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À CPI Elcio nega influência de gabinete paralelo e elogia vacinação no país

Hanrrikson de Andrade, Lucas Valença e Thaís Augusto*

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

09/06/2021 04h00Atualizada em 10/06/2021 14h10

Em depoimento hoje na CPI da Covid, o coronel Antônio Elcio Franco Filho, ex-número dois do Ministério da Saúde, afirmou desconhecer a atuação do chamado "gabinete paralelo" de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro na pandemia, disse que a aquisição de cloroquina pelo governo federal foi para programa antimalária e elogiou o plano de vacinação no país.

"Que eu tenha conhecimento, esse grupo não teve nenhuma ação sobre a gestão do ministério", disse Elcio Franco, que atuou diretamente com o ex-ministro Eduardo Pazuello nos dez meses de sua gestão. "Nunca participei nem tomei conhecimento do que era tratado nesse grupo", afirmou, em resposta a questionamento do relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL).

A existência de um "gabinete paralelo" é um dos principais focos de apuração da comissão parlamentar de inquérito. Para a cúpula da CPI, o grupo orientou Bolsonaro na contramão da ciência, priorizando a distribuição de medicamentos como a cloroquina e o do chamado "tratamento precoce", ineficazes contra a covid, em detrimento da compra de vacinas.

Sobre a compra de cloroquina pela União, Elcio Franco disse aos senadores que o remédio comprado foi utilizado para o combate à malária. No entanto, em maio, um documento entregue pelo Ministério da Defesa à CPI informou que parte da cloroquina produzida pelo Exército foi usada no tratamento da doença viral.

"Não ocorreu a aquisição de cloroquina em 2020 para o combate à covid-19, porém, identificamos que, para atender ao programa antimalária do primeiro semestre deste ano, em 30 de abril de 2020 foi assinado um termo aditivo com a Fiocruz no valor de R$ 50 mil visando a aquisição desse fármaco para uso posterior", afirmou.

Compra de vacinas

Um outro ponto abordado pelos senadores em relação ao trabalho do ex-secretário no Ministério da Saúde dizia respeito ao processo burocrático para a aquisição de vacinas e insumos.

Em uma linha similar a outros depoentes ligados ao governo Bolsonaro, Franco buscou enaltecer o total de vacinas distribuídas pela União e o total de doses aplicadas, mas não falou dos atrasos na obtenção de vacinas e das reduções nas projeções de entregas de imunizantes, nem que o Brasil não é, proporcionalmente, um dos países que mais vacinam no mundo.

O coronel foi indagado sobre a demora nas negociações com a farmacêutica Pfizer e o atraso do governo federal para aderir ao consórcio de vacinas contra a covid-19 Covax Facility. Ele também foi questionado sobre o recuo, por parte do governo federal, na aquisição da Coronavac, imunizante produzido pelo Instituto Butantan. Elcio Franco, porém, considerou "acertada" a estratégia para a compra de vacinas.

Com relação à vacina da Pfizer, o ex-secretário disse que "nem ela confiava no que estava vendendo para gente". A fala foi feita em resposta a uma pergunta do líder do governo na Casa, Fernando Bezerra.

"Diferentemente de outros laboratórios com os quais tratávamos, nos pareceu que ela queria se isentar da responsabilidade civil sobre efeitos colaterais graves. Nem ela confiava no que estava vendendo para a gente. Essa foi uma primeira impressão", disse.

Após a afirmação de Elcio, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues, leu todas as propostas via e-mail da Pfizer ao governo federal. Segundo o parlamentar, ao total foram 81 correspondências trocadas. "90% delas sem respostas", enfatizou.

Em depoimento à CPI, no mês passado, Pazuello afirmou que o contrato com o consórcio internacional da Covax Facility trazia "riscos" ao país, pois não estabelecia prazos de entrega. Além disso, houve divergência em relação ao preço que o Brasil considerava ser justo para importação dos imunizantes.

As declarações do ex-ministro foram duramente criticadas por parlamentares da oposição, que argumentaram que a questão financeira era irrelevante naquele momento frente à possibilidade de salvar vidas.

Imunidade coletiva

A convocação de Elcio Franco foi requerida pelos dois lados da comissão, oposição e defensores do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ao total, a CPI aprovou hoje cinco convocações — entre elas a do ex-ministro da Cidadania e deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que distorce dados da covid-19 e defende a chamada imunidade de rebanho (coletiva).

