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Satanismo e fechamento de igrejas: as fake news do 2º turno das eleições

27.out.2022 - Tuítes falsos usam imagens de Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em desinformações com temática religiosa - Arte/UOL Confere sobre Reprodução
27.out.2022 - Tuítes falsos usam imagens de Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em desinformações com temática religiosa Imagem: Arte/UOL Confere sobre Reprodução

Do UOL, em São Paulo

28/10/2022 04h00

Mentiras sobre perseguição a cristãos, falsas ameaças de fechamento de igrejas e associações enganosas ao satanismo: a desinformação com temas religiosos ganhou impulso no segundo turno das eleições presidenciais.

Já no primeiro dia do segundo turno, apoiadores do candidato Jair Bolsonaro (PL) tentaram relacionar o candidato petista, Luiz Inácio Lula da Silva, ao satanismo. No dia seguinte, a narrativa se inverteu: um vídeo antigo de Bolsonaro em uma loja maçônica levou o termo "satanismo" a ser associado ao candidato nas buscas do Google por uma falsa relação entre maçonaria e satanismo.

Desde então, tuítes falsos que citavam prisão de padres, ofensas a bispos, o fim do cristianismo e citações a Xangô passaram a ser produzidos e disseminados com atribuição aos candidatos, incitando uma disputa religiosa nas redes que expôs a intolerância religiosa.

Fake news e CNBB. As notícias falsas preocupam há meses a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos), que publicou duas cartas neste ano sobre o assunto.

Em abril, na "Mensagem ao povo brasileiro", os bispos disseram que havia duas ameaças ao regime democrático brasileiro: a manipulação religiosa e a disseminação de notícias falsas. Em setembro, a "Mensagem ao povo brasileiro sobre o momento atual", a entidade afirma que as desinformações "têm o poder de desestruturar a harmonia entre pessoas, povos e culturas, colocando em risco a democracia".

Segundo o vice-presidente da CNBB, o arcebispo de Porto Alegre, Dom Jaime Spengler, a própria Conferência tem sido alvo de fake news. "Há uma certa acusação de que por vezes a CNBB não tenha se manifestado suficientemente sobre a questão do aborto. Tal observação, às vezes, é fruto do não conhecimento daquilo que ordinariamente a Conferência tem proposto para as comunidades ao longo dos últimos anos".

Há, no entanto, padres que disseminam desinformação sobre o próprio regramento da igreja católica dentro do contexto de eleição. "É verdade sim que há esse tipo de manifestação. O que leva um padre, um presbítero, a se manifestar nesses termos, no mínimo, causa uma certa estranheza", afirma o arcebispo, enfatizando que a Igreja Católica exige uma formação especializada de pelo menos oito anos de seus padres.

Antes da eleição, a CNBB lançou em parceria com a PUC Minas um curso chamado "Fake news, religião e política" para treinar integrantes de pastorais nas técnicas de checagem de fatos.

Fake news evangélicas. Mensagens falsas que apelam para o medo acabam tendo maior adesão no segmento evangélico, afirma o pesquisador do ISER (Instituto de Estudos da Religião) e pastor da Igreja Batista, Clemir Fernandes.

"Pesquisas já mostraram que certos sites evangélicos são os principais divulgadores daquilo que se convencionou chamar de fake news. E as pessoas repassam isso acriticamente. Isso tem gerado muitas vezes medo, porque a linguagem da religião é uma linguagem de esperança, mas também de medo. Coisas associadas ao fim do mundo, ao fim dos tempos, à perseguição, isso tem muito apelo e as pessoas repassam", avalia o pesquisador.

As igrejas evangélicas se dividem em diversas denominações, cada qual com sua especificidade e com sua própria formação. Para Clemir Fernandes, como o crescimento do segmento no Brasil se deu em um contexto de baixa formação da própria sociedade, isso pode ter levado a interpretações nem sempre completas das escrituras.

