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Júri reconhece duplo homicídio, mas absolve PMs do caso PC Farias e Suzana

Aliny Gama e Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

10/05/2013 21h21Atualizada em 23/06/2021 14h56

Depois de cinco dias de júri popular, os quatro ex-seguranças acusados da morte do empresário Paulo César Cavalcante Farias, o PC Farias, e sua namorada, Suzana Marcolino da Silva, foram absolvidos pelos jurados. A decisão foi lida pelo juiz Maurício Brêda, da 8ª Vara Criminal de Maceió, na noite desta sexta-feira (10). Os jurados, no entanto, reconheceram a tese de duplo homicídio que foi apresentada pela acusação, sem identificar os autores do crime.

Os ex-seguranças Adeildo Costa dos Santos, Josemar Faustino dos Santos, José Geraldo da Silva e Reinaldo Correia de Lima Filho eram acusados de duplo homicídio triplamente qualificado —por motivo torpe, sem possibilidade de defesa da vítima e impunidade. A defesa alegou que Suzana matou PC Farias e se matou em seguida. Os quatro são policiais militares e nunca foram detidos.

As mortes de PC Farias e Suzana Marcolino ocorreram na madrugada de 23 de junho de 1996, na casa de veraneio do ex-tesoureiro de Fernando Collor de Mello, em Guaxuma, litoral norte de Maceió.

Segundo a denúncia do MPE (Ministério Público Estadual), eles foram omissos e não evitaram o assassinato do casal. A denúncia do MPE, porém, não apontava mandante ou autor material do crime.

Em seus depoimentos à Justiça, os réus falaram pouco e jogaram a responsabilidade do crime para Suzana Marcolino, alegando que não houve uma terceira pessoa dentro da casa. O policial Geraldo chegou a afirmar que, naquela madrugada, ouviu uma briga entre PC e Suzana.

Nenhum dos dois ex-seguranças que estavam na casa na madrugada do crime (Adeildo e Geraldo) afirmou ter ouvido disparos —os outros dois militares acusados entraram no serviço para render os dois colegas por volta das 8h30 do dia da morte. Os demais funcionários na casa também alegam não ter escutado tiros.

"É aquela coisa, ninguém podia imaginar que ia acontecer uma coisa daquelas", disse Adeildo, citando que as últimas palavras de PC foram para perguntas se estava "tudo bem" na casa.

O promotor Marcos Mousinho disse que ficou satisfeito com o resultado do júri.

"A tese do Ministério Público, de duplo homicídio, foi aceita. Os réus foram absolvidos por clemência dos jurados", afirmou o promotor. Ele disse que vai analisar a sentença para ver se recorrerá da decisão do júri.

Segundo o advogado de defesa dos réus, José Fragoso Cavalcanti, apesar de a tese de homicídio seguido de suicídio ter sido descartada pelos réus, a sensação é de "dever cumprido".

"Isso para nós, agora, é indiferente. Eu sei o que aconteceu naquela casa, que foi um homicídio e suicídio. O que vale é que os inocentes foram anistiados", afirmou.

Duplo homicídio

O julgamento foi marcado por um confronto de teses. Durante sua acusação aos jurados, o promotor alegou que os seguranças sabiam que PC Farias e Suzana estavam sendo mortos, "mas não fizeram nada pra impedir." "A lei prevê a ação ou omissão que resultam em uma causa. E eles deram causa, dolosa e relevante para produção do fato [crime]", disse.

Para o promotor, a policia alagoana "trabalhou para provar um suicídio" desde o início e não investigou uma segunda linha, com a possibilidade de o casal ter sido assassinado. Por conta disso, ele alegou que o mandante do crime "nunca será conhecido."

A tese de duplo homicídio ganhou força após a reabertura das investigações, em maio de 1997, quando o então juiz do caso, Alberto Jorge Correia, solicitou uma segunda perícia, a pedido do MPE, que descartou a possibilidade de Suzana ter se matado.

