Boulos perde segunda eleição seguida com campanha mais cara e alta rejeição
Dono da campanha mais cara da disputa municipal em todo o Brasil, Guilherme Boulos (PSOL) perdeu as eleições na capital paulista pela segunda vez seguida. Com dificuldades de afastar o estigma de radical — explorado pelos rivais —, o psolista não conseguiu furar a bolha de esquerda para atrair mais votos, esbarrou em uma alta rejeição e foi vencido por Ricardo Nunes (MDB), reeleito. Com 100% das urnas apuradas, o emedebista teve 59,35% contra 40,65% de Boulos.
Se a derrota para Bruno Covas (PSDB) em 2020 teve gosto de vitória pelo inesperado segundo turno com uma campanha modesta, o retrato das urnas deste domingo (27) mostra que Boulos terminou a disputa com um resultado semelhante ao de quatro anos atrás mesmo em condições mais favoráveis.
Em 2020, Covas conquistou 59,38% (3,16 milhões) dos votos contra 40,62% (2,16 milhões) de Boulos. Agora, como candidato com maior caixa de campanha do país — R$ 81 milhões de recursos para gastar, mais da metade repassados pelo PT - o psolista teve 2.321.901 votos, apenas 155.792 a mais que em 2020. O candidato do PSOL perdeu para Nunes por uma diferença de mais de um milhão de votos, assim como na derrota para Covas.
Sem coligação na eleição anterior, ele teve o apoio de cinco partidos desta vez, sendo o PT o principal deles. A sigla abriu mão de ter candidatura própria na disputa pela primeira vez, em acordo costurado diretamente com o presidente Lula.
Enfrentando um prefeito até então desconhecido de mais da metade da população, Boulos aparecia até meados do ano passado com liderança confortável nas pesquisas. Somado a isso, o apoio de Lula e a aliança com Marta Suplicy (PT), considerada pelos paulistanos a melhor prefeita da história e agora sua vice, fizeram o psolista figurar naquele momento como favorito a vencer a disputa.
Boulos e seu entorno tinham ciência, por outro lado, de que adversários explorariam seu passado no MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) para colar nele a pecha de invasor e extremista. Para fugir do estigma, o parlamentar fez ajustes no discurso no primeiro turno, na tentativa de se mostrar moderado e atrair o eleitor de centro.
Antes defensor da desmilitarização da PM, ele incluiu no plano de governo uma proposta para dobrar o efetivo da GCM (Guarda Civil Metropolitana), que atuaria armada, como destacou em diversas aparições públicas. Também convidou um ex-comandante da Rota, a elite da PM paulista, para integrar a equipe que construiu seu plano de governo.

Boulos passou a chamar o governo da Venezuela de ditadura, contrariando parcela da esquerda que defende Nicolás Maduro. "Um regime que persegue opositor, que faz eleição sem transparência, para mim, não é democrático e ponto", disse em entrevista no fim de setembro.
O estilo "descafeinado", nas palavras de um integrante da campanha de Boulos em 2020, desagradou parte da militância de esquerda, que pedia uma atuação mais enérgica. Aliados defendem, no entanto, que a versão "paz e amor" foi necessária para apresentá-lo ao eleitor como opção moderada, madura e experiente.
Boulos também deu tom mais profissional para a campanha em relação a 2020, quando dispôs de uma estrutura mais modesta. A equipe de plano de governo foi um dos destaques da campanha, reunindo nomes reconhecidos nas mais diversas áreas de atuação.
Apesar dos esforços, a rejeição a Boulos não cedeu — 52% do eleitorado disse não votar nele de jeito nenhum na pesquisa Datafolha divulgada sábado (26) — estimulada, sobretudo, por ataques de adversários.
Nunes repisou o discurso de que Boulos é "extremista" e "invasor de propriedade". Enfatizou também que sua reeleição representa um caminho "seguro" para a cidade, e a vitória do psolista, o incerto.
