Gestão Cláudio Castro tem 182 mortes em 40 chacinas em 1 ano, aponta estudo
Em apenas um ano de gestão do governador Cláudio Castro (PL) no Estado do Rio de Janeiro foram registradas 182 mortes em 40 chacinas. Os dados foram levantados pelo UOL com base em estudo feito em conjunto pelo Instituto Fogo Cruzado e o Geni (Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos), grupo de estudos sobre a violência da UFF (Universidade Federal Fluminense). As pesquisas na área de segurança pública consideram como chacina todas as ações com ao menos três mortes.
Levando em conta o massacre com ao menos 23 pessoas mortas, ocorrido na terça-feira (24) em uma ação policial na Vila Cruzeiro, zona norte da capital carioca, o governo Castro acumula duas das três maiores chacinas em operações policiais da história do Rio, aponta o estudo (confira a lista abaixo). A ação de maio de 2021 na favela do Jacarezinho, que deixou 28 óbitos, é apontada como a mais letal da história do Rio. A de ontem aparece logo atrás, com o mesmo número de mortes de uma operação realizada em Duque de Caxias, em janeiro de 1998.
Em nota, a Polícia Civil afirmou que "na atual gestão, todos os mortos por tiros de policiais civis disparados durante operações foram de criminosos que entraram em confronto com os agentes". A Polícia Militar e o governo do Estado do Rio de Janeiro também foram acionados, mas não se posicionaram até a publicação da reportagem. O espaço está aberto para manifestações.
Das 39 chacinas sob a gestão Cláudio Castro, 31 ocorreram em operações policiais, indica o levantamento.
Ainda de acordo com o estudo, ações com a intervenção das forças de segurança do Estado provocaram mais de 160 mortes. Só neste ano, foram registradas 85 mortes em chacinas no Estado do Rio de Janeiro.
É inaceitável o que vem acontecendo ao longo dos últimos meses. A gestão Cláudio Castro não tem nenhum comprometimento com o principal problema de Segurança Pública no Rio, que é a letalidade policial. O governo do Rio apresentou um plano de redução por força de decisão judicial que é absolutamente protocolar"
Daniel Hirata, pesquisador do Geni-UFF
Só em 2021, policiais do Rio de Janeiro mataram 1.356 pessoas, segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública). "Isso equivale a 22% das mortes por intervenção policial do ano passado [em todo Brasil], colocando as polícias cariocas entre as mais letais do país", afirma Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
A Polícia Civil afirmou que desconhece os dados do estudo e trabalha com informações oficiais do ISP, que, segundo a corporação, mostram queda de 30% nas mortes por intervenção de agentes do estado no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado.
Ações com 'padrão' de chacina
Um outro estudo do Geni-UFF, que leva em consideração as ações policiais entre 2007 e 2021, aponta que a presença de unidades especiais torna as ações "mais propensas a resultarem em chacinas".
De acordo com a análise, a presença em conjunto da Core (Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais) da Polícia Civil e do Bope (Batalhão de Operações Especiais) da Polícia Militar aumenta em até seis vezes a probabilidade de chacinas. A Core participou da ação de maio de 2021 no Jacarezinho. Já o Bope esteve na ação desta terça na Vila Cruzeiro.
"As operações do Jacarezinho e da Vila Cruzeiro se enquadram nas características típicas das chacinas policiais, com a presença das unidades especiais e em ações emergenciais, que tendem a ser mais violentas do que as planejadas", compara Hirata.
Maiores chacinas em ações policiais no Rio
- Jacarezinho (maio de 2021) - 28 mortos
- Vila Cruzeiro (maio de 2022) - 23 mortos
- Vila Operária, em Duque de Caxias (janeiro de 1998) - 23 mortos
- Complexo do Alemão (junho de 2007) - 19 mortos
- Senador Camará (janeiro de 2003) - 15 mortos
- Fallet (fevereiro de 2019) - 15 mortos
- Complexo do Alemão (julho de 1994) - 14 mortos
- Complexo do Alemão (maio de 1995) - 13 mortos
- Vidigal (julho de 2006) - 13 mortos
- Catumbi (abril de 2007) - 13 mortos
MPF apura violações de agentes
O MPF (Ministério Público Federal) abriu procedimento para apurar possíveis violações na conduta dos agentes envolvidos na ação desta terça-feira na Vila Cruzeiro.
Segundo o MPF, o órgão foi avisado pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) de que a ação policial seria realizada para "eventual cumprimento de mandados de prisão e de desarticulação de organização criminosa".
Em nota, Eduardo Benones, procurador da República, lembrou que o mesmo local foi palco de operação com oito mortos durante outra ação da PRF em fevereiro deste ano.
"O Brasil é signatário de tratados e acordos internacionais que nos obrigam a investigar e punir violações de direitos humanos. [As mortes] não podem ser investigadas como se fossem simples saldo de operações policiais", disse.
Ação não seria tolerada em bairros nobres, diz Defensoria
Na manhã de quinta (26), a Secretaria Estadual da Saúde havia informado que 26 pessoas morreram na chacina —de acordo com dados das unidades de saúde e da Polícia Militar. Mais tarde, no entanto, a Polícia Civil confirmou 23 óbitos e alegou que três outras vítimas eram de um confronto entre traficantes no Morro do Juramento, a 5,5 km da Vila Cruzeiro. Nenhum dos mortos identificados até o fim da semana era do Bope (Batalhão de Operações Especiais) ou da PRF (Polícia Rodoviária Federal), que participaram da ação.
O Ministério Público disse que a justificativa da ação policial foi a movimentação de criminosos do CV (Comando Vermelho) da Vila Cruzeiro para a Rocinha. Já a Defensoria Pública criticou a operação que "jamais seria tolerada em bairros nobres" do Rio.
O núcleo de defesa dos direitos humanos e a ouvidoria da Defensoria estiveram no Complexo da Penha acompanhando a ação. "Até o momento, se está apurando a legalidade da operação e a proporcionalidade do uso da força", informou o órgão.
De acordo com a corporação, "criminosos começaram a fazer disparos de arma de fogo na parte alta da comunidade". Os tiros na região da Penha começaram por volta de 4h20. Moradores relatam momentos de terror durante a ação policial.
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