1ª conversa de Deltan e Moro vazada completa 4 anos; veja o que aconteceu
A adesão de Sergio Moro ao Telegram completa hoje exatos quatro anos. Foi em 9 de julho de 2015 que, segundo o material obtido pelo site The Intercept Brasil, o ex-juiz federal e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública trocou mensagens via aplicativo pela primeira vez com o procurador do MPF (Ministério Público Federal) Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Os trechos das conversas vazadas e publicadas até então mostram que Moro atuou como uma espécie de supervisor da Lava Jato. Na avaliação de juristas, o comportamento põe em xeque a imparcialidade na condução das ações penais. O ex-magistrado nega ter cometido qualquer irregularidade.
De acordo com os diálogos, desde que foi saudado por Dallagnol com a mensagem "Bem-vindo ao Telegram", Moro deu conselhos aos procuradores da força-tarefa, interferiu no ritmo das investigações, cobrou resultados e, entre outros comentários, fez considerações sobre processos que estavam então sob seu comando na 13ª Vara Federal.
Data "no máximo" para sair operação
13 de outubro de 2015
Em outubro de 2015, conversa entre investigadores da Lava Jato indica que Moro sugeriu a data da operação (batizada de Passe Livre) que resultou na prisão do pecuarista José Carlos Bumlai. O objetivo seria acelerar os trabalhos e evitar que os crimes pudessem prescrever --o que aconteceria no fim daquele ano.
Na ocasião, segundo reportagem feita em parceria entre o Intercept e a revista Veja, Moro não apenas recomendou a data como também já falava em receber a denúncia antes da operação. No trecho vazado, o procurador Paulo Galvão alerta o colega Roberson Pozzobon sobre a orientação do então juiz.
"Estava lembrando aqui que uma operação tem que sair no máximo até por volta de 13/11, em razão do recesso e do pedido do russo [apelido de Moro] para que a denúncia não saia na última semana. Após isso, vai ficar muito apertado para denunciar", completa Galvão.
Bumlai, principal alvo da Passe Livre, foi preso em 24 de novembro e denunciado em 14 de dezembro daquele ano, última semana antes do recesso da Justiça Federal no Paraná. O pleito da acusação foi acolhido por Moro no dia seguinte, isto é, antes do limite para prescrição. O pecuarista foi levado à Justiça por ter atuado, de acordo com a Lava Jato, como "laranja" do PT.
As transcrições foram mantidas com os erros e grafias divulgados pelas reportagens.
"Teriam que ser fatos graves"
16 de outubro de 2015
Ainda em 2015, Dallagnol recorreu a Moro via Telegram em 16 de outubro para checar se o juiz poderia apreciar rapidamente um pedido de prisão contra Alexandrino Alencar, ex-executivo da Odebrecht que acompanhava Lula em viagens ao exterior. "Não creio que conseguiria ver hoje. Mas pensem bem se é uma boa ideia", respondeu Moro ao chefe da força-tarefa.
Nove minutos depois, o juiz advertiu o interlocutor: "Teriam que ser fatos graves".
Preso quatro meses antes, Alencar seria solto naquele mesmo dia por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). A intenção de Dallagnol era mantê-lo na cadeia. Uma nova denúncia seria apresentada juntamente ao pedido de prisão.
'Sem pressa' para incluir prova
23 de outubro de 2015
No fim de outubro de 2015, em conversa com o procurador Athayde Ribeiro Costa, a delegada da Polícia Federal Erika Marena —que hoje integra a equipe de Moro no Executivo federal— afirmou que o magistrado havia pedido para que ela não tivesse "pressa" em anexar a um dos processos da Lava Jato uma planilha que detalhava pagamentos a diversos políticos.
"Acabei esquecendo de eprocar" [protocolar o documento no sistema eletrônico da Justiça], disse. "Vou fazer isso logo."
Segundo reportagem do Intercept e da Veja, a estratégia de Moro era retardar o deslocamento da ação penal de Curitiba para Brasília, já que a investigação poderia envolver políticos com foro privilegiado e cujos nomes constavam na planilha --entre eles o do então senador Edison Lobão (MDB-MA). Quando há prerrogativa de foro, o processo deve tramitar em instâncias superiores.
Sugestão de fonte "séria"
7 de dezembro de 2015
Um dos trechos vazados mostra que, fora dos autos, Moro encaminhou à força-tarefa uma pista com o objetivo de auxiliar as investigações sobre o tríplex de Lula no Guarujá (SP) --processo no qual o ex-presidente viria a ser condenado.
