Senador confirma encontro com Deltan, mas nega articulação para PGR
O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) confirmou ter se encontrado com Deltan Dallagnol, coordenador da Força-Tarefa da Lava Jato, em linha com o que revelam mensagens vazadas do procurador da República no aplicativo Telegram. Girão, todavia, negou que o encontro tenha sido sigiloso e que tenha articulado indicações para a PGR (Procuradoria-Geral da República). Deltan tem dito que não reconhece a autenticidade das mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil por fonte anônima.
Nesta sexta-feira (16), o UOL, em parceria com o The Intercept Brasil, publicou reportagem que mostra que Deltan promoveu articulações políticas a fim de emplacar o procurador Vladimir Aras, seu aliado no Ministério Público Federal, como novo procurador-geral. Para atingir seu objetivo, Deltan fez lobby com ministros do governo Jair Bolsonaro (PSL), do Supremo Tribunal Federal (STF) e senadores, incluindo Girão.
Nas mensagens, Deltan disse a Aras que não queria alardeamentos em relação à reunião. O senador Girão diz, por sua vez, que o encontro não foi sigiloso.
"Tanto não é verdade que [o encontro] ocorreu em um lugar público. Uma reunião absolutamente republicana. Também é inverossímil a insinuação de que eu articulo ou articulei indicações à PGR", disse Girão em nota enviada à reportagem. "Atuo de forma independente e abomino velhas práticas políticas. Tenho mantido uma clara postura crítica em relação ao Executivo, Judiciário e ao próprio Parlamento", completou Girão.
As mensagens mostram que a articulação para Aras assumir a PGR começou no período eleitoral e, após o primeiro turno do pleito presidencial, ele e Deltan passaram a planejar abordagens ao entorno do então candidato Bolsonaro. No dia 11 de outubro, quatro dias após o primeiro turno, Aras escreveu para Deltan: "Fala com Moro sobre minha candidatura a PGR. Com bolsonaro eleito, vou me candidatar" (a reportagem manteve as grafias originais das mensagens).
Então juiz, Moro já se configurava como alguém próximo ao grupo que envolve Bolsonaro. "Pedir o apoio dele qdo for ministro do STF ? rs. Ver o que ele acha? claro", responde Deltan para Aras.
Posteriormente, Deltan diz, em mais de uma oportunidade, que havia tratado da candidatura de Aras com o já ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. No dia 14 de abril, escreve Deltan para o Aras: "Peço reserva, mas Moro confirmou pra mim que Vc é o candidato que ele vai defender."
Deltan foi a Brasília em 28 de fevereiro. Convidado por Aras para um almoço, fez com que o aliado deixasse o restaurante às pressas. "Já almoçou?", pergunta Deltan para Aras às 12h55. "Estamos no Contê! [restaurante na capital]", responde Aras minutos depois, logo questionado por Deltan: "tá acabando? queria te apresentar alguém no almoço", questiona, referindo-se ao senador Eduardo Girão.
Deltan pede então discrição sobre o encontro. "não, é o eduardo girão, mas mantenha com Vc por favor. ele é o líder do gov no senado. Improtante manter isso discreto Vlad. Por várias razões", escreve Deltan. Após o encontro, o chefe da Lava Jato em Curitiba deu sinais de que manteve contato com Eduardo Girão com o intuito de traçar uma estratégia para angariar novos apoios no Senado.
"Dialogo com todos aqueles que me procuram, sobretudo, com os que comungam dos mesmos ideais, como, por exemplo, o combate irrestrito à corrupção. Essa foi, inclusive, umas das minhas principais bandeiras de campanha e que vem norteando o meu mandato. Por isso, me causa indignação a falsa narrativa de que o encontro com o Procurador da República Deltan Dallagnol teria sido sigiloso", afirmou Girão na nota.
Parlamentares e ministros
Nos diálogos sobre a articulação de Deltan junto a políticos e membros do Judiciário para alçar Vladimir Aras para a PGR, ao menos três ministros do STF foram citados, todos considerados como os principais defensores da Lava Jato na corte: Edson Fachin, relator dos processos ligados à operação, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux.
Deltan também indicou ter feito costuras junto ao Congresso e ao governo em favor de Aras. As articulações envolveriam inclusive políticos investigados na Operação Lava Jato.
Em 4 de março, Deltan enviou para Aras uma lista de senadores em postos de liderança que deveriam ser procurados em busca de apoio. "Olha o plano de conversas que o Eduardo propôs", avisou às 16h37.
Foram listados 20 parlamentares, vários citados em delações da Lava Jato. É o caso de Eduardo Braga (MDB-AM); Humberto Costa (PT-PE); Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE); e Alvaro Dias (Podemos-PR). Também figurava na lista de senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) —como o UOL mostrou, ele participou de uma articulação de Deltan para usar a Rede Sustentabilidade como uma espécie de laranja para uma ação de interesse da Lava Jato no STF.
Procurada pela reportagem, a força-tarefa da Lava Jato disse, por meio da assessoria de imprensa do MPF do Paraná, que é permitido aos procuradores "incentivar colegas a se candidatarem", "fazer contatos" e "encampar iniciativas para a escolha dos melhores candidatos". Destacou, porém, que tem "reiteradamente defendido" a lista tríplice "sem manifestar apoio a determinado candidato".
"A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba não reconhece as mensagens que lhe têm sido atribuídas. O material é oriundo de crime cibernético e sujeito a distorções, manipulações e descontextualizações. É legal, legítimo e recomendável que procuradores busquem o aperfeiçoamento institucional. Isso engloba a participação no processo de escolha do novo procurador-geral. Procuradores podem incentivar colegas a se candidatarem, assim como fazer contatos e encampar iniciativas para a escolha dos melhores candidatos pelos colegas e pelo presidente. Diversas vezes, iniciativas cogitadas não se realizaram após reflexão e ponderações internas. Os integrantes da força-tarefa da Lava Jato têm reiteradamente defendido que a escolha do novo procurador-geral seja feita a partir da lista tríplice, sem manifestar apoio a determinado candidato."
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