Plano de golpe: cronologia mostra passos ensaiados de entorno de Bolsonaro

Tentativa de assassinato dos integrantes da chapa eleita e de um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), monitoramento de rotas e uso de recursos bélicos para montar um plano golpista após as eleições de 2022. O quebra-cabeça da tentativa de golpe de Estado investigada pela Polícia Federal recebeu novas peças com a operação deflagrada na última terça-feira (19).

Nesta quinta-feira (21), a Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o general Braga Netto (que foi candidato a vice na sua chapa em 2022) e mais 35 por tentativa de golpe. A investigação levou à prisão de quatro militares e um policial federal na última terça (19).

O UOL produziu uma cronologia cruzando informações do relatório da PF com fatos políticos de 1º de novembro de 2022 a 9 de janeiro de 2023.

1º de novembro de 2022

O presidente da República e candidato derrotado à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), faz pronunciamento 44 horas após o resultado das urnas ao lado de apoiadores, dentro do Palácio da Alvorada
O presidente da República e candidato derrotado à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), faz pronunciamento 44 horas após o resultado das urnas ao lado de apoiadores, dentro do Palácio da Alvorada Imagem: Gabriela Biló/Folhapress

Após 44 horas de silêncio, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) fez o primeiro pronunciamento após ser derrotado por Lula (PT). No discurso, porém, ele não reconheceu a vitória do petista.

Bolsonaro classificou os atos golpistas como "movimentos populares". A única crítica que fez contra as manifestações foi em relação ao "direito de ir e vir" que, segundo ele, deveria ser preservado, já que os apoiadores vinham interditando dezenas de estradas pelo país.

O silêncio do então presidente serviu de munição para a continuidade dos bloqueios. Em grupos de mensagens, os bolsonaristas defendiam a continuidade dos atos, afirmando que "não é para ninguém desistir".

9 de novembro de 2022

A PF afirma que o general Mario Fernandes imprimiu, nessa data, o documento que detalhava o plano para matar Lula, Alckmin (PSB) e Alexandre de Moraes. Segundo a PF, Fernandes imprimiu o documento no Palácio do Planalto e o levou o material até o Palácio da Alvorada, onde Bolsonaro morava.

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O plano, denominado "Punhal verde amarelo", continha detalhes do monitoramento feito sobre Moraes e uma espécie de passo a passo para executar o plano golpista.

Nesse mesmo dia, o Ministério da Defesa enviou ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) um relatório sobre o resultado das eleições. O documento não apontou nenhum indício de fraude nas urnas, mas afirmou que a análise "não foi efetiva para atestar o correto funcionamento do sistema". Com isso, a conclusão dos militares não serviu para desmobilizar as manifestações.

A PF revelou ontem (19) que o general Fernandes tratou desse assunto com o chefe dele, o general Luiz Eduardo Ramos, que era ministro da secretaria-geral da Presidência.

Em 4 de novembro, cinco dias antes da publicação do relatório da Defesa, ele afirmou a Ramos que o documento deveria estar alinhado às conclusões do consultor argentino Fernando Cerimedo, que havia transmitido uma live, naquele mesmo dia, alegando fraude nas eleições.

Cara, o relatório do MD [Ministério da Defesa], ele não pode ser diferente do que disse essa live argentina
General Mario Fernandes ao então ministro Luiz Eduardo Ramos

Mensagens expõem golpismo de general preso pela PF
Mensagens expõem golpismo de general preso pela PF Imagem: Reprodução
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18 de novembro de 2022

O general Walter Braga Netto (PL) atende apoiadores do então presidente Jair Bolsonaro (PL)
O general Walter Braga Netto (PL) atende apoiadores do então presidente Jair Bolsonaro (PL) Imagem: Reprodução/Instagram/@adriane_moura_vieira

Com Bolsonaro recluso após a derrota, o general Braga Netto foi o primeiro a falar com os manifestantes. No Alvorada, ele pediu aos apoiadores que tivesse "fé". "Vocês não percam a fé, tá bom? É só o que eu posso falar para você agora", disse.

Uma apoiadora se aproximou e disse que enquanto estavam "na chuva e no sol", o presidente permanecia em silêncio. "Tem que dar um tempo", disse o general, que foi candidato à vice naquele ano. Os aliados de Bolsonaro diziam que ele estava deprimido com a derrota, mas as investigações da PF apontam que enquanto isso o ex-presidente fazia mudanças na minuta golpista.

4 de dezembro de 2022

Na data em questão, Carlos Bolsonaro (PL-RJ) publicou uma foto da perna do seu pai com erisipela. O vereador afirmou, na época, que imagem era de "poucos dias atrás". Reportagem do UOL já mostrou que as internações do ex-presidente coincidem com crises pessoais e na família.

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6 de dezembro de 2022

O plano, denominado "Punhal verde amarelo", é novamente impresso pelo general Fernandes no Palácio do Planalto, desta vez Bolsonaro estava no local. Os militares Mauro Cid e Rafael Oliveira, que teriam participado do planejamento, combinaram de chegar ao Planalto quando Bolsonaro já estivesse no prédio.

7 de dezembro de 2022

Bolsonaro recebeu no Palácio do Alvorada os comandantes do Exército e da Marinha, além do ministro da Defesa, para apresentação de uma minuta golpista.

Segundo disse à PF o general Freire Gomes, que comandava o Exército à época, o grupo discutiu alternativas e o então assessor para assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins. "leu os considerandos e fundamentos jurídicos da minuta".