O médico-legista e professor da USP (Universidade de São Paulo) Daniel Munhoz, responsável pelo novo laudo, disse no julgamento que, ao ser morta, Suzana estava em posição de defesa, e não haveria chance de suicídio. Além disso, havia maior quantidade de vestígios na palma da mão, ou seja, "típico de quem estava tentando se proteger."

O perito da segunda investigação, Domingo Tochetto, afirmou que o exame residuográfico não apontou para a existência de partículas metálicas oriundas de tiro mas mãos da vítima. A conclusão da perícia foi de que Suzana não teria atirado naquela madrugada. "Um tiro deixa partículas de chumbo, bário e antimônio. Mesmo lavando a pele, essas partículas metálicas permanecem por longo tempo, e não havia nenhuma nas mãos de Suzana", garantiu.

Outro ponto alegado pela acusação foi a destruição de provas do caso. Entre elas está a queima do colchão do crime que foi feita pelo caseiro Leonino Tenório Carvalho, três dias após as mortes. Ele disse que recebeu ordens de Flávio Almeida, chefe da segurança de PC Farias, que teria recebido a autorização da polícia. Em entrevista, o promotor chegou a dizer que a arma do crime foi perdida no Fórum de Maceió.

A irmã de Suzana, a jornalista Anna Luizza Marcolino, disse que o celular e as agendas da vítima nunca foram devolvidas pelos seguranças de PC, o que teria dificultado as investigações. Ela também que garantiu que a irmã não teria motivo para se matar.

Crime passional

A tese da defesa, de crime passional seguido de suicídio, se baseou na primeira investigação policial, que concluiu que Suzana teria matado PC por conta da iminente fim do relacionamento. Além disso, laudos apontaram que Suzana era ciumenta e com "alta tendência de suicídio." Segundo a ex-cunhada de PC Farias, Milane Maia, PC e Suzana "contavam rindo" sobre as constantes brigas pelo ciúme dela.

A defesa alegou que o perfil de Suzana, aliado à iminente separação, comprovam a tese de crime passional. "Suzana estava vendo o 'castelo ruir' e matou PC. Ela dizia a todo mundo que queria um namorado rico, e ia perder", alegou o advogado José Fragoso Cavalcanti. A tese também que levou em conta perícia feita por uma equipe que tinha como principal responsável o médico-legista Badan Palhares, da Unicamp.

Segundo Palhares, a conclusão de que houve homicídio seguido de suicídio veio, entre outros pontos, após análises de manchas de sangue que ficaram no corpo de Suzana. Além disso, a posição do tiro e a falta de elementos de que uma terceira pessoa esteve dentro do quarto do casal reforçam a tese.

Uma das testemunhas de defesa foi a filha de PC, Ingrid Pereira de Farias, que anistiou a responsabilidade dos seguranças e confirmou que Suzana "ela era muito ciumenta." "Ele me disse [dois dias antes da morte] que estava querendo acabar o namoro porque não estava feliz", garantiu.

Porém, segundo a tia de Ingrid, os filhos de PC Farias chegaram a questionar a versão e a suposta falta de interesse numa maior investigação da polícia para tentar analisar outras possíveis versões. A versão foi confirmada pela suposta amante de PC e pivô da separação, Cláudia Dantas.

O irmão de PC, Augusto Farias, afirmou que o empresário contratou um detetive para seguir Suzana e descobriu que estava sendo traído. Por conta disso e de uma "nova paixão", iria terminar o relacionamento. Além das provas técnicas, a defesa também apresentou como argumento a compra de um revólver por Suzana, a uma proprietária de churrascaria, nove dias antes do crime.

Segundo testemunhou a prima de Suzana, Zélia Maria Maciel, ela chegou a praticar tiro a alvo com amigos às vésperas das mortes. Suzana também teria dito que estaria grávida e que iria "casar com um homem rico." A defesa dos réus argumentou que Suzana simulou a gravidez.