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Retrospectiva 2012: Política mundial teve reeleições nas Américas e surpresas na Europa

Mário Rossit

Do UOL, em São Paulo

24/12/2012 06h00

Sob os ecos da crise europeia, da Primavera Árabe e da morte de Osama bin Laden, em 2011, as eleições deste ano - que acenavam para mudanças drásticas no mapa geopolítico mundial - trouxeram, na contramão, mais do mesmo.

“Cada eleição é considerada o início de uma nova era; de cada presidente se espera uma nova ‘doutrina’ de política exterior”, escreveu o historiador Niall Ferguson, da Universidade Harvard e autor de “The Great Degeneration: How Institutions Decay and Economies Die”, no “New York Times”.

Ferguson, contudo, considera que não foi isso que ocorreu. “[As mudanças] São lentas porque, mesmo quando um novo fator se mostra correto, interesses velados e outras formas de inércia resistem à sua adoção. O mesmo vale para grandes descontinuidades políticas; elas não acontecem com frequência.”

Um exemplo veio dos EUA, onde Barack Obama levou a melhor sobre Mitt Romney, numa disputa apertada, ocorrida em novembro.

Analistas chegaram a dar como certa a vitória da oposição republicana. Mas o democrata Obama, que ficará no cargo até 2016, conseguiu uma vantagem na disputa a duas semanas das eleições, com uma ajuda inusitada da natureza: a supertempestade Sandy, que devastou parte da Costa Leste americana. Sua rápida atuação rendeu elogios até de republicanos e passou bem longe do mau exemplo de George W. Bush quando aconteceu a destruição do furacão Katrina, em Nova Orleans.

Em editorial, o "NYT" deu uma pista sobre como Obama reverteu um quadro desfavorável. “[A vitória de Obama] representou um endosso forte de políticas econômicas que enfatizam o aumento dos empregos, a reforma da saúde, os aumentos de impostos e a redução balanceada do deficit - e de políticas moderadas sobre a imigração, o aborto e o casamento homossexual”, apontou o jornal.

Outro fator decisivo foram os votos do eleitorado hispânico e feminino que compensou a derrota de Obama entre a população branca.

Contudo o presidente reeleito vai ter de lidar com uma Câmara majoritariamente republicana para aprovar suas medidas de governo, embora o Senado tenha predomínio de governistas.

Mais do mesmo também foi o que se viu nas eleições de outra potência, a Rússia. Vladimir Putin foi recolocado no cargo de presidente - embora haja quem diga, com boa dose de razão, que ele nunca foi tirado de lá.

Observadores internacionais classificaram a disputa como “injusta” e “enviesada” em favor de Putin - que recebeu 64% dos votos. De acordo com eles, o presidente eleito teve clara vantagem sobre seus rivais na mídia e recursos do Estado foram usados para apoiar a candidatura ao seu terceiro mandato.

"Não havia uma competição real e o abuso de recursos do governo asseguraram que o vencedor final das eleições nunca fosse uma dúvida", disse um dos monitores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa), Tonino Picula, em comunicado divulgado logo após as eleições, em março.

Houve uma chiadeira enorme. O líder do Partido Comunista da Rússia, Gennady Ziuganov, o segundo candidato mais votado, com 17,14%, disse: “Perdemos todos. Limparam os pés com nossos cidadãos. Não vejo sentido em felicitar ninguém”.

América do Sul

Na Venezuela, Hugo Chávez, no poder desde 1999, conseguiu sua terceira eleição e governará até 2019, após receber 54,42%. É certo, contudo, que o voto de confiança - até por conta da votação apertada - ficou longe da aclamação vista em eleições anteriores.

A oposição venezuelana teve - com o candidato Henrique Capriles Radonsky - seu melhor desempenho desde o início da era Chávez, em 1998, reduzindo à metade, em termos percentuais, a diferença de votos do presidente, em comparação com 2006.

Um indicativo de mudança na dinâmica política é o fato de Chávez ter, pela primeira vez, reconhecido o "civismo" da oposição e os 44% da população que votaram contra seu projeto político.

Se terminar seu novo mandato em 2020, Chávez será o mandatário eleito com mais tempo no poder na história moderna da América Latina.

Já a China nomeou o novo Politburo em novembro. O Comitê Central do Partido Comunista da China designou Xi Jinping como o secretário-geral da formação e "número um" da nova lista de sete membros do principal órgão reitor. Com isso, Xi, 59, assumirá a Presidência da China em março de 2013, sucedendo a Hu Jintao e dando o primeiro passo na transição da quarta para a quinta geração de líderes.

