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Egito realiza eleições presidenciais com expectativa pelo fim do comando da Junta Militar

Maria Denise Galvani

Do UOL, em São Paulo

23/05/2012 06h00

Depois de mais de meio século de ditadura militar, os egípcios vão eleger o primeiro presidente civil do país em um pleito que terá o primeiro turno nestas quarta (23) e quinta (24). A eleição deverá marcar a saída do poder da Junta Militar que assumiu o comando depois da queda do ditador Hosni Mubarak, em fevereiro do ano passado. A população egípcia já realizou vários protestos contra a Junta Militar. Agora, o CFSA (Conselho Superior das Forças Armadas) promete entregar o poder ao vencedor das eleições até o fim de junho.

Para o cientista político Samuel Feldberg, no entanto, uma resistência dos militares em deixar o poder não pode ser descartada. “Não duvido de nada. Há muito espaço para frustração”, ressalta. “Se os conservadores ganharem, a pergunta será se a sociedade vai sentir alguma mudança. Se ganhar o candidato de um partido islâmico, a dúvida é quanto ao comportamento deles no poder. O discurso é moderado, mas não se sabe como eles devem agir.”

As pesquisas de intenção de voto apontam como principais candidatos antigos aliados de Mubarak, como o general reformado Ahmed Shafiq e o ex-secretário geral da Liga Árabe Amr Moussa, que também foi primeiro-ministro entre 1991 e 2001; ou representantes de movimentos islâmicos, como o moderado Abdel Moneim Aboul Fotouh e Mohamad Mursi, candidato da Irmandade Muçulmana.

Outros três candidatos – Hamdin Sabahi, da esquerda nasserista, o islamita Selim al Awa e o militante pró-direitos humanos Khaled Ali – correm por fora e podem obter votações expressivas. Se nenhum dos 12 candidatos à presidência conseguir a maioria absoluta, um segundo turno será realizado nos dias 16 e 17 de junho.

“Não vejo por onde haver um retrocesso para o autoritarismo, ao contrário do que querem acreditar algumas potências ocidentais”, diz o diretor de Relações Internacionais do Instituto de Cultura Árabe, Murched Taha. “O novo Presidente da República deve dissolver o Conselho Militar e governar junto ao Parlamento e o Judiciário, que é forte no país”, completa.

Parlamento

Em novembro do ano passado, as eleições legislativas levaram ao poder uma maioria de representantes do Partido Justiça e Liberdade, ligado à Irmandade Muçulmana. O resultado das eleições parlamentares pode favorecer a candidatura do islamita moderado Abul-Futoh, na opinião de Taha. “Acho que muitos eleitores se arrependeram do apoio dado à Irmandade Muçulmana nas eleições legislativas, que se mostrou muito confrontadora depois de chegar ao poder. Futoh tem um discurso mais moderado e obteve o apoio de muitos jovens que lideraram os protestos da Primavera Árabe”.

Até agora, o parlamento não chegou a um acordo quanto às atribuições do futuro presidente. Enquanto uma nova Constituição não é aprovada, há margem para dúvidas. O Conselho Militar havia convocado os partidos políticos a apresentarem uma solução até o ultimo domingo (20), mas representantes das legendas nem sequer conseguiram se reunir para discutir o problema.

“Os militares estão no poder há mais de 50 anos. Antes disso, havia uma monarquia. Não há experiência com democracia no país, por isso a grande dúvida é como vai funcionar um governo democrático, com um parlamento dominado por um partido islamita. Só o tempo dirá”, avalia Feldberg.

A organização das eleições ficou a cargo de mais de 12 mil juízes. O CFSA convocou membros do Exército para fazer a segurança nas zonas eleitorais. Cerca de 50 milhões dos 82 milhões de egípcios são considerados aptos a votar.

Observadores de organizações locais, de três ONGs internacionais e da Liga Árabe vão fiscalizar as eleições. Outras 200 pessoas ligadas aos movimentos revolucionários de 2011 devem trabalhar como observadores informais.

Israel

“Todos os candidatos afirmaram durante a campanha que vão rever o acordo de paz com Israel, assinado em 1979. Vai haver mudança no status quo dos últimos 35 anos”, avalia Taha.

Fedlberg tem opinião semelhante: “Não acho que vai haver conflito direto – os egípcios sabem que não podem se dar a esse luxo – , mas deve haver rupturas com Israel.”