Acordos migratórios dos Estados Unidos
Há duas semanas, adiantei neste espaço duas previsões sobre o México e os Estados Unidos. Uma se confirmou, já que Obama enviará em breve uma proposta de reforma migratória integral ao Congresso, segundo informações do "New York Times" de domingo (13).
Talvez anuncie alguns elementos da dita reforma em seu informe presidencial: legalização e caminho para a cidadania, com multas e condições, para os 12 milhões de imigrantes ilegais (metade deles sendo mexicanos); a expedição acelerada de vistos permanentes de todos os tipos e facilitação dos trâmites de reunificação familiar; e um novo programa de trabalhadores temporários: "the whole enchilada", o pacote completo. Obama parece contar com os votos no Senado para sua reforma, mas nada garante que o mesmo aconteça na Câmara de Representantes.
A segunda previsão se referia à postura do governo de Enrique Peña Nieto. Esperei que suas insinuações de novembro em Washington se traduzissem em uma política definitiva, mas duvidava que fosse acontecer; e pensei que adotaria uma postura conservadora de "não intervenção". Temo ter tido razão.
Segundo versões da imprensa (nem sempre muito confiáveis), Eduardo Medina Mora, o novo embaixador do México nos Estados Unidos, ao ser ratificado pela Comissão Permanente afirmou:
"Embora a reforma migratória seja um tema de política interna nos Estados Unidos, o governo mexicano dará voz aos mexicanos e defenderá seus interesses. Não é um tema de relação bilateral. Temos [...] um interesse muito grande [...] em fazer valer uma argumentação que aumente as oportunidades para eles".
Trata-se de uma posição respeitável, sobretudo se comparada com uma leitura simplista, mas compreensível, da que imperou durante o mandato de Fox e de Calderón (de cujos gabinetes Eduardo Medina Mora foi membro). Mas, é uma exceção no contexto radicalmente distinto que hoje impera nos Estados Unidos a respeito da reforma migratória; porém, é compreensível que um governo como o de Enrique Peña Nieto e Eduardo Medina Mora prefira ser cauteloso e não pleitear ativamente pela reforma.
O problema reside em uma leitura equivocada da história dos Estados Unidos. Durante o século 20, Washington assinou vários acordos migratórios com diferentes países. Três breves exemplos: o primeiro foi o chamado Acordo de Cavalheiros (Gentlemen"s Agreement) celebrado com o Japão, e que vigorou de 1907 a 1924, regulando o volume e o ritmo da migração japonesa para os Estados Unidos, assim como as condições de trabalho (reprováveis, certamente) daquela que viria a ser a população nissei.
O segundo, como todos sabem, foi o chamado "Programa Bracero" ou Mexican Farm Labor Program, firmado pelos governos de Roosevelt e Ávila Camacho em 1942, e que durou até 1964, quando foi abolido, e que regulou a imigração de milhões de trabalhadores mexicanos (também em condições deploráveis) para os Estados Unidos, para trabalhar na agricultura, mas também na indústria durante a Segunda Guerra.
O terceiro país com o qual os Estados Unidos formalizaram vários acordos migratórios foi, obviamente, Cuba. Nesse caso foram três convênios: o primeiro, em 1965, chamado de Camarioca, o povoado de onde foi lançada a ponte aérea que ao longo de oito anos transportaria 268 mil cubanos nos Estados Unidos.
O segundo foi negociado em 1984, como resultado do Êxodo de Mariel 4 anos antes; ele contemplou a expedição de 20 mil vistos por ano a imigrantes cubanos para entrarem nos Estados Unidos.
Não foi respeitado por nenhum dos dois países, o que deu lugar ao êxodo de agosto de 1994, que por sua vez resultou no terceiro acordo: de Clinton com Castro, novamente estabelecendo o número de vistos em um mínimo de 20 mil por ano, e estabelecendo a chamada política do Wet Foot-Dry Foot (pé molhado-pé seco), posteriormente ampliada para Dusty Foot (pé empoeirado).
A migração não pertence à agenda bilateral? Somente à política interna dos Estados Unidos? É a posição possivelmente lógica de Eduardo Medina Mora, mas não da tradição norte-americana. Talvez seja preferível assumi-la como postura própria, sem atribuí-la à história mal digerida de outro país.
Tradutor: Lana LimJorge Castañeda
Jorge Castañeda foi chanceler do México e é autor de uma das mais extensivas biografias já publicadas sobre Che Guevara.