Oposição culpa marca de Rosa Weber por levante conservador no Congresso
Parlamentares da oposição dizem que a ex-ministra Rosa Weber inflamou os conservadores ao querer deixar sua marca no STF (Supremo Tribunal Federal). Ela se aposentou em setembro e, na reta final na presidência, acelerou votações sobre marco temporal, aborto e drogas.
No final, ela se perdeu no compromisso com a imparcialidade.
Deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS), defensor do agronegócio
O que aconteceu
Na avaliação de parlamentares da oposição ouvidos pelos UOL, Rosa abandonou a atitude de magistrada e agiu como militante ao tratar desses temas.
Em reação, houve um levante conservador no Congresso que levou a uma crise entre os Poderes e à defesa por parlamentares de projetos que "enquadram" o Supremo.
Procurada, Rosa não quis se manifestar sobre as críticas.
Como sinal do que os oposicionistas classificam de "ativismo" dela, Nogueira lembra que Rosa visitou uma aldeia yanomami em 20 de julho. Ela tirou fotos e ganhou um nome na língua indígena do povo: Xororima Yanomami, que significa andorinha.
O deputado Eli Borges (PL-TO), que até o meio do ano presidia a Frente Parlamentar Evangélica, vê o estremecimento entre Congresso e STF como consequência direta das posições de Rosa sobre a descriminalização das drogas e do aborto.
Ele diz que a ex-ministra quis decidir na Justiça temas que não têm voto na Câmara e no Senado, sendo a "gota d'água" na relação.
Ela, ao insistir num voto que o Brasil não queria, acabou tornando visível essa interferência do Supremo no Legislativo. Foi infeliz.
Eli Borges (PL-TO), deputado da bancada evangélica
O que Rosa fez
A ex-ministra deixou o STF em setembro, aos 75 anos, por atingir o limite para aposentadoria compulsória. Nos dois últimos meses no cargo, ela pôs em pauta temas polêmicos. São eles:
- Julgamento da constitucionalidade da criminalização do porte de drogas;
- Liberação do aborto até as primeiras 12 semanas de gestação;
- Derrubada do marco temporal para demarcação de terras indígenas.
Esses julgamentos contrariam os interesses de duas frentes parlamentares bastante numerosas e poderosas. A do agronegócio tem 324 deputados e 50 senadores; a evangélica reúne 210 deputados e 26 senadores.
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Quero receberOs congressistas reclamam que, para deixar uma marca pessoal, ela abalou a institucionalidade do Judiciário.
Para eles, ela conseguiu com isso enfraquecer o STF e unir os parlamentares. O bloco Vanguarda, com senadores da oposição como Damares Alves (Republicanos-DF), se alinhou à iniciativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para votar projetos que limitam os poderes do Supremo.
O deputado Filipe Barros (PL-PR) diz que viu o comportamento de Rosa na despedida do Supremo indo na contramão de sua atuação como magistrada, que havia se caracterizado antes pela técnica e pela distância dos holofotes. Mas afirma que o histórico do Supremo é em ir contra a direita.
Não que as opiniões de Rosa fossem novidade. Desde o início de sua gestão à frente do STF, ela deixou claro que desejava votar o aborto, mesmo sem que fosse concluído o julgamento. Não há data para o tema voltar à pauta.
O direito dos indígenas sempre havia sido uma área importante de sua atuação —embora fosse mais forte no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) do que no STF.
Mas, para os parlamentares, há uma enorme diferença entre sinalizar e agir a favor de determinadas bandeiras.
O senador Jorge Seif (PL-SC) concorda. Diz que Rosa errou e não enfrentou resistência dos outros dez ministros do Supremo.
A culpa não é dela. Ela pode ser ativista onde quiser. A culpa é dos dez [ministros do STF] que acataram a pauta.
Jorge Seif (PL-SC), senador bolsonarista
Oposição unificada
Os parlamentares se dizem mais unidos e se veem apoiados por Pacheco. Segundo o deputado Eli Borges, os conservadores estão "falando a mesma linguagem".
Isso se tornou fundamental em um momento em que o PL, partido de Jair Bolsonaro, vive uma série de traições, com ao menos 19 deputados que votam com o governo. Até o grupo de WhatsApp da sigla foi fechado em julho devido a uma briga com agressões pessoais.
Além da união contra um inimigo em comum, a oposição avalia que ganha um discurso forte para martelar aos eleitores, tira o foco das acusações contra Bolsonaro e mira nas propostas progressistas para atacar o governo.
Já a base de Lula tem evitado esses temas e embates para manter o foco na economia. O Planalto tem pela frente neste segundo semestre a votação da reforma tributária e das regras para definir o novo orçamento.
O discurso para esses temas é o de manter a legislação vigente e se afastar da troca de farpas entre Legislativo e Judiciário para que as disputas não resvalem no Executivo. Lula já teve de vetar o marco temporal e pode sofrer o desgaste de ver o veto derrubado pelo Congresso.
Assunto delicado, a descriminalização do aborto é vista como um vespeiro. O governo tem membros abertamente favoráveis, em especial entre as integrantes femininas —incluindo a primeira-dama Janja da Silva—, e outros publicamente contra.
Se não há consenso dentro do próprio núcleo petista —e menos ainda no Congresso e na sociedade—, Lula deve manter o pragmatismo dos mandatos passados e passar ao largo dessas discussões, mesmo sob pressão.
O fiel da balança parece que vai ser o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ele ainda não sinalizou se colocaria em votação as propostas anti-STF, mas a oposição aposta na promessa de campanha dele de defender a independência da Casa para seguir com as propostas contra o Supremo.
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