Valério pode pegar mínimo de dez anos de prisão, e Dirceu, de três; entenda como as penas são calculadas
Depois de encerrada a última fatia do processo do mensalão, o julgamento segue para sua última etapa: a dosimetria- quando os ministros definirão quais as penas dos 25 réus condenados pelos crimes de formação de quadrilha, gestão fraudulenta de instituição financeira, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Por exemplo, Marcos Valério pode pegar o mínimo de dez anos de prisão e José Dirceu, três anos. É o que explica o advogado criminalista Fabio Tofic Simantob, que acompanhou a sessão desta segunda-feira (22) na redação do UOL.
Crime | O que é | Pena |
Formação de quadrilha (art. 288 do Código Penal) | Associação de mais de três pessoas com a finalidade de cometer crimes | de 1 a 3 anos de prisão |
Corrupção ativa (art. 333 do Código Penal) | Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício | de 1 a 8 anos de prisão e multa* |
Corrupção passiva (art. 317 do Código Penal) | Solicitar ou receber para si ou para outra pessoa, direta ou indiretamente, uma vantagem indevida ou aceitar promessa de tal vantagem em razão da função que exerce, ainda que fora da função ou antes de assumi-la | de 1 a 8 anos de prisão e multa* |
Peculato (art. 312 do Código Penal) | Apropriação por funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, em razão do cargo, ou desviá-lo em proveito próprio ou alheio | de 2 a 12 anos de prisão |
Gestão fraudulenta de instituição financeira (art.4º da Lei nº 7.492/ 1986) | Gerir fraudulentamente instituição financeira | de 3 a 12 anos, e multa |
Lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei de Lavagem de Dinheiro - nº 9.613/1998) | Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal | reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa** |
Evasão de divisas (art.22 Lei nº 7.492/ 1986) | Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do país. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente | de 2 a 6 anos de prisão e multa |
* A legislação prevê também o aumento em um terço da pena no caso do réu ter atrasado ou deixado de praticar algum ato de ofício em consequência da vantagem ou promessa de vantagem e ainda se ele fez alguma ação que infringiu o dever funcional. Assim, "se o funcionário (público) pratica, deixa de praticar, ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem" tem pena de 3 meses a 1 ano e multa. A pena foi alterada em 2003 para de 2 a 12 anos. |
** A pena será aumentada de um a dois terços, se os crimes definidos nesta lei forem cometidos de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa. A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime. |
Entre os condenados estão ainda os membros da cúpula do PT (Partido dos Trabalhadores) José Genoino e Delúbio Soares, dirigentes do Banco Rural, o deputado João Paulo Cunha e o ex-deputado Roberto Jefferson.
No entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), houve pagamento de propina a parlamentares e pessoas ligadas a partidos aliados do governo em troca de apoio político. O pagamento era indicado pelo comando do PT e colocado em prática pelo publicitário Marcos Valério, seus ex-sócios e funcionárias, com o apoio estratégico de dirigentes dos bancos Rural.
Denunciado em 2005 pelo então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), o mensalão foi o maior escândalo do governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006 e 2007-2010).
Ordem dos votos
Independentemente da forma escolhida pelo relator para apresentar as penas, a fala sobre cada réu é individualizada. Joaquim Barbosa deve ler seu voto sobre todos os crimes cometidos pelo réu, e então irá declara a pena e multa que definiu.
Para racionalizar esta etapa, os ministros devem seguir o relator ou revisor e apenas acrescentar suas sugestões até que se chegue a um consenso.
“Dosimetria é uma coisa muito simples, é o critério trifásico (...). O tempo depende do grau de convencimento do relator e do revisor”, avaliou o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski.
“Meu voto será rápido porque os fatos já estão todos delineados. Agora resta saber se há um vínculo, um elo subjetivo entre os réus ou não para cometer crimes”, completou Lewandowski, que tem tomado, ao longo do julgamento, praticamente o mesmo tempo que o ministro-relator Joaquim Barbosa para proferir seu voto.
Os ministros devem decidir ainda se os magistrados que inocentaram o réu votam pela pena.
