Vizinha da Marinha, 1ª favela alvo do Exército pós-intervenção é exemplo de desafio no Rio
Uma das 17 favelas que compõem o Complexo da Maré, a Kelson's -- primeira comunidade a ser vistoriada pelas Forças Armadas desde que o presidente Michel Temer (MDB) assinou o decreto de intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro -- é um dos exemplos da situação que será encontrada pelas Forças Armadas. Após uma operação de quase um dia, a favela voltou à normalidade, com criminosos circulando livremente.
Assim como cerca de outras 800 favelas no Estado, a comunidade é comandada pelo tráfico. Apenas um muro divide o local do CIAA (Centro de Instrução Almirante Alexandrino), maior e mais diversificado centro de formação de praças da Marinha, mas os criminosos não se inibem com a vizinhança.
Após a operação dos militares no local na segunda-feira (19), traficantes torturaram uma mulher de 63 anos por suspeitarem que ela havia passado informações sobre a atuação da quadrilha no local. Ela acabou resgatada por agentes da Polícia Civil na madrugada de quinta (22).
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Moradores contam que nesta quarta-feira (23), pouco mais de 24h depois de os militares deixarem a favela, onde passaram parte do dia revistando quem entrava e saia do local, o tráfico retomou suas atividades, exibindo armas e ostentando bocas de fumo como se a operação nunca tivesse acontecido.
No fim de janeiro, dois tiros de fuzil disparados da Kelson's – comandada pelo Comando Vermelho -- atingiram o ambulatório naval do CIAA. No mesmo mês, um criminoso armado subiu no muro do quartel e pediu que os recrutas interrompessem uma atividade física por causa do barulho, de acordo com relato de militares.
Recuperar o controle e evitar a "síndrome do cabrito"
O Rio, diz a socióloga e coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) da Universidade Cândido Mendes, Silvia Ramos, é o único local do país em que criminosos têm domínio sobre territórios da cidade. Não é incomum cruzar com barricadas e homens fortemente armados "guardando" a entrada de favelas, como na Kelson´s, o que torna a recuperação dos territórios um dos principais desafios da nova gestão de segurança.
A intervenção na Segurança Pública do Rio vai reduzir a violência no Estado?
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"Você entra em uma favela e é recebido por alguém com um fuzil que vai perguntar quem é você, para onde você vai. Vai ter domínio sobre a vida das pessoas", afirma Silvia.
O próprio projeto das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), hoje em declínio, foi uma tentativa de recuperar esses espaços. No entanto, dizem especialistas ouvidos pelo UOL, não basta apenas recuperar o controle de segurança dessas áreas, mas fazer com que serviços básicos, como fornecimento de luz, água e gás cheguem à população sem interferência do crime organizado.
Hoje, muitos desses serviços são controlados por criminosos e membros de milícias. Apenas a capital fluminense tem 1.018 favelas com 1.434.975 moradores, 22% da população da cidade, segundo dados do Instituto Pereira Passos.
Mais que contornar o comando do tráfico nesses espaços, cabe às Forças Armadas evitar a chamada “síndrome do cabrito”, em que são realizadas operações sem grandes resultados operacionais, e ganhar a confiança da população. A ação na favela que começou na segunda (19) e foi até o começo da tarde de terça (20) terminou com 11 presos e seis armas, dois simulacros de pistolas e seis granadas apreendidos.
Favela visitada por Madre Teresa de Calcutá
A Kelson's surgiu há 70 anos numa ocupação de oito pescadores. Por estar ao lado de uma base militar, ganhou, inicialmente, o nome de comunidade Marcílio Dias, herói da Batalha Naval do Riachuelo.
Com o tempo, acabou mais conhecida pelo nome da fábrica de PVC vizinha ao local, que hoje conta com 12 mil moradores.
O grau de pobreza extrema do local levou a comunidade a ser visitada por Madre Teresa de Calcutá em 1982, quando a missionária esteve no Brasil.
De acordo com o CML (Comando Militar do Leste), a ação na favela Kelson's faz parte de uma estratégia maior de bloqueios nas estradas, nas vias expressas de acesso ao Rio e nas favelas consideradas como destino de drogas, armas e cargas roubadas.
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