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Organização liderada por Cachoeira tinha proteção da polícia, diz testemunha

Lourdes Souza e Rafhael Borges

Do UOL, em Goiânia

24/07/2012 16h28Atualizada em 24/07/2012 19h52

Luiz Carlos Pimentel, agente de Polícia Federal que trabalha no setor de Inteligência no Distrito Federal e que depôs como testemunha em audiência da Justiça Federal de Goiás sobre a operação Monte Carlo, da PF, afirmou nesta terça-feira (24) que a quadrilha chefiada pelo contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, agia sob proteção das polícias de Goiás.

A operação Monte Carlo prendeu Cachoeira no final de fevereiro deste ano, expondo a existência de um esquema ligado a jogos ilegais e que teria influência sobre governos, agentes públicos e privados --principalmente em Goiás.

“Não observamos nenhum outro grupo que tenha tentado abrir jogos nesta região [do entorno do Distrito Federal, em Goiás]. Muitos policiais militares faziam trabalho passando pela região”, disse o agente, sugerindo que policiais acobertavam a ilegalidade. 

Pimentel afirmou também que o delegado de Polícia Federal Fernando Bayron, lotado em Goiânia, recebia valores de Carlinhos Cachoeira. “Depois de encontros com Cachoeira ou com seu irmão, o senhor Bayron efetuava o pagamento das prestações de seu apartamento.” As conclusões do agente decorrem de gravações telefônicas e vídeos que mostram a entrega de pacotes, supostamente de dinheiro, aos envolvidos.

"A gente rodava pela região e se assustava com a movimentação das casas de bingo”, completou Pimentel. Segundo ele, o grande número de carros de luxo em uma região muito pobre foi o que despertou a atenção da Polícia Federal. "Eram muitos locais, próximos uns dos outros, e começou a ficar descarada a ação criminosa e o grande número de máquinas caça-níqueis." 

A influência do grupo na polícia também foi confirmada pelo primeiro depoente, o agente da PF, Fábio Alvarez. De acordo com o depoimento do policial, Cachoeira pedia informações às polícias Civil, Militar e Federal atuantes no Estado. Ainda segundo Alvarez, a organização criminosa tinha proteção de policiais militares que atuavam dentro e fora das casas de jogos ilegais em Goiás e no entorno do Distrito Federal. O agente da PF informou que um policial conhecido por major Silva era responsável pela proteção do grupo.

A defesa tentou desqualificar o testemunho de Pimentel, alegando que ela teria interesse na acusação. Pimentel respondeu que "por ser o servidor mais antigo do setor, tinha a função de análise e coordenação dos trabalhos do grupo". A defesa contradisse a testemunha por acreditar que ela seja muito próxima da acusação. Pimentel afirmou que não tem interesse na operação. “Sou policial federal e só tenho compromisso com a verdade.”

Como chefe-substituto do serviço de inteligência da Polícia Federal, o depoente coordenava os trabalhos e fazia análise de alguns dos alvos da operação. Pimentel disse que o grupo criminoso controlava a atividade de jogos ilegais, principalmente nas cidades de Águas Lindas e Valparaíso de Goiás.

Início das investigações

Segundo Pimentel, as investigações começaram por requerimento do Ministério Público de Valparaíso (GO), depois de observarem a expansão nas atividades de casas de jogos ilegais na cidade e na região.

Assim como a primeira testemunha desta terça-feira, Fábio Alvarez, Pimentel afirmou que no início das investigações os alvos das interceptações eram três pessoas: Raimundo Washington, Major Silva e José Olímpio.

No decorrer de todas as diligências, os policiais federais perceberam que uma pessoa chamada de “baixinho” sempre era mencionada nas conversas. Esse apelido seria de Lenine Araújo.

Com a interceptação do rádio de Lenine, conseguiram observar que o aparelho era registrado em outro país. “As pessoas começam as conversas se identificando, por isso foi fácil perceber quem era quem nas ligações.”

Segundo o agente da Polícia Federal, Lenine intermediava as ações de Cachoeira na região do entorno do Distrito Federal. “Lenine sempre se reportava a Cachoeira sobre as ações, contratações e pagamentos, inclusive na influência que o grupo tinha na segurança pública goiana”, disse Pimentel.

Geovani Pereira, que é apontado com o contador do grupo, prestava contas diretamente a Carlinhos Cachoeira, afirmou o depoente. “Ele só fazia aquilo que Carlinhos Cachoeira pedia e, posteriormente, a ele prestava conta de tudo."

O caso

Carlinhos Cachoeira é acusado de chefiar uma quadrilha que comandava jogos ilegais, principalmente em Goiás, e de usar de influência com parlamentares, como o ex-senador Demóstenes Torres, para manipular licitações e facilitar a entrada de empresas supostamente ligadas a ele e outros aliados nos governos do Distrito Federal, Rio de Janeiro e Goiás.

Pelas suspeitas de envolvimento com Cachoeira, Demóstenes teve o mandato cassado no último dia 11. Os governadores Agnelo Queiroz (PT-DF), Sérgio Cabral (PMDB-RJ) e Marconi Perillo (PSDB-GO) foram citados em escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal durante as operações Vegas e Monte Carlo.

Os envolvidos assumem ter falado com Cachoeira em algumas situações e motivos diversos, mas negam envolvimento nas ações do bicheiro.

Cachoeira participa da audiência que acontece hoje em Goiânia e deve depor nesta quarta-feira (25), quando pode falar publicamente, pela pela primeira vez, sobre as acusações.