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Jovem se casa com guerrilheiro do EI para salvar o pai e relata mês de terror

Hanan, 26, dá depoimento à "CNN"; ela foi obrigada a se casar com guerrilheiro do EI - Reprodução/CNN
Hanan, 26, dá depoimento à "CNN"; ela foi obrigada a se casar com guerrilheiro do EI Imagem: Reprodução/CNN

Do UOL, em São Paulo

05/02/2015 21h41

A síria Hanan, 26, chora ao lembrar de quando trocou sua liberdade pela sobrevivência de seu pai, ameçado de morte pelo Estado Islâmico. "Minha mãe veio e me disse: 'eles irão soltá-lo se você se casar com o chefe da polícia Sharia. O nome dele é Abu Mohammed al-Iraqi'. Era a vida do meu pai em troca da mão dele em casamento. Não tínhamos ninguém além dele. Tive que aceitar."

Em depoimento à "CNN", Hanan –nome fictício–, há três semanas refugiada na Turquia, relembrou os 30 dias em que ficou sob domínio de um guerrilheiro do Estado Islâmico, na Síria. Abu Mohammed al-Iraqi não era seu nome real, o qual ela diz nunca ter ouvido, e Hanan conta que ele não demonstrava qualquer emoção –eles praticamente não se falavam.

Ela foi mantida presa em casa e só podia falar com seus pais, por telefone, na presença de Al-Iraqi. A jovem se tornou sua prisioneira, sua empregada e sua escrava sexual. "Toda garota sonha com o vestido branco de sua noite de casamento. Fui impedida de ter isso."

Seu drama começou depois do Estado Islâmico tomar sua cidade no leste da Síria e começar a prender qualquer acusado de burlar a Sharia, o código moral islâmico, de acordo com a interpretação radical do grupo. O irmão de Hanan foi morto em um conflito, e seu pai guardou seu rifle em memória. Acabou preso pelo grupo, que só aceitou poupar sua vida caso Hanan se casasse com o chefe da polícia.

No convívio com Al-Iraqi, Hanan notou que o guerrilheiro era paranoico. "Ele nunca se sentia seguro. Dormia com uma arma ao lado da cabeça e só atendia a porta com uma arma na mão e o rosto coberto. Não confiava em ninguém."

Apesar de a lei Sharia banir o fumo, Abu Mohammed al-Iraqi guardava cigarros em casa, onde fumava. De vez em quando, sumia por dias e a deixava presa. O guerrilheiro foi morto um mês após o casamento forçado, e Hanan foi devolvida a seus pais.

"Me senti como uma criança que voltou aos braços da mãe. Mas algo em mim havia se perdido. Minha mãe só tinha lágrimas para expressar suas emoções. Meu pai também, porque me sacrifiquei por ele."

O Estado Islâmico ainda tentou obrigar Hanan a se casar com outro guerrilheiro, dizendo que ela não poderia ficar sem um marido. A família, então, conseguiu fugir para uma área controlada pelo governo sírio. Depois, ela se refugiou na casa de parentes na Turquia. Hoje, além do trauma que carrega, Hanan se preocupa com as mulheres que enfrentam situação semelhante.

"Não sei quantas estão passando pelo que eu passei. Eles fazem o que querem. Casam e se divorciam de acordo com sua vontade", diz Hanan. Centenas de casos semelhantes foram relatados pelo grupo ativista Raqqa Is Being Slaughtered Silently ['Raqqa –cidade da Síria– Está Sendo Silenciosamente Trucidada'], e cerca de um terço são mulheres com menos de 18 anos. Segundo Hanan, o cenário faz com que garotas com mais de 13 anos raramente saiam de casa nessas cidades.

Ela conclui afirmando que teve a alma retalhada e a dignidade tirada. "Mesmo agora eu não consigo compreender o que aconteceu comigo, que eu passei por isso. Estou destruída."