Questionado hoje por Renan se tinha "familiaridade" com a tese da imunização de rebanho, Elcio disse que o assunto "nunca foi tratado" em sua presença ou com os técnicos do Ministério da Saúde.

No depoimento desta quarta, enquanto senadores da oposição e da ala independente, porém crítica ao governo, priorizaram o tema das vacinas, da cloroquina e da existência do "gabinete paralelo", aliados de Bolsonaro citaram a suspeita de desvios de recursos em estados e municípios — amanhã a previsão e que a CPI ouça o governador Wilson Lima do Amazonas, estado que enfrentou colapso no sistema da saúde no início deste ano.

Ações do governo federal

Elcio Franco repisou na CPI o argumento da base bolsonarista de que a atuação do governo federal ficou "limitada" após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Embora a corte tenha reafirmado que estados e municípios possuem autonomia para adotar medidas de isolamento social, em abril do ano passado, a decisão judicial vem sendo utilizada como justificativa por Bolsonaro e aliados para sustentar a alegação falsa de que o governo federal estaria impedido de participar do combate à pandemia.

Cloroquina

O depoimento do militar estava originalmente marcado para 27 de maio, mas o adiamento foi autorizado depois que o coronel alegou estar em recuperação da infecção pelo novo coronavírus hoje ele defendeu o tratamento precoce, disse aos senadores que foi internado e que tomou hidroxicloroquina e ivermectina, ineficazes contra a covid.

A exoneração do militar ocorreu em março deste ano, mesmo mês que Pazuello deixou o comando da pasta. Atualmente, Elcio é assessor na Casa Civil da Presidência da República. Interlocutores do Planalto afirmam que coronel foi um dos principais responsáveis na defesa e preparação do Pazuello para a CPI.

O coronel tem a confiança do núcleo militar e foi levado ao Planalto justamente para construir a estratégia de defesa do governo na CPI.

Quebra de sigilos

A pedido do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), a votação da quebra de sigilos de governistas, como a do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que estava prevista para ocorrer hoje, foi adiada para amanhã.

O senador Randolfe Rodrigues informou haver entre os membros da CPI eventuais divergências relacionadas a quais e quantos sigilos devem ser quebrados. Ontem também já havia essa expectativa de votação, que acabou não se concretizando.

O senador Humberto Costa (PT-PE) também pediu hoje a convocação e a quebra do sigilo de Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, auditor do TCU (Tribunal de Contas da União) apontado como o responsável por elaborar relatório, citado por Bolsonaro e desmentido pelo tribunal, que aponta uma supernotificação de mortes pela covid-19.

Questionado sobre uma possível quebra de sigilo do vereador do Rio e filho do presidente Bolsonaro, Carlos Bolsonaro (Republicanos), Randolfe declarou não haver ainda todos os elementos para acreditar ser preciso a quebra de sigilo do parlamentar municipal e buscou ressaltar que os senadores estão sendo "criteriosos".

Confusão na CPI

Ainda no início do depoimento de Elcio Franco, os senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Marcos Rogério (DEM-RO) discutiram ao divergirem sobre a convocação de Franciele Fantinato, coordenadora do PNI (Programa Nacional de Imunização), que deverá explicar a vacinação em gestantes.

Na discussão, Alencar afirmou que o rondonense e o senador Luís Carlos Heinze (PP-RS) são contra a investigação da "morte de parturientes". A declaração foi rebatida de imediato por Marcos Rogério que chamou o colega de "covarde".

Neste momento, Otto Alencar se levantou e apontou o dedo ao parlamentar. Fora dos microfones, disse que quem é covarde é "quem está no governo" e que "quem tem coragem está contra a atual gestão".

Próximos depoimentos previstos:

  • 10 de junho: governador Wilson Lima (AM)
  • 11 de junho: Natalia Pasternak, microbiologista e pesquisadora da Universidade de São Paulo, e Cláudio Maierovitch, médico sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz e ex-presidente da Anvisa
  • 29 de junho: governador Helder Barbalho (PA)
  • 30 de junho: governador Wellington Dias (PI)
  • 1º de julho: governador Ibaneis Rocha (DF)
  • 2 de julho: governador Mauro Carlesse (TO)
  • 6 de julho: governador Carlos Moisés (SC)
  • 7 de julho: governador Antonio de Almeida (RR)
  • 8 de julho: governador https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/06/09/anvisa-autoriza-testes-clinicos-em-humanos-da-vacina-butanvac.htmWaldez Góes (AP)

*Com Luciana Amaral, do UOL, em Brasília, e Ana Carla Bermúdez, colaboração para o UOL.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.