Os desafios de Xi não são poucos. Vão desde conter a crise de credibilidade pela qual passam as autoridades chinesas, por conta de casos de corrupção, a enfrentar a crise econômica sem enfraquecer o país.

Surpresas no Velho Continente

Da Europa, vieram algumas surpresas.

Na França, o candidato socialista François Hollande foi eleito após vencer o segundo turno para o Palácio do Eliseu, em março. Ele tomou posse no mesmo mês, no lugar do conservador Nicolas Sarkozy - que teve de enfrentar uma crise financeira e pagou com seu cargo por isso.

É o primeiro socialista na função desde 1995, quando François Mitterrand deixou a Presidência.

Diferentemente de seu antecessor, afeito ao estilo de pop star, Hollande tem o apelido de “Sr. Normal”. Uma das bandeiras de sua campanha foi acabar com o estrelismo, que rendeu a Sarkozy a alcunha de "Presidente Brilhareco". Deu certo.

No entanto, passada a euforia da vitória, Hollande se viu às voltas com o mesmo problema de Sarkozy: a economia. E, ao que tudo indica, o cenário vai demorar a melhorar.

“A prioridade é o equilíbrio das contas públicas. Mas, com crescimento econômico baixo, será difícil obter isso. Além disso, o crescimento fraco não permitirá conter o aumento do desemprego", disse o economista Éric Heyer, diretor do OFCE (Observatório Francês de Conjuntura Econômica).

"O desemprego e a pobreza vão aumentar. É difícil saber por quanto tempo o estado de graça de Hollande vai durar", afirmou Heyer. Pesquisas de opinião mostram que o presidente ainda tem a aprovação dos franceses, mas poucos se arriscam a prever até quando vai se manter essa popularidade com tantos problemas a resolver.

A Grécia, país afundado em dívidas e com um pé numa convulsão social, também promoveu uma mudança no comando ao sacar a esquerda do poder.

O líder do partido de centro-direita Nova Democracia, Antonis Samaras, após a vitória legislativa que o levou a primeiro-ministro, prometeu agir rapidamente para reerguer o país.

“Vou tentar formar um governo de salvação nacional com os partidos que acreditam na orientação europeia do país e acreditam no euro", disse Samaras, que se colocou com "fiador" da permanência da Grécia na zona do euro - um alívio para todas as economias europeias.

Em novembro, Samaras, a duras penas, conseguiu a aprovação da Eurozona e do FMI (Fundo Monetário Internacional) de uma parcela de um empréstimo, de 34,5 bilhões de euros, de um total de 130 bilhões acertados no começo do ano. Um primeiro passo para tentar tirar o país do atoleiro, político e econômico.

Pesadelo árabe

A eleição de Mohammed Mursi como presidente do Egito, em junho, representou um momento emblemático da chamada Primavera Árabe, onda de manifestações a favor de governos mais democráticos que se espalhou pelos países da região.

O candidato do Irmandade Muçulmana obteve 51,7% dos votos da eleição presidencial, derrotando por uma margem apertada Ahmed Shafiq, que foi primeiro-ministro do ex-ditador egípcio Hosni Mubarak, deposto no ano passado.

Ele se tornou o primeiro presidente eleito livremente da história do país e o primeiro presidente islâmico eleito do mundo árabe. Não é pouca coisa.

Contudo, logo depois da posse, em novembro, as ações de Mursi provocaram uma grave crise. Na surdina, ele publicou uma série de decretos que aumentavam seus poderes, desencadeando protestos violentos e greves por todo o país.

Déjà-vu mexicano

Nas eleições nacionais, os mexicanos optaram por uma espécie de túnel do tempo.

Enrique Peña Nieto colocou de novo o PRI (Partido Revolucionário Institucional) no poder - a sigla mandou no país de 1929 a 2000. Ele assumiu em dezembro e fica até 2018, sob acusações diversas da oposição, desde compra de votos e fraudes até uso de dinheiro público na campanha.

A grita teve motivo. O resultado das eleições só foi oficializado dois meses depois do pleito por conta de problemas na contagem e na totalização dos votos.

"As eleições não foram nem limpas, nem livres, nem autênticas, consequentemente não vou reconhecer um poder ilegítimo que surgiu da compra de votos e de outras violações graves à constituição e às leis", disse López Obrador, que recebeu 31,6% dos votos, contra 38,2% de Peña Nieto.