Wálter Maierovitch

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Opinião

Cid em uma sinuca de bico: cadeia leve ou expulsão por indignidade

O capitão artilheiro Jair Bolsonaro sentiu, nas últimas horas, os variados efeitos dos golpes recebidos — todos eles legais, certeiros e desmoralizantes.

Pelas reações apresentadas, Bolsonaro demonstrou desespero. Sem noção, o capitão artilheiro passou a atirar para todos os lados, a esmo.

Juridicamente, o descalibrado ex-presidente Bolsonaro deu passos largos para penetrar no campo minado chamado pelos operadores do direito de "suicídio processual".

Com base nessa imagem do "suicídio processual", Bolsonaro poderá morrer juridicamente abraçado aos códigos penal e processual penal. Isso ocorrendo, lhe restará as companhias da legislação penitenciária, da lei de execução penal e dos regulamentos disciplinares das cadeias.

Por partes:

Crimes contra a honra

Revogada a procuração geral e ampla conferida ao advogado Frederick Wassef, agora chamado pelo núcleo duro do bolsonarismo de "fio desencapado" e de "acéfalo", Bolsonaro avisou que promoverá a responsabilização criminal de Walter Delgatti Neto, ouvido, na quinta (17), pela CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito).

Bolsonaro destacou haver sido ofendido em sua honra e informou que ajuizará uma ação criminal, tecnicamente denominada queixa por ser iniciativa privada, contra Delgatti. A queixa-crime, segundo Bolsonaro, decorrerá de ofensas à sua honra objetiva e também à subjetiva: calúnia, difamação e injúria.

Parêntese: na honra objetiva imputa-se fatos a atingir a reputação social, calúnia e difamação. Na subjetiva, caso da injúria, não se atribui fato, mas imputação de qualidades negativas sobre atributos morais, intelectuais, físicos. Em jogo, na injúria e na honra dignidade ou a honra decoro. Fechado parêntese.

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Ora, até um reprovado em exame de qualificação profissional da OAB sabe — dada a condição de bacharel em direito —, poder Delgatti, quanto à difamação e à calunia, apresentar a defesa processual chamada de exceção da verdade.

Exceção da verdade

Delgatti, ao ser acusado de autoria de crimes que atingiram a reputação de Bolsonaro, casos de calúnia e difamação, goza da garantia de poder comprovar no processo criminal a veracidade daquilo afirmado. Em outras palavras, o querelado Delgatti poderá, além de se defender, contra-atacar, a invocar a exceção da verdade.

Com o uso do instrumento comprobatório de "nomen juris" (nome jurídico) exceção da verdade, irá se abrir a Delgatti uma ampla instrução probatória, que tem sempre duração demorada.

Trocado em miúdos, Bolsonaro, diante de uma exceção da verdade, poderá politicamente sangrar ainda mais. E se surpreender com fatos novos e testemunhos desagradáveis, para usar de um eufemismo.

Atenção, não haverá motivo legal — nesta hipótese de apresentar Delgatti exceção da verdade —, de a ação, embora privada (privativa), tramitar em segredo de Justiça. É que haverá uma componente preponderante, ou seja, o interesse público. Interesses nacionais serão prevalentes, a fazer o privado ceder lugar ao interesse público.

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De Cid a El Cid

O subserviente tenente coronel Mauro Cid está trocando de panos.

Pelo andar da carruagem, Mauro Cid esboça a pretensão de assumir o espírito castelhano e combatente de Rodrigo Diaz de Vivar, o conhecido El Cid dos livros e do cinema.

O seu genitor, Mauro Cesar Lourena Cid, quer melhorar a situação do filho, sob sério risco de, criminalmente, receber pesada condenação e, pelo regimento disciplinar do Exército, acabar expulso das fileiras militares por indignidade.

Pelo que circula, o general bate na tecla de o filho haver recebido ordens. E de não ter dado ordens em face da sua atribuição de ajudante de ordens. O general coloca uma visão militar e acena com a disciplina. Essa regra castrense fundada na disciplina não se aplica no mundo civil, fora dos quartéis.

Diz a lei civil não deverem ser cumpridas as ordens manifestamente ilegais. Portanto, lavar dinheiro, fraudar depósitos, trocar cartões de crédito, usar conta corrente para omitir origens de capitais, vender joias, relógios e mimos para um peculatário como Bolsonaro não se trata de cumprir ordens legais. O mesmo pode-se dizer com relação às falsificações de cartões vacinais.

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A lembrar: o pai de Mauro Cid está sob suspeita. Ele contava com uma boquinha no escritório do governo brasileiro em Miami. Agora, é suspeito de integrar organização criminosa bolsonarista para lavagem de dinheiro.

Confissão espontânea e delação premiada

Mauro Cid contratou um novo advogado. A defesa técnica constituída descarta a possibilidade de delação premiada. Fala-se na possibilidade de confissão espontânea.

Atenção: a confissão espontânea pode ser limitada. Com admissões de fatos escolhidos a dedo. Por exemplo, poderá confessar o caso das vacinas e nada admitir sobre joias e lavagem de dinheiro.

O próprio defensor quis esclarecer que não haverá confissões sobre as joias. Para o bom entendedor: nenhuma confissão a respeito de crimes continuados de peculato, com venda dos bens apropriados indevidamente para transformação em dinheiro em espécie — lavagem de dinheiro.

Coisas bem diversas, até pelos riscos decorrentes.

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A confissão espontânea é uma atenuante obrigatória da pena a ser imposta em decisão judicial condenatória. Está relacionada no Código Penal, que diz o seguinte: "são circunstâncias que sempre atenuam a pena, ter o agente confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime.

A delação premiada, tecnicamente chamada de colaboração com a Justiça, possui natureza de contrato. É um acordo de vontades, com oferta de prêmio em troca de informações e admissão de participação criminal.

Numa delação premiada, Mauro Cid teria de abrir todo o jogo. Grosso modo, um livro aberto sobre os crimes e malfeitos de Bolsonaro, com a participação de Cid como partícipe de atos de lesa pátria. E o lesa pátria levaria Mauro Cid a ser expulso do Exército nacional por indignidade.

Abraço de afogados

Ao receber a informação de estar Mauro Cid a cogitar de delação premiada, o ex-presidente Bolsonaro deu sinal de desespero.

Alertou, sem perceber que estava a admitir crimes e ilícitos vários, que essa anunciada e nova postura de Mauro Cid levaria a ambos à destruição.

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No popular, Bolsonaro e Mauro Cid num abraço de afogados.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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