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Guerra da Rússia-Ucrânia

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Rússia x Ucrânia: brasileiros entram na Ucrânia para resgatar conterrâneos

Lucila Runnacles

Colaboração para o UOL, em Madri

27/02/2022 19h19Atualizada em 02/03/2022 13h10

Enquanto milhares de estrangeiros tentam sair da área de confronto entre Rússia e Ucrânia, o cientista farmacêutico Rodolfo Caires, natural de Brasília (DF), conseguiu fazer o que alguns achavam quase impossível: entrar no país invadido pelos russos para resgatar outros brasileiros que, até então, ele nem conhecia.

O objetivo do Rodolfo é ir até Kiev, capital da Ucrânia, onde ainda há brasileiros que não conseguiram sair do país.

Rodolfo - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Rodolfo Caires na fronteira da Ucrânia: rumo a Kiev para resgatar brasileiros
Imagem: Arquivo Pessoal

"Recebi relatos de outros brasileiros que não estão conseguindo sair da Ucrânia, mesmo estando próximos das fronteiras, porque tem muita gente na mesma situação. Está muito frio e, para chegar até as fronteiras, algumas vezes é preciso caminhar muitos quilômetros. Teve gente que fez fogueira para conseguir se aquecer durante a madrugada", conta.

Entrada na Ucrânia

Carro - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Carro alugado por Rodolfo Caires para buscar brasileiros em Kiev, capital da Ucrânia
Imagem: Arquivo Pessoal

Rodolfo entrou na Ucrânia dirigindo pela fronteira da cidade polonesa de Dorohusk, no início da tarde (hora local) deste domingo (27), quarto dia de guerra. Ele conta que, por ali, a situação está bem mais tranquila do que na fronteira de Medyka, outra cidade da Polônia, onde as filas para atravessar a fronteira chegam a até 14 horas.

"Saí de Dublin [capital da Irlanda], onde moro, e a minha ideia era alugar uma van na Polônia para trazer mais pessoas da Ucrânia. Mas só estão deixando os civis alugarem carro, porque as vans estão destinadas para outro tipo de ajuda", afirmou.

Mapa Rússia invade a Ucrânia - 26.02.2022 - Arte UOL - Arte UOL
Imagem: Arte UOL

Sobre a situação dos arredores da fronteira pela qual atravessou, Rodolfo diz que alguns supermercados estão ficando desabastecidos. Além disso, conseguir combustível também está mais complicado.

Logo que entrou na Ucrânia, Rodolfo foi surpreendido pelo toque de sirenes enquanto estava fazendo compras, e precisou se isolar em um bunker. "Estava no supermercado e a sirene começou a tocar. Então fomos orientados a entrar no bunker que fica dentro do supermercado mesmo. Ficamos ali uns 20 minutos até que as sirenes pararam", explica Rodolfo.

Governo brasileiro

Chateado com a resposta que o governo brasileiro tem dado até agora para ajudar quem está na Ucrânia, Rodolfo diz que muitos ficaram abandonados. A FAB (Força Aérea Brasileira) informou neste sábado (26) que deixou dois aviões de prontidão para o possível resgate. O Itamaraty afirma que não tem prazo para retirar os brasileiros do país em guerra. A Embaixada do Brasil na Ucrânia disse neste domingo (27) que não há possibilidade de saída da capital Kiev em meio aos ataques aéreos.

"Toda a informação que a embaixada brasileira na Ucrânia está divulgando é bem informal. Eles têm um grupo no Telegram e avisam por lá quando conseguem vagas em algum trem. Mas, pelo relato de outros brasileiros que conseguiram embarcar nesses trens, chegando na última estação eles têm que se virar. Infelizmente, nosso governo não deu apoio com a celeridade necessária", opina.

Rede de apoio para resgatar brasileiros

Rodolfo entrou em contato com os brasileiros que vai resgatar por meio do grupo do Instagram @Frente_BrazUcra, formado por voluntários brasileiros que coletam informação e colocam pessoas em contato para ajudar na saída dos conterrâneos da Ucrânia, como reportado pelo UOL neste sábado (26).