Pablo Marçal (PRTB) reavivou o fantasma do comunismo e propagou acusações mentirosas de que Boulos era usuário de drogas. A dois dias do primeiro turno, o influenciador publicou um laudo falso sobre internação de Boulos por consumo de cocaína — acusações que podem ter ajudado a cristalizar a rejeição ao psolista.
O segundo turno começou com a campanha desanimada com a vantagem de Nunes nas pesquisas, mas o apagão que deixou mais 3,1 milhões clientes da Enel no escuro fez crescer a esperança em uma virada. Boulos buscou responsabilizar Nunes pela falta de luz por causa da falta de poda de árvores e tentou pregar nele a pecha de incompetente.
O apagão, no entanto, não provocou mudanças significativas nas pesquisas e Boulos seguiu na estratégia de subir o tom contra Nunes, reforçando acusações de violência doméstica, corrupção e associação ao crime organizado que pesam contra o prefeito.
Especialistas e observadores da política avaliam que o candidato se "marçalizou" em busca do eleitor do ex-coach. Boulos participou de uma entrevista com o empresário na sexta (25) e incluiu no programa de governo propostas voltadas ao empreendedorismo, tema caro a quem votou no influenciador.
Na "Carta ao Povo de São Paulo" divulgada por ele na reta final da campanha, fez um mea culpa sobre a falta de diálogo da esquerda com o trabalhador autônomo da periferia. "[A esquerda deixou] de falar com tanta gente que também batalha, sofre o dia a dia das periferias e buscou encontrar sua própria forma de ganhar a vida", escreveu no documento, que recicla uma estratégia usada por Lula em 2002 — quando o petista fez uma "Carta ao povo brasileiro" com acenos ao empresariado, até então desconfiado dos rumos que a economia tomaria em seu governo.
O Boulos "raiz" do segundo turno agradou à militância, mas a virada de chave veio tarde para impedir a reeleição de Nunes. Aliados do psolista e apoiadores da campanha colocam parcela da derrota de Boulos na conta do marqueteiro Lula Guimarães. Segundo eles, a chegada do profissional teria deixado o deputado engessado, sem carisma e próximo de uma caricatura de político tradicional. A contratação de Lula já era criticada ainda na pré-campanha por militantes mais antigos do PSOL.
Internamente, há, ainda, a avaliação de que Marta Suplicy poderia ter tido protagonismo maior na campanha, especialmente na estratégia de angariar votos da população mais pobre. A ex-prefeita deixou o governo Nunes e o MDB neste ano e voltou ao PT para integrar a chapa de Boulos. Como revelou levantamento do UOL, ela participou de menos de 10% das agendas no primeiro turno e não ressoou entre os eleitores mais jovens, parcela que se afinou com Marçal. A petista, no entanto, se mostrou mais ativa no segundo turno, participando de mais eventos ao lado de Boulos.
Aliados também demonstram frustração com a participação considerada tímida de Lula. O petista teve eventos de rua com Boulos apenas no primeiro turno e era esperado para um último ato neste sábado (26), mas resolveu não comparecer. O sentimento no entorno do psolista é que o presidente poderia ter se engajado mais, levando em conta a importância da disputa na capital paulista para 2026.
132 comentários
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Jose Carlos Fagnani
Como me alegra ver a derrota da extrema esquerda inclusive com apoio de artistas, jornalistas e primeira dama, isso não tem preço
Sandra Rorigues Aloe
Pode se candidatar quantas vezes quiser, em São Paulo não ganha de jeito nenhum
Domingos Spinelli
Em 57 zonas eleitorais, Boulos ganhou em 3. Sendo que em 1 delas (Bela Vista) teve menos votos que as abstenções. Ou seja: amplamente derrotado. A população escolheu de forma democrática e, mais uma vez, botou o invasor embusteiro pra correr. Aqui não Boulos, tchau!!!