Na Europa, deputado distorce fatos e diz que Brasil é uma ditadura

Uma comitiva de deputados brasileiros participou de um encontro de uma frente de políticos da extrema direta do Parlamento Europeu. Na ocasião, o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) disse que o Brasil vive uma ditadura e distorceu uma série de fatos sobre ações no país envolvendo bolsonaristas.

O evento não era uma sessão plenária do Parlamento Europeu, como alguns deputados brasileiros fizeram parecer nas redes, mas, sim, um encontro de políticos conservadores, o ECR (European Conservatives and Reformists) (veja aqui).

Em sua fala, Gayer disse que o Brasil vive uma ditadura que ainda não foi reconhecida. "Não podemos deixar o Brasil virar uma ditadura. E, quando eu digo tornar-se, é ser reconhecido com uma, porque já é". A seguir, veja outras frases ditas por ele:

A justiça [brasileira vem] tornando a oposição inelegível, retirando-lhes os direitos políticos.

DISTORCIDO. Não é verdade que a oposição está se tornando inelegível. O ex-presidente Jair Bolsonaro ficou inelegível após ser condenado em dois processos, mas ele não teve seus direitos políticos suspensos (aqui e aqui). Isso significa que, apesar de não poder se candidatar, Bolsonaro pode ser filiado a partido político —atualmente ele está no PL— e pode votar nas eleições. A Constituição Federal estabelece apenas cinco ocasiões que preveem a perda ou suspensão dos direitos políticos. Inelegiblidade não é uma delas (confira aqui).

Este país possui membros do Congresso sendo presos por suas opiniões.

FALSO. Desde 2019, três membros do Congresso Nacional foram presos: Daniel Silveira, Flordelis e Chiquinho Brazão. Flordelis foi presa acusada de mandar matar o marido, o pastor Anderson do Carmo (aqui). Ela foi cassada dois dias antes da prisão (aqui). Daniel Silveira foi preso por incitação à abolição violenta do Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo (aqui). O deputado defendeu o AI-5 (aqui), medida da ditadura militar usada para cassar opositores e que permitiu o fechamento do Congresso (aqui). Já Chiquinho Brazão foi preso suspeito de ser o mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco (aqui).

Nos casos de Daniel Silveira e Chiquinho Brazão, as prisões foram mantidas pela Câmara (aqui e aqui). A casa legislativa deve analisar prisões de parlamentares federais, como determina a Constituição. Ou seja, o Poder Legislativo referendou uma decisão do Judiciário. A Câmara não analisou a prisão da Flordelis porque ela teve o mandado cassado antes de ser presa.

Deputados bolsonaristas se reuniram com parlamentares de extrema-direita do Parlamento Europeu
Deputados bolsonaristas se reuniram com parlamentares de extrema-direita do Parlamento Europeu Imagem: Reprodução/Instagram/Gustavo Gayer

Há perseguição para quem busca transparência na eleição.

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INSUSTENTÁVEL. Em 2021, o TSE criou a Comissão de Transparência das Eleições (CTE), que contava com representantes de vários órgãos públicos (veja aqui). Além disso, o processo eleitoral também conta com várias etapas de auditoria, uma delas é a inspeção do código-fonte da urna. Durante a preparação para a eleição de 2022, o código-fonte ficou disponível para inspeção por um ano antes do pleito (aqui). Partidos políticos também podem inspecionar o código-fonte. Ao final da eleição de 2022, o PL, partido de Gayer, apresentou um relatório ao TSE com uma série de alegações falsas sobre o funcionamento da urna (aqui).

A mídia se tornou completamente controlada pelo judiciário.

INSUSTENTÁVEL. Não há nenhum registro de que veículos da imprensa tradicional estejam cumprindo ordens do Judiciário.

Quem é Gustavo Gayer

O deputado é Youtuber e professor de inglês. Foi eleito para a Câmara pela primeira vez em 2022 e foi o segundo deputado federal mais votado em Goiás com 200 mil votos (aqui).

Denunciado por racismo. Em novembro, a Procuradoria-Geral da República denunciou o deputado por crimes de injúria e racismo. Em fala no programa '3 Irmãos Podcast', Gayer associou africanos a baixo QI e os comparou a macacos. Ele disse ainda que a democracia não prospera na África por falta de "capacidade cognitiva" (aqui e aqui).

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Após os ataques 8 de janeiro, defendeu sem provas a tese de que havia "infiltrados de esquerda" (aqui e aqui). Gayer também pagou com verba da cota parlamentar da Câmara a empresa de um amigo e político que participou dos atos golpistas em Brasília, após o 8 de janeiro (aqui).

Durante a eleição, chegou a ter suas redes suspensas a pedido do TSE por publicar conteúdo falso sobre as urnas eletrônicas (veja aqui). Também é responsável por disseminar a desinformação de que o Ipec (Instituto de Pesquisa e Consultoria Estratégica), que realiza pesquisas eleitorais, funcionaria dentro do Instituto Lula (leia a checagem aqui). O conteúdo foi removido das redes por determinação do TSE.

Foi citado no relatório da CPI da Pandemia como um dos influenciadores digitais que usou o Youtube para disseminar desinformações sobre "tratamento precoce" e conteúdo antivacina (veja aqui). Um relatório produzido pelo Google e entregue à CPI indicou que o influenciador foi o segundo que mais lucrou com conteúdo falso sobre a pandemia na plataforma: R$ 40 mil.

O que é o ECR

O European Conservatives and Reformists é uma frente de parlamentares de extrema direita do Parlamento Europeu. O grupo é formado por 68 parlamentares do total de 705 que compõem o Parlamento (aqui).

Parlamentar do ECR foi multado por saudação nazista. Em 2022, Angel Dzhambazki, do partido nacionalista da Bulgária, foi multado pelo Parlamento por ter feito um gesto que foi entendido como uma saudação nazista (aqui).

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*Colaboração de Jamil Chade, colunista do UOL, em Gebebra.

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