"Entao. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou entao repassando. A fonte é seria", escreveu o juiz. "E seriam dezenas de imóveis", completou.
Na ocasião, Dallagnol agradeceu pela dica e disse que tentaria contato. Como não conseguiu localizar a fonte, o procurador aventou a possibilidade de "fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa" —ou seja, ele considerava criar uma denúncia anônima para justificar o depoimento. Moro respondeu: "Melhor formalizar então".
Ordem de operações: "Pensem aí"
21 de fevereiro de 2016
Outro trecho indica que Moro recomendou ao Ministério Público Federal uma inversão na ordem de duas operações que estavam planejadas para o começo de 2016. "Olá Diante dos últimos . desdobramentos talvez fosse o caso de inverter a ordem da duas planejadas", disse ele a Dallagnol.
O chefe da força-tarefa observou que a mudança poderia levar a problemas logísticos, e Moro respondeu: "Pensem aí". No dia seguinte, foi realizada a Operação Acarajé, 23ª fase da Lava Jato.
"Melhor seria o Congresso se autolimpar"
16 de março de 2016
Três dias antes de divulgar a conversa grampeada entre Lula e a então presidente Dilma Rousseff (PT), Moro revelou a Dallagnol em conversa privada o desejo de "limpar o Congresso". Naquele mesmo dia, pessoas foram às ruas em várias cidades pelo país para pedir o impeachment de Dilma.
Os protestos também repudiavam a decisão de nomear Lula ministro da Casa Civil --intento posteriormente vetado pelo Supremo. "Ainda desconfio muito de nossa capacidade institucional de limpar o congresso. O melhor seria o congresso se autolimpar mas isso não está no horizonte. E nao sei se o stf tem força suficiente para processar e condenar tantos e tao poderosos", comentou Moro.
Em 19 de março, na iminência de Lula assumir como ministro, o juiz decidiu retirar o sigilo do grampo telefônico, movimento que levou o STF a impedir a nomeação. Naquele mesmo dia, Moro e Deltan conversaram sobre o assunto. "Qual é a posição do MPF?", questionou o magistrado. "Abrir", respondeu o procurador.
"Muito tempo sem operação"
31 de agosto de 2016
"Não é muito tempo sem operação", perguntou Moro ao chefe da força-tarefa em 31 de agosto de 2016. Segundo reportagem do site The Intercept Brasil, à época, a última fase havia ocorrido quase um mês antes.
Dallagnol assentiu com a observação. Três semanas depois, policiais federais estariam nas ruas para mais uma etapa da Lava Jato.
"Receio" de Dallagnol
9 de setembro de 2016
A apenas quatro dias da apresentação da denúncia contra Lula no caso do tríplex, o coordenador da Lava Jato confidenciou aos colegas da força-tarefa que não estava totalmente convicto em relação às provas. Como exemplo, ele citou que tinha "receio da ligação entre Petrobras e enriquecimento".
"Falarão que estamos acusando com base em notícia de jornal e indícios frágeis? então é um item que é bom que esteja bem amarrado. Fora esse item, até agora tenho receio da ligação entre petrobras e o enriquecimento, e depois que me falaram to com receio da história do apto? São pontos em que temos que ter as respostas ajustadas e na ponta da língua."
"Um bom dia afinal"
14 de dezembro de 2016
Reportagem publicada em parceria pelo Intercept e pela Veja relatou que um dos trechos vazados mostra que Moro reagiu com alegria quando foi informado que a denúncia contra Lula seria protocolada em breve. O magistrado também soube por meio de Dallagnol que, além do ex-presidente, a peça acusatória contra o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) seria apresentada no dia seguinte.
Narra a reportagem que o titular da 13ª Vara Federal respondeu ao procurador com um emoticon de felicidade e a frase "um bom dia afinal".
Delação de Cunha: "Sou contra, como sabe"
5 de julho de 2017
Ao ouvir rumores sobre uma possível delação do ex-deputado federal Eduardo Cunha (MDB-RJ), Moro enviou mensagem a Dallagnol e pediu que o MPF o mantivesse "informado". Além disso, manifestou contrariedade mesmo sem saber o conteúdo de um possível depoimento. "Agradeço se me manter (sic) informado. Sou contra, como sabe", escreveu o juiz.
Na ocasião, a Procuradoria-Geral da República havia sido procurada pela defesa do ex-parlamentar com a proposta de negociar uma delação premiada.
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