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Após condenar petistas, Ayres Britto diz que projeto de poder do PT era "golpe"

Do UOL, em Brasília

10/10/2012 18h25Atualizada em 10/10/2012 20h47

O ministro Ayres Britto, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), votou nesta quarta-feira (10) por condenar os réus do núcleo petista por corrupção ativa no mensalão – o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente da sigla, José Genoino, e o ex-tesoureiro do partido, Delúbio Soares. Em um voto duro, ele chegou a afirmar que o projeto de poder do PT era “golpe”. "[O objetivo do esquema era] um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto", afirmou Ayres Britto após condenar oito réus.

Além da cúpula petista, Britto condenou os réus do chamado núcleo publicitário. Foram condenados por corrupção ativa o chamado núcleo publicitário, formado por Marcos Valério --apontado como o operador do mensalão--, seus ex-sócios Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Rogério Tolentino, e a ex-funcionária da agência de publicidade SMP&B Simone Vasconcelos. Foram inocentados pelo Supremo Geiza Dias, ex-funcionária da SMP&B, e o ex-ministro dos Transportes e atual prefeito de Uberaba (MG), Anderson Adauto.

Em nota, o PT se disse vítima de "hipocrisia e intolerância". O documento, obtido pela "Folha de S.Paulo", foi assinado pelo presidente petista, Rui Falcão, deverá ser oficialmente apresentado nesta quarta-feira em reunião do diretório em São Paulo.

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  • Arte UOL

Ayres Britto também concordou com a tese de que Dirceu era o mandante do esquema. “[Dirceu] era de fato o primeiro-ministro do primeiro governo, instalado a partir de 2003", afirmou o magistrado, citando trechos do depoimento à Justiça do ex-ministro da Casa Civil . "Ele deixa claro que tudo passava pelas mãos dele. [Dirceu] era plenipotenciário". Ainda no debate sobre o papel de Dirceu no mensalão, o ministro Ayres Britto cita depoimento dele sobre a sua atuação como articulador político.

Segundo Britto, o papel de Dirceu era "extremamente concentrador de poder político" . "O papel de centralidade de José Genoino está abaixo do papel de centralidade de José Dirceu", afirmou.

Após a fala de Ayres Britto, o ministro Celso de Mello interveio e voltou a reforçar a aplicação da Teoria do Domínio do Fato e ressalta que os dirigentes fizeram a repartição de atribuições do projeto criminoso.

Segundo a Teoria do Domínio do Fato, é possível atribuir responsabilidade penal a um réu que pertence a um grupo criminoso mas que, por ocupar função hierarquicamente superior, não é o mesmo sujeito que pratica o ato criminoso. Vários ministros usaram a teoria para condenar Dirceu como mandante.

A advogada Fernanda de Almeida Carneiro, criminalista e professora da Escola de Direito do Brasil (EDB), que acompanhou o julgamento na redação do UOL, explica que a teoria do domínio de fato é quando o autor seria não apenas aquele que realiza a conduta típica, mas também aquele que, sem praticar o fato em si, planeja e decide a atividade dos demais.

Marco Aurélio respondeu e ressaltou que não há crime no fato de os partidos votarem de forma igual em relação a determinada matéria. "O crime está em votar a partir da cooptação pela prata", disse.

O ministro-revisor Ricardo Lewandowski, que votou por absolver Dirceu, interveio e afirma que, para ele, falta um dos requisitos essenciais para aplicar a Teoria do Domínio do Fato em relação ao pagamento de "suposta propina".

Marco Aurélio o interrompeu e disse que, no entender da maioria dos magistrados, chegou-se à conclusão de que houve mesmo propina, ao que Lewandowski rebate que é preciso, até que seja proclamado o resultado, é preciso se referir à propina como suposta ou alegada.

 

STF conclui que Dirceu chefiou mensalão

Além de Britto e Mello, mais cinco ministros afirmaram que Dirceu comandou o mensalão --Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Joaquim Barbosa-- e dava respaldo a Genoino e ao ex-tesoureiro Delúbio para que realizassem as negociações de compra de apoio político dos parlamentares da base aliada de Lula.

Condenaram Dirceu o relator Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Britto. Genoino e Delúbio foram condenados pelos mesmos ministros, além de Dias Toffoli, que absolveu Dirceu. O revisor Ricardo Lewandowski inocentou Dirceu e Genoino, mas condenou Delúbio.

"O ex-ministro José Dirceu, que homologava os acordos daquele partido, acordos que vimos (...) extravasaram e muito o campo simplesmente político. Não podemos ante a disputa acirrada partidária imaginar partidos altruístas, que se socorram mutuamente", afirmou Marco Aurélio. "As reuniões, pasmem, ocorriam no Palácio do Planalto", acrescentou o magistrado.

Gilmar Mendes citou depoimentos de diversas testemunhas que afirmam que Dirceu não participava das reuniões para negociar o acordo entre o PT e o PTB, mas era contatado por Genoino ou Delúbio logo depois que era fechado algum acerto. “Depois das conversas, sempre havia uma ligação ou do Delúbio ou do Genoino para José Dirceu.”

Já Lúcia considerou que, apesar de não haver documentos assinados por Dirceu, ele era informado das negociações por Delúbio. "Não há nenhum documento assinado por ele que levasse à comprovação dos atos de corrupção ativa que lhe são imputados, mas, na declaração de Delúbio Soares, ele afirma que tinha respaldo para as operações (...) além de haver reuniões na Casa Civil", afirmou.

O relator, por sua vez, disse que Dirceu tinha papel central no esquema do mensalão. "O conjunto das provas coloca o então ministro em posição central (...) como mandante das promessas de pagamentos indevidos aos parlamentares", afirmou Barbosa durante voto na última quarta-feira (3).

Novo item

Após o voto de Ayres Britto, o relator Joaquim Barbosa iniciou, por volta das 18h45, o julgamento do item 7 da denúncia, que trata do crime de lavagem de dinheiro por deputados e assessores do PT, além de Anderson Adauto.

Serão julgados neste item os ex-deputados federais João Magno de Moura (PT-MG), Paulo Rocha (PT-PA) e Professor Luizinho (PT-SP). Além deles, são acusados também José Luiz Alves, ex-chefe de gabinete de Adauto, e Anita Leocádia, intermediária dos saques feitos a mando de Rocha.

Segundo a PGR, os seis réus, juntos, receberam R$ 2,3 milhões do valerioduto. Adauto teria recebido R$ 1 milhão, sob intermédio de José Luiz Alves; Rocha, R$ 920 mil, com ajuda de Leocádia; Moura teria recebido R$ 350 mil; e Luizinho, R$ 20 mil, por meio de um intermediário que não foi denunciado.