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Prefeitura do Rio destrói quiosques em favela com ação militar e revolta ambulantes: "criei a família aqui"

Marina Lang

Colaboração para o UOL, do Rio

09/03/2018 20h01

Junto à Guarda Municipal e por meio da Secretaria Municipal de Ordem Pública, a Prefeitura do Rio de Janeiro fez nesta sexta-feira (9) uma ação de reordenamento na praça Miami, no centro da Vila Kennedy, comunidade da zona oeste do Rio de Janeiro, que hoje passou pela sexta ação das Forças Armadas. Quiosques foram destruídos por uma retroescavadeira, o que revoltou ambulantes.

“Que covardia”, dizia um homem, enquanto assistia quiosques de pequenos comerciantes ser amassados pelas máquinas. Sentado numa cadeira de plástico observando os escombros, outro homem lamentava. “Criei minha família aqui”, afirmou, apontando para uma pequena barraca de metal sendo destruída. "Tô com 53 anos de idade, pago R$ 650 de aluguel, mais R$ 100 de luz."

Em nota, o prefeito Marcelo Crivella (PRB) admitiu o "uso desproporcional da força" contra trabalhadores e mandou afastar os envolvidos.

09.mar.2018 - Casal chora após destruição de quiosques na Vila Kennedy - Marcio Alves/Agência O Globo - Marcio Alves/Agência O Globo
09.mar.2018 - Casal chora após destruição de quiosques na Vila Kennedy
Imagem: Marcio Alves/Agência O Globo

A Secretaria Municipal da Fazenda informou que 52 construções irregulares foram identificadas no local. Alguns comerciantes relatam, contudo, que estavam com documentação em dia. A prefeitura diz que estuda realocação. "Será feito um sorteio para garantir a licença dos ambulantes interessados, que passarão a trabalhar em módulos padronizados, que garantem a organização do espaço público e o direito de todos os cidadãos que o frequentam", afirmou a prefeitura, por meio de nota.

Após a revolta dos ambulantes, a prefeitura disse ter realizado a ação na Vila Kennedy a pedido da Polícia Militar. Por meio de nota, a administração municipal afirmou que, na área, havia denúncias de atividades criminosas, como venda de drogas e de carga roubada.

"O prefeito Marcelo Crivella constatou, contudo, que na operação houve uso desproporcional da força, atingindo também desnecessariamente trabalhadores. O prefeito repudia esse tipo de comportamento. Ele determinou o afastamento imediato dos funcionários envolvidos e o cadastramento dos comerciantes para imediata realocação."

09.mar.2018 - Restroescavadeira destrói quiosques de ambulantes na Vila Kennedy - Márcio Alves/Agência O Globo - Márcio Alves/Agência O Globo
09.mar.2018 - Restroescavadeira destrói quiosques de ambulantes na Vila Kennedy
Imagem: Márcio Alves/Agência O Globo

O CML (Comando Militar do Leste) disse que a prefeitura agiu por iniciativa própria, aproveitando a estabilidade da região com a presença dos 1.400 militares que patrulham a comunidade. O Exército afirma não ter participação na ação da prefeitura.

“A ação foi por iniciativa da própria prefeitura, empregando a Guarda Municipal, em coordenação com comando de policiamento militar da região. Eles aproveitam a estabilidade da área, fornecida pelas tropas das Forças Armadas, para ações de organização do espaço urbano”, disse o chefe de comunicação do CML, coronel Carlos Frederico Cinelli.

“O Comando Conjunto estava ciente da possível ida de equipes da prefeitura, porém, as diversas agências e órgãos possuem seus modos próprios de atuação e seus critérios de funcionamento. As ações são coordenadas, respeitando-se a natureza de cada um dos atores”, prosseguiu.

Cinelli afirmou ainda que “eventuais reclamações ou denúncias de excessos cometidos, neste caso específico, devem ser encaminhados à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro”.

A equipe de intervenção federal diz que a Vila Kennedy é um modelo para as operações a serem realizadas no Rio. O objetivo é, além de reforçar a segurança, levar serviços para a comunidade.

A derrubada das barracas na Vila Kennedy que revoltou moradores é contrária a estratégias adotadas pela equipe do interventor Walter Braga Netto. As chamadas operações de amplo espectro, usadas pelas Forças Armadas, visam combinar a força com outras expressões de poder de agências governamentais, levando, por exemplo, serviços básicos de saúde ou zeladoria para as favelas. Um dos objetivos é ganhar a confiança dos moradores e estimulá-los a fazer denúncias sobre o paradeiro de criminosos e armas.