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Vazamentos da Lava Jato

Para Deltan, Flávio Bolsonaro está implicado em corrupção, diz Intercept

24.out.2017 - O então juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol durante evento em São Paulo - HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO CONTEÚDO
24.out.2017 - O então juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol durante evento em São Paulo Imagem: HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, em São Paulo

21/07/2019 15h25

Em novos diálogos publicados pelo site "The Intercept Brasil", o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da operação Lava Jato no Ministério Público Federal do Paraná, afirma que "certamente" o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) está implicado no caso Queiroz, em que é investigado por causa de um suposto esquema de corrupção que teria funcionado em seu gabinete quando era deputado estadual no Rio.

Nas mensagens que teriam sido trocadas no aplicativo Telegram, ele também questiona como o presidente Jair Bolsonaro reagiria à implicação de seu filho e como o ministro da Justiça, Sergio Moro, se comportaria diante do caso.

As conversas reveladas agora teriam acontecido entre dezembro de 2018 e janeiro deste ano. No último mês do ano passado, Moro havia deixado a Justiça Federal do Paraná e se preparava para assumir o Ministério da Justiça. Em janeiro, Jair Bolsonaro (PSL) já estava na presidência; e Moro, no comando do ministério.

"Filho certamente implicado"

De acordo com o Intercept, em 8 dezembro, Dallagnol iniciou uma conversa com procuradores em um grupo do Telegram compartilhando uma reportagem do UOL sobre o caso Flávio Bolsonaro. Depois, o próprio procurador teria comentado a situação: "Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho certamente [referência a Flávio Bolsonaro]. O problema é: o pai [referência a Jair Bolsonaro] vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado, o que pode indicar o rolo dos empréstimos?"

Dallagnol também teria comentado o interesse de Moro em obter a indicação para obter uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal) futuramente. "Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo?", escreveu o procurador, segundo o Intercept.

O procurador Roberson Pozzobon, outro integrante da Lava Jato, também aparece nos supostos diálogos comentando o dilema de Moro. "Acho que Moro já devia contar com a possibilidade de que algo do gênero acontecesse. A questão é quanto ele estará disposto a ficar no cargo com isso ou se mais disso vir".

Preocupação com questões de jornalistas

Dallagnol teria comentado, então, a preocupação com a possibilidade de jornalistas lhe fazerem perguntas sobre o caso do senador filho do presidente. "Em entrevistas, certamente vão me perguntar sobre isso. Não vejo como desviar da pergunta, mas posso ir até diferentes graus de profundidade. 1) é algo que precisa ser investigado; 2) tem toda a cara de esquema de devolução de parte dos salários como o da Aline Correa que denunciamos ou, pior até, de fantasmas."

Em seguida, completando a análise sobre o dilema, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato teria colocado em dúvida se o presidente Jair Bolsonaro bancaria a pauta anticorrupção, simbolizada por Moro, sendo que o próprio filho poderia ser alvo de uma política de combate a desvios. "Agora, o quanto ele vai bancar a pauta Moro Anticorrupcao se o filho dele vai sentir a pauta na pele?", teria escrito Dallagnol.

De acordo com o Intercept, em diálogos posteriores, os procuradores teriam decidido não conceder entrevistas em que o caso de Flávio Bolsonaro pudesse ser citado. Dallagnol teria classificado situações deste tipo como "bola dividida" e dito que emitir opinião sobre o caso do senador e "bater mais forte" não seria "conveniente". "Vamos depender dele [provável referência a Jair Bolsonaro] para reformas",

O UOL procurou o Ministério Público Federal do Paraná para saber se os procuradores reconhecem ou não os diálogos publicados pelo site, mas ainda não obteve resposta.

Filho de presidente nega irregularidades

Flávio Bolsonaro passou a ser investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro depois de o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) apontar movimentações consideradas atípicas, no valor de R$ 1,2 milhão, na conta bancária do ex-assessor Fabrício Queiroz. Há inclusive um repasse de R$ 24.000 para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

O filho do presidente foi beneficiado pela decisão recente do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, de suspender investigações que usem dados detalhados de órgão de controle como o Coaf sem autorização judicial.

O UOL procurou a assessoria do parlamentar para comentar a divulgação do Interecept, mas não obteve obteve resposta até a publicação deste texto. Em outras ocasiões, ele afirmou que não praticou nenhum ato ilícito e que os procuradores do Rio cometeram ilegalidades e excessos na investigação.

Diálogos indicam que Moro influenciou investigações

O Intercept vem revelando desde 9 de junho diálogos que teriam sido mantidos por procuradores da Lava Jato e pelo próprio Moro. Em parceria com o site, a "Folha de S.Paulo", o blogueiro do UOL Reinaldo Azevedo e a revista "Veja" também publicaram conversas que teriam origem no Telegram.

Moro chegou a dizer que algumas conversas podem ter existido, mas ele e os procuradores não reconhecem a legitimidade de todas as mensagens, embora também não apontem quais teriam sido adulteradas.

Jornalistas da "Folha de S.Paulo" que tiveram acesso ao material encontraram mensagens que repórteres do jornal enviaram, de fato, a integrantes da Lava Jato. O Intercept não diz quem enviou os arquivos com os diálogos.

Se confirmadas, as mensagens sugerem, por exemplo, que Moro não se ateve ao papel de julgar processos da Lava Jato quando era juiz. Ele teria influenciado os rumos da investigação, o que é proibido pela Constituição.

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