O protestantismo se construiu historicamente desde o século XVI como uma religião da pesquisa, do estudo, nunca da aceitação só porque alguém diz. Isso é muito forte na tradição protestante. Mas o crescimento no Brasil em um contexto de baixa escolaridade tristemente faz com que as pessoas assimilem certos versículos bíblicos, mas não uma mensagem mais completa e complexa da Bíblia e da teologia para fazer uma análise mais real e profunda daquilo que o pastor ou outra pessoa diz."
Clemir Fernandes, pesquisador do ISER (Instituto de Estudos da Religião) e pastor da Igreja Batista

Um dos conteúdos verificados pelo UOL Confere no segundo turno, embora não fosse com tema religioso, foi compartilhado por um pastor. Sandro Rocha, da Igreja Porto de Cristo, divulgou em vídeo no YouTube um tuíte falso de Fernando Haddad (PT) desmentido nas eleições de 2018.

No mesmo vídeo, o pastor também compartilhou outra fake news: a de que Lula (PT) teria publicado sobre a entrega de armas pela população em 2023. O pastor Sandro Rocha já foi alvo de checagem do Projeto Comprova em, pelo menos, outras duas ocasiões (aqui e aqui).

Contra a desinformação promovida por sites evangélicos, surgiu em 2019 o Coletivo Bereia, especializado em checagem de fatos de temas religiosos e formado por profissionais de comunicação voluntários.

Perseguição a cristãos no Brasil? Tanto o vice-presidente da CNBB quanto o pastor da Igreja Batista concordam que a ideia de perseguição a cristãos no Brasil, país onde a maioria da população se declara cristã, é infundada. O assunto foi tema recorrente de desinformação na eleição presidencial com mentiras que citavam ameaças de fechamento de igrejas, por exemplo.

"Esse tipo de posição sem dados objetivos, sem informações sérias, sem critérios, não é de pessoas que amam a pátria. Não é próprio de pessoas que desejam um Brasil melhor. Não é digno de um seguidor ou seguidora de Jesus, de fato autêntico, se deixar levar por comentários. Aliás, opiniões são perigosas", afirma dom Jaime Spengler.

Clemir Fernandes avalia que não há dados históricos que possam corroborar a tese, quase sempre atribuída ao candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, de que ele ameaçaria a existência de igrejas evangélicas: "O governo Lula foi o governo em que se percebe um crescimento numérico tanto das igrejas evangélicas quanto do contingente de fiéis evangélicos no Brasil. Não há como dizer que houve um cerceamento".

Confira as checagens:

  1. É falso que passeata pró-Lula na Bahia zombou de evangélicos

  2. Estudantes protestaram em universidade, não em igreja luterana em Joinville (SC)

  3. É falso que Padre Marcelo Rossi manifestou apoio à candidatura de Lula

  4. Lula não fez tuíte sobre apoio de Xangô em campanha e fim do cristianismo

  5. É montagem: Lula não disse que 'nem Deus tira essa eleição dele'. Esse conteúdo também foi verificado pelo Projeto Comprova.

  6. Lula não declarou no Twitter que vai prender padres e fechar igrejas. Esse conteúdo também foi verificado pelo Projeto Comprova.

  7. Comprova Explica: Lula não tem relação com luciferianismo nem com satanismo

  8. É falso tuíte em que Bolsonaro supostamente ataca padres e bispos. Esse conteúdo também foi verificado pelo Projeto Comprova.

  9. Bolsonaro não fez post dizendo que acabará com feriado de 12 de outubro. Esse conteúdo também foi verificado pelo Projeto Comprova.

  10. Foto de Bolsonaro na maçonaria é antiga; montagem insere símbolo pagão

  11. Posts enganam ao associar Bolsonaro e a Maçonaria ao satanismo

  12. É falso que católicos que votam em partido comunista são excomungados

  13. É falso que MST incendiou carros de religiosos em Eldorado dos Carajás (PA)

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