Inquérito que apurava risco em prédio que desabou foi arquivado há 45 dias; MP anuncia reabertura
O inquérito do MP (Ministério Público) paulista que apurava riscos ligados ao edifício que desabou na madrugada desta terça-feira (1º) no centro de São Paulo foi arquivado em 18 de março deste ano, há exatos 45 dias, sem determinar medidas para melhorar a segurança do local. Na tarde desta terça, após o desabamento, o MP decidiu reabrir o inquérito.
A investigação foi aberta em 24 de agosto de 2015 para avaliar “possível existência de risco no imóvel”. O Ministério Público afirmou, em nota divulgada nesta tarde, que ao longo de dois anos e sete meses de investigação, os órgãos públicos incumbidos de fiscalizar o edifício que desabou --em especial a Defesa Civil de São Paulo e a Secretaria Especial de Licenciamentos-- informaram que, "a despeito do AVCB [Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros] estar vencido, não havia risco concreto que demandasse sua interdição”.
O inquérito civil havia sido aberto após uma representação feita ao MP com base em informações colhidas junto à Ouvidoria Geral do Município e Prefeitura Regional da Sé em agosto de 2015. A representação foi assinada por um morador vizinho do prédio, Rogério Baleki.
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"Da minha janela, era possível ver uma fenda de 40 centímetros no prédio que desabou hoje", disse ele. "O que eu vejo aqui é uma tragédia anunciada. Isso não é um acidente, é um crime", disse. A investigação também apurou que o local já havia sido alvo de uma ação de despejo, movida pela União, mas foi reocupado após a primeira reintegração de posse.
Ainda em 2015, o MPE requisitou informações à Prefeitura e pediu que o Corpo de Bombeiros fizesse uma vistoria "com o objetivo de verificar as condições de segurança e se realmente existia algum risco para quem mora no local ou o frequenta, inclusive a possibilidade de desabamento".
A investigação teve seu prazo de conclusão prorrogado por quatro vezes, trocou de promotor e foi finalizada sem nenhuma conclusão. A recomendação foi pelo arquivamento. Atualmente, o processo está no Conselho Superior do MP, que pode aceitar o arquivamento ou devolver o processo para a promotoria de Habitação.
Seguindo o MP, secretaria havia informado que providenciaria a retirada dos ocupantes do imóvel em ação de reintegração de posse. A comunicação de desocupação, segundo o MP, fez com que a instituição decidisse aguardar o projeto de utilização do local pela Prefeitura de São Paulo e, assim, decidiu pelo arquivamento da investigação.
Após o desabamento do prédio, o MP anunciou na tarde desta terça que vai reabrir o inquérito “para verificação das causas do acidente" e também para avaliar a veracidade dos relatórios técnicos encaminhados ao Ministério Público pelos órgãos públicos responsáveis pela manutenção e fiscalização da edificação.
Jogo de empurra
A responsabilidade sobre o edifício também foi alvo de controvérsia entre os governos federal e municipal. Enquanto a Prefeitura de São Paulo diz que aguarda a antiga sede da PF (Polícia Federal) ser desocupada para tomar posse do imóvel, a União diz que o prédio já havia sido cedido à administração paulistana.
Em nota, a prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Habitação atuava na ocupação do edifício por meio do grupo de mediação de conflitos, “uma vez que no local estava previsto haver a reintegração de posse, movida pela Secretaria de Patrimônio da União”. “Uma vez desocupado, o imóvel seria cedido à prefeitura”, segundo o comunicado.
Já o Ministério do Planejamento apontou que a SPU (Secretaria de Patrimônio da União), em parceria com a secretaria municipal, “estavam atuando para tentar a reintegração amigável do edifício”. “Ele foi cedido provisoriamente pela SPU à prefeitura em 2017 e a previsão era que ele seria utilizado para acomodar as novas instalações da secretaria de Educação e Cultura de São Paulo”, diz o ministério.
O governo federal lembra que o edifício já estava ocupado e, por isso, “a responsabilidade pelo pedido de reintegração não era exclusiva nem da SPU e nem da prefeitura do município, mas sim de ambas as instituições”. O ministério também diz que o imóvel não estava na programação de vendas da União.
O prefeito paulistano, Bruno Covas (PSDB), nega que a prefeitura tenha deixado de agir para desocupar o edifício. “Tudo que a prefeitura poderia ter feito, ela fez nesses últimos meses”, afirmou Covas no local do desabamento, na manhã desta terça.
Covas disse que, desde fevereiro, a prefeitura realizou seis reuniões com as famílias que viviam no edifício, pontuando que elas foram alertadas sobre os riscos. “A prefeitura não pode ser acusada de se furtar essa responsabilidade se ela estava inclusive recebendo esse equipamento [imóvel]. Seria muito fácil dizer: ‘olha, o problema não é nosso, é do outro’. Não, a gente estava buscando receber essa propriedade para poder fazer a atenção necessária.”
Ricardo Luciano, coordenador do movimento de ocupação LMD (Luta por Moradia Digna), conta que chegou a morar no prédio e que a estrutura do local estava “perfeita”. Segundo ele, há um mês a prefeitura cadastrou as pessoas que seriam retiradas do local.
Luciano afirmou que o movimento arrecada dinheiro das famílias para manutenção do local, mas disse que ninguém “quer ficar rico com as famílias”. Ele não confirmou o quanto era arrecadado e disse que era um “valor de balela”. Segundo ele, o trabalho agora do movimento é encontrar imóveis em que um “proprietário incompetente que não pague os impostos e deixe ele abandonado” para ocupar e realocar as famílias.
Na capital paulista, ao menos 70 prédios estão ocupados por cerca de 4.000 famílias, de acordo com Covas. Na cidade toda, há imóveis invadidos por sem-teto, somando 46 mil famílias.
Superintendente da SPU, Robson Tuma lembrou que, em 2014, houve a reintegração de posse do edifício. Na época, ele estava cedido à prefeitura, comandada por Fernando Haddad (PT). “Porém, cerca de dois meses depois, as famílias voltaram a invadir o imóvel”, disse Tuma.
Tuma afirmou que no ano passado a prefeitura, então sob comando de João Doria (PSDB), recebeu novamente o prédio da União. Segundo ele, começou-se, então a pensar na tratativa de desocupação de forma amigável. "Mas as famílias também precisam aceitar a desocupação”, afirmou.
“O governo não espera tragédia nenhuma. Tragédias acontecem sem aviso. E, infelizmente, a gente, às vezes, se sente impotente para resolver, como no caso de hoje”, completou o superintendente, dizendo que “as disputas judiciais também demoram”.
Também presente no local do desabamento, o presidente Michel Temer (MDB) disse que não foi solicitada a reintegração de posse porque os moradores eram “gente muito pobre, naturalmente numa situação um pouco difícil”. “Mas agora serão tomadas providências para dar assistência não só àquelas famílias que perderam seus entes queridos, mas também àqueles que perderam sua habitação". (Com informações do Estadão Conteúdo)
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