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Membros da CPI se irritam com silêncio de Cachoeira, dizem não ser "palhaços" e o comparam a "marginal"

Do UOL, em Brasília e São Paulo

22/05/2012 14h47Atualizada em 22/05/2012 17h40

O direito a permanecer em silêncio, repetido inúmeras vezes pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira durante depoimento na reunião da CPI nesta terça-feira (22), irritou alguns parlamentares. O deputado Fernando Franscichini (PSDB-PR), por exemplo, pediu à presidência da CPI que os parlamentares fossem tratados com respeito e não como "palhaços".

"O depoente não pode achar que aqui tem um bando de palhaço", afirmou. "Não brinque conosco. O senhor não pode vir aqui para jogar com quem quiser, ou para salvar da fogueira quem o senhor quiser", disse o tucano. Cachoeira apenas respondeu: "Quem forçou [a ida dele próprio à CPI] foram os senhores".

O depoente não pode achar que aqui tem um bando de palhaço

deputado federal Fernando Franscichini (PSDB-PR)

Apesar de mais magro e com olheiras profundas, Cachoeira não demonstrou desconforto com as perguntas dos parlamentares. O contraventor repetiu frases como “Vou te ajudar, mas depois”;  “Quero permanecer calado”; “Permaneço calado”; “Falarei tudo depois”.

O líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR) também perdeu a paciência com as mesmas respostas e chamou o bicheiro de “marginal” e "tomado da arrogância de quem é livre, e não preso".

"Ouro para bandido"

“Estamos fazendo um papel ridículo diante deste senhor, que está nos manipulando, [estamos] perguntando para uma múmia. O que as pessoas em casa vão pensar de nós? Não vou ficar dando ouro para bandido”, vociferou a líder do PSD no Senado, Kátia Abreu.

A senadora sugeriu ainda que as perguntas fossem interrompidas, o bicheiro fosse embora e os parlamentares retomassem a votação de outros requerimentos, como quebra de sigilo e convocação de pessoas que possam, de fato, contribuir com os trabalhos da comissão.

Estamos fazendo um papel ridículo diante deste senhor, que está nos manipulando, [estamos] perguntando para uma múmia

senadora Kátia Abreu (PSD-TO)

Direito constitucional x "silêncio cínico"

Já o deputado Chico Alencar (RJ), líder do PSOL na Câmara, criticou o direito evocado pelo contraventor: "Esta sessão não foi inútil, o senhor Carlos Cachoeira acaba de alegar aqui (...), ele aqui declarou que o que o delegado trouxe para a investigação é a pura verdade”, afirmou o líder do PSOL na Câmara dos Deputados, Chico Alencar (RJ). "Este é um silêncio cínico, um silêncio desrespeitoso", definiu.

Logo no início da sessão, Cachoeira afirmou que ficaria calado, como havia antecipado sua defesa --ele afirma que só se manifestará em juízo. “Como manda a lei responderei constitucionalmente, fui advertido pelos advogados para não dizer nada e não falarei nada aqui”, afirmou o bicheiro. Já na terceira pergunta não respondida, Cachoeira começou a ironizar o fato de que não iria responder e que só responderia depois de falar na Justiça de Goiás.

Veja as perguntas e as "não respostas" de Cachoeira à CPI

O deputado federal Sylvio Costa (PTB-PE), por sua vez, satirizou o andamento da reunião. “Este silêncio não é o ‘silêncio dos inocentes’ [em referência ao filme com mesmo nome], é óbvio”, afirmou.

Indagado pelo relator da CPI, Odair Cunha (PT-MG), logo no início da reunião, sobre bens e relação com empresários, Cachoeira reforçou que não falará --nas primeiras perguntas feitas, foi essa a resposta tanto sobre a relação dele com empresas como a Delta, quanto sobre a relação com um sul-coreano e sobre seus bens, tais como uma casa em Miami. 

O bicheiro também invocou o direito de permanecer calado ao ser indagado por membros da CPI sobre sua relação com Waldomiro Diniz, com o ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e com Idalberto Matias Araújo, o Dadá. Novamente, o silêncio e um leve sorriso foram expostos pelo bicheiro ao ser indagado sobre sua relação com o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).

Cachoeira foi preso em fevereiro durante uma operação da Polícia Federal --ele é acusado de comandar um esquema de jogos ilegais de azar, além de outros crimes. O depoimento do pivô do escândalo hoje foi possível uma vez que seu segundo pedido de habeas corpus para não depor foi rejeitado pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF). 

A defesa de Cachoeira conseguiu um primeiro adiamento na semana passada para ter acesso aos inquéritos das operações Vegas e Monte Carlo, da Polícia Federal. Depois de receberem autorização para ler os documentos, os advogados tiveram de quarta-feira (16) até esta segunda-feira (21) para trabalhar. A sala onde funciona a área técnica da CPI, com computadores que contêm os dados, abriu no fim de semana apenas para atender os advogados.

Até agora a CPI não teve nenhum depoimento aberto. Falaram apenas os delegados da PF que conduziram as operações, em sessões sigilosas. O início lento da comissão é atribuído nos bastidores do Congresso a um suposto acordo entre PSDB, PT e PMDB. Três governadores dos partidos, respectivamente Marconi Perillo (Goiás), Agnelo Queiroz (Distrito Federal) e Sérgio Cabral (Rio de Janeiro), têm ligações com a empresa Delta, construtora que teria Cachoeira como sócio oculto.

O próprio presidente da CPI, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), já admitiu que a CPI está "meio devagar" e que o depoimento de Cachoeira trará um novo ânimo às investigações que, até agora, não colheram nada além do que já foi descoberto pela PF. Na última quinta-feira, (17), a comissão aprovou convocações de 51 pessoas, mas os governadores não foram chamados.

Caso o depoimento de Cachoeira seja um fiasco, parlamentares acreditam que o foco se voltará ao deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). Na semana passada, ele foi flagrado pelo SBT ao enviar uma mensagem ao governador do Rio de Janeiro para alertá-lo que os petistas da comissão estariam trabalhando a favor dele.

Depoimento no Conselho de Ética

Está previsto que Cachoeira deponha também nesta semana no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado, que abriu processo disciplinar contra o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), suspeito de envolvimento no esquema do bicheiro.

A previsão é que Cachoeira fale na quarta-feira (23). Porém, ele pode se recusar a ir ao conselho já que foi chamado como testemunha, e não como réu. Segundo a “Folha de S.Paulo”, o bicheiro não deve ir.

"Ele não vai porque isso pode resvalar no processo penal que ele responde", disse ao jornal a advogada Dora Cavalcanti, da equipe do ex-ministro da Justiça no governo Lula Márcio Thomaz Bastos, advogado de Cachoeira.

Além de receber presentes e favores do contraventor, que atua principalmente em Goiás, Demóstenes é suspeito de intervir no Congresso em favor de Cachoeira.