Penas
Para fixar a pena, cada ministro terá de se atentar a uma lista de itens como: culpabilidade, antecedentes criminais, conduta social, personalidade dos réus, motivos, circunstâncias do crime e comportamento. Vale lembrar que penas de até dois anos já prescreveram.
Somado a isso, a elaboração da pena passa por três fases: o ministro define a “pena-base”; depois analisa as circunstâncias agravantes e as atenuantes e, então, determina, o que se chama de “pena em concreto”.
O artigo 68 do Código Penal destaca que “no concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua”.
Atenuantes da pena podem ser, por exemplo: o desconhecimento do réu sobre a lei e o fato de ele ter confessado a autoria do crime, espontaneamente, perante a autoridade, entre outros.
Já os agravantes variam caso o réu tenha organizado a cooperação no crime; determinado que outras pessoas participem, entre outros aspectos.
Há ainda a análise detalhada de quantas vezes o crime foi cometido além da soma deste com os outros crimes diferentes cometidos pela mesma pessoa.
Em cada caso, o ministro definirá se houve concurso material -quando a pessoa é condenada a mais de um crime (o mesmo ou não)-, o que gera mais de um resultado e as penas aplicadas são somadas) ou crime continuado -quando uma pessoa, por meio de uma ação, pratica dois ou mais crimes relacionados, sendo que um é a continuação do outro. Nesse caso, aplica-se a pena de um dos crimes, se forem iguais, ou a do mais grave, com aumento de um 1/6 a 2/3 da pena.
Há ainda a discussão sobre qual lei deve ser seguida, dependendo se forem analisados os crimes separadamente ou em continuidade. Por exemplo, a lei de corrupção de 2003 dá pena de 1 a 8 anos de prisão, já a lei posterior prevê pena de 2 a 12 anos. Se os ministros entenderem que o primeiro crime é o que vale, será aplicada a lei anterior.
Para a definição das penas, os juízes devem seguir o que estipula a legislação, no caso, o código penal (Lei nº 2.848/1940); a lei de lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/1998) e a lei “do colarinho branco” (da Lei nº 7.492/ 1986).
Polêmicas
Antes da discussão sobre as penas, os ministros precisam discutir, primeiro, algumas polêmicas que permearam as discussões durante os cerca de três meses de julgamento.
A principal delas se refere ao procedimento no caso do empate, fato que ocorreu por seis vezes. Há quem defenda que: “em caso de dúvida, o decisão é em favor do réu” e também há os que, pelo fato da corte estar com número par, de 10 ministros, prefiram o voto de desempate, “de qualidade” ou de minerva, como é chamado. O voto de qualidade é proferido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal.
Ainda com relação ao empate, os ministros deverão decidir se aqueles magistrados que votaram pela absolvição poderão participar da definição da pena ou não.
“Quem ficou vencido não palpita na dosimetria. Foi o que foi decidido no plenário. Eu até fiquei vencido nisso. Tem que se construir uma solução antes porque senão vira uma operação matemática. Pode chegar a bom termo, a um consenso. O colegiado é mais inteligente que as individualidades”, destacou o ministro Gilmar Mendes, que se posicionou pela agilidade na conclusão do julgamento.
Defesa e acusação indicam parâmetros para penas
Tanto os advogados dos réus quanto o Procurador Geral da República, Roberto Gurgel – autor da acusação – entregaram antes da dosimetria memorias aos ministros da Suprema Corte.
No documento, os defensores destacaram questões adicionais como atenuantes, como explica advogado de José Genoino, ex-presidente do PT, Luiz Fernando Pacheco.
“Na dosimetria, o juiz tem que avaliar em primeiro lugar o passado da pessoa, se tem antecedentes. O Genoino tem ótimos antecedentes. Ele é primário, ele foi preso e processado no regime militar. É uma pessoa com uma trajetória de vida honesta e trabalhadora, sempre a serviço de um projeto político para o país”, afirmou Pacheco sobre itens que abordou no documento.
No caso do procurador-geral, o enfoque é outro. “O importante é que a dosimetria é uma atividade do juiz, uma atividade do Supremo Tribunal Federal. E o Ministério Público e, da mesma forma a defesa, não sugere penas. A gente pode, apenas, sugerir alguns parâmetros a serem observados”, afirmou Gurgel.
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