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Pânico, caos e até fralda: o que quase ninguém vê na dispersão dos desfiles

Daniel Lisboa

Colaboração para o UOL, em São Paulo

02/03/2019 08h35

Não importa se a Império da Casa Verde conseguiu, mesmo se por muito pouco, completar seu desfile no Anhembi sem extrapolar os 65 minutos regulamentares: Lucas Santos leva as mãos ao rosto, é acudido por duas amigas e parece estar prestes a sofrer um ataque de pânico.

Quem vê a cena acha que já era, a escola já ultrapassou o tempo permitido e está irremediavelmente punida. Uma emissora de TV corre para registrar o desespero de Santos. Não se trata, porém, da dor de alguém que viu um ano de trabalho se perder, como é comum no Carnaval

Beijo no asfalto - Daniel Lisboa/UOL - Daniel Lisboa/UOL
Lucas Santos beija o chão do Sambódromo após o desfile da Império da Casa Verde
Imagem: Daniel Lisboa/UOL

Santos, apresentador de casal da Império, chegou a desmaiar só de vislumbrar tal possibilidade. "Minha escola não merece isso", ele diz, já recomposto do susto e logo antes de beijar o asfalto molhado pela chuva. "Por que eu fiquei tão nervoso assim? Isso se chama amor", explica.

Cenas como esta são comuns no pedaço mais caótico, e menos visível, do desfile das escolas de samba de São Paulo no Sambódromo do Anhembi: a chamada área de dispersão.

É nela que os desfiles terminam, pessoas choram de tristeza e alegria, gente que trabalhou um ano pelo Carnaval comemora ou lamenta o que acaba de acontecer na passarela, e uma miríade de profissionais tenta o que parece impossível: tirar milhares de integrantes e carros alegóricos gigantes dali, o mais rápido possível sem que ninguém morra ou se machuque, para dar espaço à próxima escola.

Cansaço e xodó

Alexandre Teixeira - Mariana Pekin/UOL - Mariana Pekin/UOL
Imagem: Mariana Pekin/UOL

"Olha, perder mesmo, acho que perdi uns 500 gramas, porque eu quase não tenho gordura", diz Alexandre Teixeira, 40. Membro da comissão de frente da Mancha Verde, ele está estirado no chão, o celular sobre a barriga "trincada", e parece incapaz de flexionar o mindinho tamanho seu cansaço após o desfile.

Eu desfilo faz tempo, mas nunca fiquei tão cansado. Pelo menos estou feliz, satisfeito com o nosso desfile. Porque sim, sabemos quando fazemos um desfile de merda. Alexandre Teixeira

Também da Mancha Verde, Sérgio Santana, o "Geleia", 55, é o responsável por uma relíquia da escola. E não estamos falando de um carro alegórico ou da senha bancária da patrocinadora. É ele quem dirige um ônibus de linha modelo 1982, pintado com as cores da agremiação.

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"Esse aí é um xodó do presidente Paulo Serdan", conta Santana. Hoje, o ônibus leva apenas oito pessoas e instrumentos musicais da escola. "Às vezes tem que fazer uma manutenção, mas funciona bem. Melhor que esses de hoje, cheio de botões automáticos, que, se você vacilar, dá erro."

Manobristas de luxo

A Acadêmicos do Tucuruvi foi outra escola que por pouco não ultrapassou o tempo regulamentar. E lá estava, ainda antes do desfile acabar, Wagner Reis, 25, agachado com as mãos na cabeça. Mais um desesperado com a iminente perda de pontos? "Nada disso, nem estava prestando atenção no tempo. É emoção mesmo, de ver o trabalho do ano todo concluído."

Para Reis, a emoção vem principalmente do fato de o desfile da Tucuruvi, neste ano, ter "buscado a libertação de cada um de nós, independentemente da cor, credo ou raça".

Integrante é consolado por colega na dispersão do Acadêmicos do Tucuruvi - Mariana Pekin/UOL - Mariana Pekin/UOL
Integrante é consolado por colega na dispersão do Acadêmicos do Tucuruvi
Imagem: Mariana Pekin/UOL

As escolas largam seus gigantescos carros alegóricos, e alguém tem que tirá-los da área de dispersão com destreza. Esses "alguéns" têm nomes como Ricardo Matos, 38. Há 12 anos no ofício, ele garante que ainda se emociona com os desfiles tal qual um integrante de uma escola de samba.

"É muita responsabilidade. Se eu não fizer meu trabalho direito, prejudico a escola", lembra Matos. Para mostrar que sabe do que está falando, ele aponta um carro alegórico recém-estacionado. "Olha aí o que eu falei. Eu disse pro cara da escola que não era pra parar aí, que ia dar ruim. Presta atenção."

Poucos minutos depois, um outro funcionário do Liga tenta manobrar o carro alegórico com um trator. Não consegue. Ele balança a cabeça, contrariado. O veículo não deveria estar ali. Matos tinha razão.

Fralda geriátrica

Rita de Cassia Pinheiro tem 60 anos e pesa 50 quilos. Acaba de desfilar pela Acadêmicos do Tatuapé e começa a tirar a fantasia que, ela calcula, pesa 30 quilos. Na medida em que vai se despindo, Rita revela estar usando fralda geriátrica - nos braços e ombros.

"Todo mundo faz essas coisas, é o único jeito da fantasia não machucar", explica Rita. O segredo pra aguentar tamanho tranco? "Não tem. Minha academia são os ensaios. O médico acha até graça da minha saúde."

Preocupação e alívio

No penúltimo desfile do dia, o da X-9 Paulistana, uma multidão se aglomera ao redor de uma ambulância. O veículo leva uma das grandes estrelas da primeira leva de apresentações do Carnaval de São Paulo. Arlindo Cruz está lá dentro. Para alívio geral, inclusive da reportagem, só por precaução.

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