Abolição da escala 6x1 é boia de salvação que governo demora a agarrar
O governo Lula está enredado em uma pauta impopular: os cortes de gastos. Necessários ou não, impostos pela Faria Lima ou não, os cortes são a pauta da vez, é o que o governo priorizou para aprovar. A melhor fórmula que conseguiu bolar para emplacá-los foi sintetizada por Lula assim: "Se é para cortar, vamos cortar de todos". Ou seja, tem que ser ruim para todo mundo.
Não é exatamente um sucesso de marketing dizer "vamos fazer maldades, mas não se preocupe que não é só com você".
Corte de gasto tampouco é eficiente para pressionar o Congresso. Está para nascer o deputado ou o senador que se importe em ser tachado de "irresponsável fiscal". A irresponsabilidade dá voto em todos os redutos beneficiados por ela via emenda parlamentar.
No meio dessa tempestade, apareceu a primeira boia capaz de juntar a esquerda em torno de uma ideia popular em anos. Uma ideia tão fácil de entender que viralizou no TikTok, virou proposta de emenda à Constituição e já tem quase três milhões de assinaturas na petição online pela sua aprovação.
Outras petições que viraram lei tiveram menos de dois milhões, lembra o colunista Tales Faria.
O apelo é tão grande que elegeu o autor da ideia - Rick Azevedo (PSOL) - vereador eleito no Rio de Janeiro com quase 30 mil votos e apenas R$ 63 mil de gastos de campanha. Isto é: baratíssimos R$ 2,10 por voto. Qual é a ideia?
É a abolição da escala 6x1. Aquela em que o empregado trabalha, por exemplo, de segunda a sábado, e folga no domingo. Ou até pior: trabalha de terça a domingo e folga na segunda-feira.
Na prática, abolir a 6x1 implica reduzir a jornada laboral prevista na legislação de 44 horas para 40 horas. Ou para 36 horas, como prevê a proposta de emenda constitucional apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL), a mesma que é objeto da petição online. Em termos sintéticos, é trocar a escala 6x1 pela 4x3. Ou pedir 4x3 para levar 5x2.
Essa formulação simples e direta de uma ideia complexa facilita a compreensão. Além disso, ataca um problema quase universal. Muitas dezenas de milhões de brasileiros conhecem alguém que trabalha no fim de semana.
Deputada estadual pelo PV, Lohanna França fez panfletagem na quarta-feira no interior de Minas Gerais pedindo às pessoas para assinarem a petição. As frases que ela ouviu de quem aceitou o panfleto são reveladoras:
* "Nossa! Minha filha trabalha nessa escala e agora que eu aposentei, preciso ficar com os meninos dela depois que eles saem da creche pra ela poder trabalhar. Até no sábado, aí é o dia todo!"
* "Meu filho ganhou um curso técnico aos sábados e não pôde fazer porque trabalha nessa escala"
* "Quando tem que ir ao médico tem que faltar no serviço - e descontam o dia se não tiver atestado"
Só o governo parece não ter percebido o alcance e a oportunidade. Ministro do Trabalho e ex-sindicalista, Luiz Marinho (PT) disse que não precisa de PEC. Que é assunto para ser decidido via convenções e acordos coletivos entre patrões e sindicatos. Ou seja, deixa como está.
Já o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) mostrou mais sensibilidade social para a redução da jornada: "É tendência no mundo inteiro".
Ninguém no governo chegou perto, porém, do senador bolsonarista Cleitinho (Republicanos-MG). Subiu à tribuna para lacrar: "Eu vi meu pai com 70 anos de idade, fazendo a escala 7×0. (...) E sabe o que aconteceu? O meu pai, sempre que chegava em casa, já se deitava para dormir, para acordar no outro dia para trabalhar. O meu pai não ia aos jogos de futebol quando eu jogava bola. O meu pai não foi às apresentações que eu fiz quando eu era cantor; nunca ia. O meu pai não parava um dia para ele poder me ensinar a estudar. Sabe por quê? Não fazia, não é porque ele não queria, não. É porque ele não tinha tempo; é porque sempre trabalhou."
Segundo o colunista Tales Faria, do UOL, o ministro responsável pela articulação política do governo, Alexandre Padilha, está conversando com os deputados Erika Hilton (PSOL-SP) e Reginaldo Lopes (PT-MG). Ambos são autores de PECs para acabar com a escala 6x1.
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Quero receberÉ uma pauta que coloca os partidos fisiológicos e a direita na defensiva. Favorito para se eleger presidente da Câmara, Hugo Motta se diz preocupado com o projeto. No mau sentido.
Os movimentos sociais já embarcaram, a maioria da população já embarcou, até bolsonaristas como Cleitinho já embarcaram. O governo está ensaiando mas ainda não embarcou. Corre o risco de se afogar em cortes se demorar muito para pegar essa boia.
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