Esquerda mexicana revela xenofobia ao excluir naturalizados de novo cargo
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Gabinete Presidencial/AP
O presidente eleito do México, Enrique Peña Nieto, (à direita) recebe a bandeira do país das mãos do então presidente Felipe Calderón
No dia 9 de fevereiro, o The New York Times publicou uma nota sobre a Comissão Nacional Anticorrupção a ser criada no México, onde citava a opinião da bancada do Partido da Revolução Democrática no Senado sobre como deveria ser a figura que a representará: "a bancada do PRD defende que deve ser mexicano de nascimento, com uma idade mínima de 30 anos, advogado com experiência de 10 anos e ter dois anos de residência no país".
No dia 25 de setembro de 1919 foi fundado o Partido Comunista Mexicano por, entre outros, Manabendra Nath Roy (o famoso agente indígena da Internacional Comunista, cuja casa em Colonia Roma é um lugar da moda) e Mikhail Borodon (famoso personagem de "A Condição Humana", de André Malraux). O líder da bancada do PRD no Senado, Silvano Aureoles Conejo, certamente não vê nenhuma ligação entre esses dois assuntos, nem lembra que o PRD nasceu com o registro do PCM, que por sua vez surgiu da fusão do Partido Mexicano dos Trabalhadores (PMT) e do Partido Socialista Unificado do México (PSUM), e que este último surgiu do antigo Partido Comunista Mexicano, que obteve sua legalização em 1978. No entanto, a ligação é evidente.
Tratei de indicar em meu livro "Mañana o pasado": o mistério dos mexicanos, o caráter aberrante da obsessão mexicana de negar acesso aos mexicanos por escolha (ou seja, naturalizados) a uma imensa quantidade de postos, de cargos públicos, tanto por eleição popular quanto por designação: presidente, governadores, presidentes municipais, conselheiros, deputados federais, senadores, membros da Suprema Corte, membros das juntas de governo do Banco do México, do IFE, da UNAM, do INEGI etc. etc. Sublinhei que era particularmente estúpido que um país com mais de 10% de seus habitantes residindo em outro país, onde lhes são negados todo tipo de direito, defendesse semelhante exclusão. É absurdo atribuir esses excessos ao terror que desde o século 19 as elites mexicanas sentem pelo fantasma da dupla lealdade, dos agentes secretos que chegaram a nossa pátria para tirá-la de nós.
No entanto, nem em meus maiores delírios antinacionalistas pensei que no ano de 2013 a fração aparentemente moderna, conciliadora, reformista da esquerda mexicana voltasse à mesma idiotice: excluir naturalizados, de um novo cargo que sequer foi criado ainda. Entendo que gente como Silvano Aureoles e seus colegas – como Jesús Ortega, Jesús Zambrano, Mario Delgado, Armando Ríos Piter e outros – procurem tirar do PRD da cidade medieval ou da fortaleza sitiada onde foi deixada por Andrés Manuel López Obrador há quase 15 anos. Valorizo, reconheço e admiro seus esforços. Mas se não são capazes de livrar-se das teias de aranha do antiquado nacionalismo mexicano que se reflete nessa postura mais que retrógrada, sua atualização se limitará a fotos com Enrique Peña Nieto, sorrisos cordiais e negociações exclusivamente burocráticas.
Certamente isso é melhor que nada, a mudança em relação ao mandato anterior é digna de nota e louvável. Mas se não passar disso, Andrés Manuel López Obrador passará à sua frente. Ele não se preocupa com essas mesquinharias, nem se interessa pelas ideias vanguardistas, pela abertura do México ao mundo ou pela modernidade. Para ele e seus seguidores de Morena, tudo isso é na prática uma rusga. A única opção de triunfo, dentro daquilo que se chama a esquerda mexicana, consiste na batalha de ideias. E com ideias como a que se manifesta na declaração da bancada do PRD no Senado a respeito dos integrantes da Comissão Nacional Anticorrupção, não se chega nem à primeira base, para recorrer a uma metáfora que sem dúvida o tabasquenho gostaria.
Tradutor: Jorge G. CastañedaJorge Castañeda
Jorge Castañeda foi chanceler do México e é autor de uma das mais extensivas biografias já publicadas sobre Che Guevara.