8 de dezembro de 2022

O general da reserva Mario Fernandes, que foi secretário-executivo do ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência) no governo de Jair Bolsonaro (PL), em foto de 2022
O general da reserva Mario Fernandes, que foi secretário-executivo do ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência) no governo de Jair Bolsonaro (PL), em foto de 2022 Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Em uma conversa com Mauro Cid, o general Fernandes diz que as manifestações iriam "esmaecer ou recrudescer". Ele afirma que não poderiam "perder oportunidades", já que perderam outras "tantas".

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O general afirma para Cid que teria conversado com o ex-presidente, que teria dado o aval para um golpe de Estado até o dia 31 de dezembro de 2022.

Pô, a gente tem procurado orientar tanto o pessoal do agro como os caminhoneiros que estão lá em frente ao QG. E hoje chegou para a gente que parece que existe um mandado de busca e apreensão do TSE, não, do Supremo, em relação aos caminhões que estão lá. Então, isso seria importante, se o presidente pudesse dar um input ali para o Ministério da Justiça para segurar a PF ou para a Defesa alertar o CMP [Comando Militar do Planalto].
General Mario Fernandes em conversa com Mauro Cid

9 de dezembro de 2022

Bolsonaro em frente ao Palácio da Alvorada no dia 9 de dezembro de 2022
Bolsonaro em frente ao Palácio da Alvorada no dia 9 de dezembro de 2022 Imagem: Sergio Lima/AFP

Um dia após Fernandes demonstrar preocupação com a desmobilização dos atos golpistas, Bolsonaro fez seu primeiro discurso aos manifestantes no Alvorada. "Quem decide o meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês, para onde vai a Câmara e o Senado são vocês também", disse o então presidente.

Na ocasião, Bolsonaro elogiou os atos e adotou um discurso dúbio. "Se algo der errado é porque eu perdi a minha liderança, eu me responsabilizo pelos meus erros. Mas peço a vocês: não critiquem sem ter certeza absoluta do que está acontecendo", afirmou.

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Não é 'eu autorizo', não. É 'o que eu posso fazer pela minha pátria'
Bolsonaro aos apoiadores no Alvorada

12 de dezembro de 2022

Grupo de bolsonaristas queima carros e ônibus e tenta invadir a sede da Polícia Federal em Brasília no dia 12 de dezembro de 2022
Grupo de bolsonaristas queima carros e ônibus e tenta invadir a sede da Polícia Federal em Brasília no dia 12 de dezembro de 2022 Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Um grupo de bolsonaristas queimou carros e depredou a sede da PF em Brasília após a prisão do líder indígena José Acácio Serere Xavante, conhecido como cacique Serere. Ele foi preso por suspeita de ameaça de agressão e perseguição contra Lula. Serere era figura constante em protestos que pediam intervenção militar.

Na época, a secretaria de segurança do DF chegou a reforçar a segurança nas imediações do hotel em que Lula estava hospedado. Na mesma data ocorreu a diplomação do petista. A operação de segurança foi monitorada pelos militares presos pela PF. Eles também sabiam o passo a passo de Moraes nesse dia.

15 de dezembro de 2022

PF incluiu imagens de armas previstas em plano golpista
PF incluiu imagens de armas previstas em plano golpista Imagem: Reprodução

A investigação da PF apontou que os militares chegaram a colocar em prática um dos planos para executar Moraes, mas o cancelaram de última hora. Eles usaram técnicas avançadas do treinamento militar, posicionando agentes perto do STF e da casa do ministro, mas cancelaram a ação porque o julgamento da Corte terminou mais cedo que o previsto.

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No dia em questão Moraes participou no STF de uma votação sobre o orçamento secreto. O julgamento foi suspenso quando o placar estava em 5 a 4 — o ministro já havia votado, e os militares suspeitos monitoravam a sessão por reportagens na imprensa.

Na mesma data, o ministro autorizou uma megaoperação em oito estados contra atos antidemocráticos, com mandados de prisão e de busca e apreensão e outras medidas. Na época, bolsonaristas protestavam em frente a quartéis pedindo intervenção militar.

Lula participava do evento Natal dos catadores, no centro de São Paulo. Depois, seguiu para um churrasco no Instituto Lula, na zona sul da cidade. Já Geraldo Alckmin (PSB) ficou em Brasília, no evento Pacto pela Aprendizagem.

24 de dezembro de 2022

Na véspera do Natal, um artefato explosivo foi montado próximo ao aeroporto de Brasília. Um homem confessou à polícia a ação e disse que seu objetivo era chamar a atenção de outros apoiadores de Bolsonaro contra a eleição de Lula.

8 de janeiro de 2023

Bolsonaristas invadiram e depredaram os prédios dos Três Poderes em Brasília. Os atos ocorreram após apoiadores do ex-presidente ficarem em frente a quarteis do Exército por meses pedindo intervenção militar. Segundo divulgou ontem a PGR (Procuradoria-geral da República), 284 pessoas já foram condenadas pelo Supremo.

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9 de janeiro de 2023

Um dia após os atos, Moraes determinou a desocupação de todos os acampamentos montados nos quartéis do Exército pelo país. Bolsonaro estava nos Estados Unidos, de onde só retornou em março.

*Colaborou Fabíola Perez, do UOL, em São Paulo

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