, ao criticar a atuação de outros governos na área da Segurança Pública e falhar gravemente na Bahia.

No debate também houve críticas à demora do governador Jerônimo Rodrigues em dar uma resposta em relação à atuação da Polícia Militar, diante das 31 mortes em operações policiais em apenas oito dias.

Governador falou em "eventual excesso" e equívocos e prometeu apuração

Jerônimo havia utilizado as redes sociais no início na semana para falar em "apuração de eventual excesso" e do diálogo estabelecido com o governo federal e com órgãos do sistema de justiça.

Nesta quarta, contudo, o governador petista preferiu o midiático cenário do Farol da Barra para anunciar a entrega de 84 novas viaturas e a convocação de 550 policiais da reserva como estratégia para aumentar o efetivo nas ruas.

"Nós não queremos que a nossa Polícia, em hipótese alguma, nem morra, nem mate. Firmo aqui e registro meu sentimento às vítimas de balas, seja do destino qual for. Todos os casos nossos nós apuramos. A Comissão de Ética e a Corregedoria da Polícia Militar e da Polícia Civil têm sido rigorosas nisso. Não tem proteção para aqueles que se equivocam", disse Jerônimo Rodrigues.

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O governador prometeu firmeza: "A nossa atuação será sempre firme, será sempre segura, mas em defesa da vida. Que ninguém duvida da postura do governador em relação à defesa dos direitos humanos", afirmou Jerônimo Rodrigues.

Histórico de ações governamentais, segundo advogado

Apesar do número alarmante mortes nos últimos dias, Samuel Vida diz que essa não é uma semana atípica na Bahia, mas o retrato de uma realidade que pesquisas de monitoramento vêm revelando e que movimentos têm denunciado desde o início da gestão petista no estado.

Samuel Vida citou um longo histórico de ações governamentais que, segundo ele, conduziram a Bahia à crise vivida atualmente, incluindo a criação e ampliação de unidades especializadas em confronto e de alta letalidade, como a Rondesp, a Patamo, o Bope e a Peto.

Além da implantação imediata das câmeras nos uniformes policiais, Samuel defende maior investimento na investigação, com o fortalecimento da Polícia Civil, que, na avaliação do professor, vem sendo desprestigiada pela gestão petista, em reforço à ação ostensiva da Policial Militar.

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"É preciso admitir o fracasso desta política de guerra às drogas e o reconhecimento do problema, por parte do governo, com a montagem de um gabinete de crise, com escuta de especialistas, ouvidoria externa e auditoria independente das mortes", cobra Samuel Vida.

Também presente ao debate promovido pelo setorial petista, Denilson Neves, policial civil e um dos fundadores do Movimento Policiais Antifascismo, criticou o tratamento dado pelas gestões petistas ao trabalho de inteligência e investigação da Polícia Civil.

"O governador Jaques Wagner retirou a autonomia do Gerce (Grupo Especial de Repressão aos Crimes de Extermínio), que investigava a atuação de mais de 30 grupos de extermínio no estado, com presença de policiais", disse Neves, que atua há 25 anos na Polícia Civil da Bahia.

O advogado Samuel Vida, professor e coordenador do programa Direito e Relações Raciais da UFBA
O advogado Samuel Vida, professor e coordenador do programa Direito e Relações Raciais da UFBA Imagem: Acervo pessoal

Manifesto lista casos de violência policial e chacinas nas gestões do PT na Bahia

Um manifesto assinado pelo Aganju (Afro Gabinete de Articulação Institucional e Jurídica), fundado em 2001, por Samuel Vida, se posiciona sobre o agravamento das ações policiais letais na Bahia nas últimas semanas.

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Além de listar uma série de assassinatos e chacinas ocorridos no estado, como a Chacina do Cabula (2015) e da Gamboa (2022), o documento cobra medidas urgentes de reorientação da política de segurança pública e rigorosa investigação imparcial e responsabilização dos envolvidos em atos ilegais em toda a extensão da cadeia de comando.

"Se impõe como imperativo ético-político a resistência, a mobilização e o apoio às vítimas e seus familiares, que além da dor da perda ainda se deparam com a criminalização indevida de seus entes queridos (...). O genocídio negro nunca é um problema paroquial, pois fere cada pessoa e cada comunidade negra em todo o Brasil e em todo o mundo. Por isso, esta denúncia deve reverberar nacional e internacionalmente", cobra o documento.

Dezenas de entidades do movimento negro da Bahia estão organizando um ato contra o genocídio do povo negro e pelo fim da violência policial, tendo como cobrança central as câmeras nos fardamentos policiais. Será dia 18 de agosto, às 9h, no Centro de Salvador. "Polícia, o que você tem a esconder?" é a pergunta que as organizações pretendem fazer nas ruas da capital baiana.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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