Jamil Chade

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Ameaça de veto russo e impasse adiam voto de projeto do Brasil na ONU

O governo brasileiro adiou para quarta-feira a votação de sua resolução no Conselho de Segurança da ONU, depois que ficou claro o risco de que o texto seria vetado pelos russos. O cancelamento da reunião marcada inicialmente para esta terça coincide com o impacto político dos ataques contra um hospital e uma escola em Gaza — ao menos 500 pessoas morreram no hospital.

O Itamaraty acredita que pode conseguir um acordo para aprovar o texto. Mas, por enquanto, não convenceu os russos a apoiar a resolução. Com as mortes que se acumulam em Gaza devido ao ataque contra um hospital, o debate político ganhou uma dimensão ainda mais tensa e, segundo diplomatas europeus, também atrapalhou as negociações.

Ontem, uma resolução apresentada pela Rússia e apoiada pelas autoridades palestinas e países árabes foi vetada pelos governos ocidentais que fazem parte do Conselho de Segurança da ONU. EUA, Reino Unido e França, além do Japão, votaram contra, derrubando qualquer chance de o projeto russo prosperar.

O texto pedia o estabelecimento de um cessar-fogo imediato. Entretanto, não condenava explicitamente o Hamas pelos atos terroristas de 7 de outubro, em Israel.

O texto proposto pelo Brasil

O Itamaraty tentou agradar os ocidentais, condenando o Hamas pelo ato e pedindo a libertação imediata dos reféns israelenses.

Inicialmente, o Brasil propunha um "cessar-fogo humanitário". Mas o termo foi alvo de resistência por parte dos americanos. A nova versão do Itamaraty falava apenas em uma "pausa humanitária" e o acesso de ajuda ao território de Gaza.

O projeto também incluiu uma referência crítica contra o ultimato dado por Israel para que os palestinos deixem o norte da Faixa de Gaza, na esperança de agradar russos e chineses.

Rússia quer emendar projeto brasileiro

A delegação russa, porém, alertou que o projeto brasileiro estava sendo "esvaziado" por parte das potências ocidentais, mensagem recebida como um alerta de que Moscou e Pequim poderiam não aceitar a resolução.

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O Kremlin ainda apresentou duas emendas ao texto e espera que sejam votadas. Ambas iriam contra os interesses dos americanos, ao recolocar o termo "cessar-fogo" e pedir uma condenação contra Israel por seus ataques sobre Gaza.

A decisão dos diplomatas brasileiros, portanto, foi a de iniciar um novo processo de consultas e negociações para ampliar a base de apoio ao texto e impedir um veto.

O UOL apurou que o projeto brasileiro é considerado até mesmo pelo secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, como fundamental para salvar a credibilidade da instituição diante da crise.

Mas, para isso, o Brasil tenta encontrar uma fórmula que:

  • não isole Israel;
  • atenda aos desejos das potências ocidentais;
  • seja suficiente para que os governos árabes se sintam considerados;
  • resulte em ação para proteger os palestinos;
  • não haja uma sensação por parte de russos e chineses de que foram derrotados.

A esperança do Itamaraty é de que, nas próximas horas, um novo projeto possa ser desenhado e submetido ao voto.

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O temor é que um novo fracasso do Conselho de Segurança coloque o órgão numa situação de completo descrédito, diante de uma das semanas mais violentas em décadas no conflito no Oriente Médio.

Um impasse ainda mandaria um sinal às partes beligerantes de que poderiam manter suas estratégias de guerra.

"Catástrofe total"

Enquanto as negociações ocorrem de forma sigilosa, a ONU alerta aos governos de que a situação de Gaza piora a cada hora que passa.

Numa reunião nesta tarde, em Nova York, Joyce Msuya, representante da ONU para Coordenação Humanitária, explicou aos governos que "a situação, que continua a se desenrolar neste momento, só pode ser descrita como uma catástrofe total".

"Em apenas 10 dias, desde que os militantes do Hamas atacaram Israel em 7 de outubro, o número de mortos já ultrapassou o das hostilidades de 2014, que duraram mais de 7 semanas", disse.

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Até o momento, mais de 2.800 palestinos foram mortos, mais de 10.850 ficaram feridos e acredita-se que centenas estejam presos sob os escombros.

As autoridades israelenses também já confirmaram que 1.300 israelenses foram mortos e mais de 4.100 ficaram feridos. Cerca de 200 permanecem em cativeiro.

De acordo com ela, nem os trabalhadores de agências humanitárias foram poupados. "Quinze funcionários da UNRWA e cinco do Movimento da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho foram mortos. As instalações da ONU estão entre o grande número de objetos civis danificados", disse.

"Com a escalada das hostilidades, esses números só aumentarão, e uma situação humanitária já terrível continuará a se deteriorar", alertou.

Segundo Joyce, estima-se que cerca de 1 milhão de pessoas tenham fugido de suas casas para outras partes de Gaza. "Na realidade, os civis não têm para onde ir - nenhum lugar para escapar das bombas e mísseis, nenhum lugar para encontrar água ou comida, ou para escapar da catástrofe humanitária que se desenrola", lamentou.

"À medida que os civis são amontoados em uma área cada vez menor, os itens essenciais de que precisam para sobreviver - abrigo, água, alimentos, energia e assistência médica - praticamente acabaram", disse.

A representante da ONU ainda apontou que as escolas da UNRWA abrigam mais da metade da população deslocada no centro-sul de Gaza. "A UNRWA está fazendo o que pode para atender às crescentes necessidades, mas sua capacidade está no limite máximo. Sem mais combustível, ela só conseguirá operar as pequenas usinas de dessalinização nesses abrigos por mais alguns dias", disse.

Hospitais em colapso

Para a ONU, as preocupações com a desidratação e as doenças transmitidas pela água continuam altas devido ao colapso dos serviços de água e saneamento. "Embora Israel tenha retomado parcialmente o fornecimento de água para o leste de Khan Younis no fim de semana, outras redes estão tão danificadas que não poderiam fornecer água mesmo se fossem ligadas novamente", disse.

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Ontem, a ONU conseguiu cinco caminhões de combustível para operar as principais usinas de dessalinização de água do mar de Gaza, mas isso só manterá as instalações operacionais por cerca de uma semana.

"As reservas de combustível dos hospitais de Gaza também foram quase totalmente esgotadas. 20 dos 23 hospitais de Gaza já estavam oferecendo apenas serviços parciais", alertou.

"À medida que os geradores e os geradores de reserva se esgotarem, os sistemas essenciais de suporte à vida serão desligados e esses hospitais - que estão cheios de doentes crônicos e vítimas civis da guerra - serão lançados na escuridão", completou.

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