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Carolina Brígido

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Orçamento secreto joga STF numa encruzilhada entre Lira e Lula

Plenário do STF -                                 ROSINEI COUTINHO/STF
Plenário do STF Imagem: ROSINEI COUTINHO/STF

Colunista do UOL

07/12/2022 04h00Atualizada em 07/12/2022 07h32

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Rosa Weber assumiu a presidência do STF (Supremo Tribunal Federal) em setembro com uma prioridade: tirar o tribunal dos holofotes e deixar o palco livre para a política. Ela bem que tentou não incluir na pauta de julgamentos processos polêmicos. Mas não conseguiu escapar do orçamento secreto.

Na última sexta-feira (2), aos 45 do segundo tempo, Rosa Weber pautou o processo que discute a constitucionalidade das emendas de relator. A votação deve começar nesta quarta-feira (7), antepenúltima sessão do ano no plenário. Como o relatório e o voto da ministra são longos, o julgamento deverá ser estendido para a próxima semana.

O gesto da ministra carrega alguns simbolismos. O primeiro deles é o recado que o STF pode até deixar o caminho livre para a política, mas não pode deixar de encarar questões espinhosas quando elas não são resolvidas no Congresso Nacional e no Executivo. O orçamento secreto é um desses temas.

Pelos acordos políticos, o modelo pouco transparente implementado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com a anuência de Jair Bolsonaro, tem tudo para continuar em vigor.

Embora tenha dado declarações na campanha contrárias ao orçamento secreto, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) preferiu não comprar essa briga com Lira. Em troca, ganhou o apoio fundamental para a aprovação da PEC da transição. Diante do impasse, Rosa Weber considerou importante o STF entrar no assunto.

Mas não é só isso. Ainda que o julgamento seja interrompido por um pedido de vista, como se cogita nos bastidores do tribunal, a ministra vai conseguir apresentar o voto. Como relatora, será a primeira a se manifestar no plenário.

A expectativa na corte é que Rosa Weber se despeça do governo Bolsonaro com uma espécie de nota de repúdio à gestão que termina em 31 de dezembro. Em novembro de 2021, quando decidiu sobre o tema pela primeira vez, a ministra disse que o modelo era "incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo". Neste ano, deve repetir o discurso.

No ano passado, Rosa Weber suspendeu a execução do orçamento, por considerar a prática inconstitucional. Depois voltou atrás. Autorizou os pagamentos, desde que o Congresso Nacional fosse transparente na distribuição dos recursos. A promessa dos parlamentares não se concretizou.

Agora, Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tentam colocar essa exigência em prática, para amenizar efeitos mais duros de eventual decisão do STF de colocar um ponto final na farra.

O STF está em uma encruzilhada e tem alguns caminhos para escolher. Um deles é interromper o julgamento com um pedido de vista e deixar tudo como está. A mensagem seria a de que, mesmo que a presidente queira resolver a questão, nem todo mundo no tribunal concorda com ela. A guerra, portanto, continuaria no campo da política.

O outro caminho seria concluir o julgamento, com duas possibilidades: manter o orçamento secreto, ou derrubá-lo. Na primeira hipótese, o STF legitimaria o acordo feito entre Lula e Lira. De quebra, fortaleceria o presidente da Câmara. Na segunda opção, o tribunal abriria caminho para o novo governo ter mais autonomia e ficar menos nas mãos do Congresso. Daria poderes a Lula, sem que o próprio presidente eleito precisasse se desgastar.

Diante das duas opções, o mais provável seria adotar uma terceira saída, um caminho do meio. Isso, claro, na hipótese de ninguém pedir vista e levar a bola para casa. O meio-termo viável seria manter as emendas de relator, mas criar exigências mais específicas para comprovar a aplicação transparente do dinheiro público.

Muitos ministros do Supremo são contra o orçamento secreto e gostariam de derrubá-lo com uma canetada. Foi o que Rosa Weber tentou fazer no ano passado, mas se viu obrigada a recuar. Como disse um ministro à coluna em caráter reservado: "O Supremo pode muito, mas não pode tudo".