Quando o Rodolfo falou com a reportagem, ele estava dirigindo até a cidade ucraniana de Korosten, que fica a 180 quilômetros de Kiev. Ele deve passar a noite ali, e pegar a estrada de novo nesta segunda-feira (28).

"A estrada aqui na Ucrânia está bem vazia, mas tem muitos checkpoints onde checam documentos e passaportes. Vi vários soldados armados pelo caminho. Quando abrem meu porta-malas e verificam que estou cheio de suprimentos, me liberam", disse o brasiliense.

Brasileiros na Ucrânia

Brasileiros em Kiev - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Matheus Ramirez e Jonatan Santiago, que jogam para o time de futsal Sky Up Kiev, e, ao meio, David Abu-Gharbil, estudante de medicina
Imagem: Arquivo Pessoal

O UOL conseguiu contato com dois brasileiros que estavam em um hotel no centro de Kiev.

Jonatan Santiago mora no leste europeu há nove anos e se mudou para Kiev há seis meses para jogar no clube Sky Up Kiev.

"Os últimos dias foram os piores da minha vida. Nunca imaginei que a gente passaria por algo assim. Dormir é difícil, mentalmente estamos sempre alerta caso aconteça alguma coisa. Já escutamos bombas caindo perto e tiroteios. Situações terríveis", relata.

Jonatan havia chegado ao hotel há dois dias. Com ele estava Matheus Ramirez, que também joga para o Sky Up Kiev. Eles tinham se unido a outros jogadores brasileiros dos times do Shakhtar Donetsk e do Dinamo Kiev.

"Viemos para cá para sairmos todos juntos, mas fomos deixados para trás pelo outro grupo de jogadores. Fomos tomar banho e, quando voltamos, eles já tinha ido pegar um trem rumo à Romênia", lamenta Ramirez.

A ideia inicial de Rodolfo era resgatar o grupo, mas antes que chegasse a Kiev de carro, os brasileiros estavam tentando sair da capital de trem. Ainda assim, o cientista farmacêutico segue em viagem, para retirar da capital ucraniana quem conseguir encontrar.

Quem quiser ajudar o grupo de voluntários brasileiros pode doar qualquer quantia através do site Vakinha.com.br, e procurar a campanha Extração de Brasileiros na Ucrânia.

Outra grande vitória

Clara - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Clara Magalhães Martins e o grupo que resgatou na fronteira da Ucrânia com a Polônia neste domingo (27)
Imagem: Arquivo Pessoal

A paulista que mora na Alemanha Clara Magalhães Martins, que criou no Telegram o grupo de voluntários para ajudar os brasileiros a saírem da Ucrânia, também conseguiu resgatar três conterrâneos neste domingo (27), além de um nigeriano e uma ucraniana. Todos estavam entre a fronteira da Polônia e a cidade ucraniana de Lviv.

"Eles estão exaustos. Entraram no carro e capotaram de sono. Estavam há dias sem dormir e sem estar em um lugar quente. Agora mesmo estamos indo para a fronteira com a Hungria, que parece estar mais tranquila", descreve a paulista que dirigiu muitas horas hoje e continua na estrada.

Um dos resgatados por Clara é o jogador do Rukh Lviv, Edson Fernando, que tenta sair da Ucrânia há vários dias.

"Passamos mais de quatro dias sem dormir, sem tomar banho. Quando estávamos voltando para Lviv para comer algo de verdade e ver o que a gente ia fazer, porque a pé não estávamos conseguindo atravessar a fronteira, encontramos a Clara através do grupo do Telegram e ela nos deu total assistência¨, relata com uma voz de muito cansaço.

O atleta, que também está acompanhado do jogador brasileiro Thalles Brenne, colega de time, explica que agora mesmo (22h horário local) estavam tentando cruzar pela fronteira da Hungria. Antes, tentaram sem sucesso passar pela fronteira da Ucrânia com a Eslováquia, mas a fila de carros era muito grande.

Nesta segunda-feira (28), a reportagem conseguiu contato novamente com esse grupo de brasileiros e depois de quase 20 horas dentro do carro, eles conseguiram sair do país em guerra e já estão na Hungria.