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Operação Lava Jato

Conselho do MP aumenta pressão sobre Deltan e Lava Jato com decisões

O procurador da República e uma das faces mais conhecidas da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, durante palestra em seminário no Hotel Maksoud Plaza - Alice Vergueiro/Folhapress
O procurador da República e uma das faces mais conhecidas da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, durante palestra em seminário no Hotel Maksoud Plaza Imagem: Alice Vergueiro/Folhapress

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

14/08/2019 04h01Atualizada em 26/08/2019 17h20

Decisões da sessão de ontem do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) elevaram a pressão sobre o coordenador da Operação Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal) em Curitiba, Deltan Dallagnol, e sobre a atuação dos procuradores da força-tarefa.

Atualmente, há no CNMP 12 reclamações disciplinares contra Deltan - que podem resultar até em afastamento do procurador.

Ao abrir a sessão, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que também preside o conselho, defendeu atuação dos procuradores "dentro dos marcos da legalidade".

Na sequência, o conselho tomou decisões que configuram reveses contra a Lava Jato:

Entenda:

Recurso negado

Em seguida, os conselheiros decidiram negar recurso de Dallagnol contra a abertura de um processo disciplinar. O processo foi aberto em abril pelo CNMP, após pedido do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli.

Esse caso se refere à entrevista a uma rádio na qual Deltan afirmou que alguns ministros do STF "mandam uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção".

Com isso, o processo continua tramitando. O relator, Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, já pediu por duas vezes a prorrogação do prazo para concluir as apurações.

Por meio da assessoria de imprensa do MPF, Deltan informou que "irá se manifestar quando requerido institucionalmente em relação ao Procedimento Administrativo".

Esse processo contra Deltan já foi transformado em um PAD (Processo Administrativo Disciplinar) pelo CNMP. Apenas ao fim dessa fase do processo é que será decidido se serão aplicadas punições (veja ao fim do texto sobre a tramitação).

Processo desarquivado

Também durante a sessão de ontem, a pedido dos conselheiros Leonardo Accioly da Silva e Erick Venâncio Lima do Nascimento, indicados pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o CNMP desarquivou representação contra Deltan e procuradores da Lava Jato baseada nos diálogos revelados por reportagens do site The Intercept Brasil.

As conversas provocaram críticas sobre a legalidade da colaboração entre os procuradores e o então juiz Sergio Moro, que julgava processos da Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba.

Em decisão individual, o corregedor, Orlando Rochadel, havia arquivado o processo sob o argumento de que as mensagens não tinham autenticidade comprovada.

Com o desarquivamento, o processo volta a tramitar no CNMP como uma representação disciplinar, que será distribuído a um relator ainda a ser escolhido.

Por meio da assessoria de imprensa do MPF, a força-tarefa da Lava Jato informou que o processo sobre as mensagens ainda não teria sido de fato reaberto pelo CNMP, pois tal decisão ainda depende de aval do plenário do conselho.

"O procedimento decorrente de mensagens não reconhecidas divulgadas na imprensa nos últimos dias não foi reaberto, mas sim foi encaminhado a um conselheiro para avaliar a pertinência de submeter sua reabertura ao plenário", disse a força-tarefa, em nota.

No entanto, o CNMP informou à reportagem do UOL, por meio de sua assessoria de imprensa, que o pedido de desarquivamento feito pelos conselheiros tem o poder de fazer o tema voltar a ser analisado pelo conselho, podendo levar à abertura de um PAD, após voto do novo relator do caso.

Críticas ao STF

Uma terceira decisão do CNMP contra integrantes da Lava Jato foi a abertura de um PAD contra o procurador da República Diogo Castor, que já foi integrante da força-tarefa, mas deixou o grupo em abril.

O processo vai apurar se Castor se excedeu em suas declarações em artigo publicado na imprensa com críticas à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de remeter à Justiça Eleitoral casos de corrupção que possuam conexão com crimes eleitorais.

Em artigo publicado no site "O Antagonista", Castor afirma que "vem sendo ensaiado na Segunda Turma do STF o mais novo golpe à Lava Jato" e menciona a possibilidade de "ataques covardes engendrados nas sombras".

O pedido de investigação contra o procurador foi apresentado ao CNMP pelo presidente do STF, Dias Toffoli, em março.

A procuradora-geral Raquel Dodge defendeu a apuração do caso. "Também a liberdade de expressão tem limite. E é preciso avaliar se ela foi excedida nesse caso concreto", afirmou a procuradora.

Por meio da assessoria de imprensa do MPF, Diogo Castor afirmou que "sua manifestação foi proferida como cidadão e que está protegida pelo direito de crítica como desdobramento da liberdade de expressão, e que apresentará sua defesa no próprio procedimento", disse o procurador, em nota.

Cobrança por julgamento

Apesar de ter retirado de pauta o processo movido pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) por conta de declarações de Deltan redes sociais, o corregedor Orlando Rochadel chegou a criticar a postura do procurador no caso.

"Acho que o membro [do Ministério Público] agiu de maneira equivocada", disse Rochadel.

Rochadel afirmou que retirou o processo de pauta porque Deltan ainda não havia apresentado defesa contra um novo pedido de Renan para que o CNMP afaste o procurador do cargo.

Em outra frente de pressão sobre Deltan, o conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, que ocupa a vaga destinada a indicados pelo Senado, cobrou que os processos contra Deltan sejam julgados.

Processos no CNMP

As 12 reclamações contra Deltan no CNMP se dividem assim:

  • 7 chegaram depois que o Intercept Brasil e veículos parceiros, como UOL e a Folha, publicaram reportagens com base nas mensagens de Telegram trocadas entre o procurador e seus colegas da Lava Jato
  • Renan Calheiros se queixou contra declarações de Deltan nas redes sociais
  • Dias Toffoli abriu representação após entrevista de Deltan criticando o STF
  • Kátia Abreu (PDT-TO) reclamou por Deltan ter compartilhado em redes sociais reportagem sobre investigação contra a senadora. O processo foi arquivado pelo corregedor, mas voltou a tramitar após recurso.
  • Parlamentares do PT fizeram reclamação disciplinar sobre o acordo entre Lava-Jato e Petrobras que criaria fundo bilionário para o combate à corrupção. Esse acordo foi suspenso a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) por decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes.
  • Anteontem, foi pedido o desarquivamento de uma representação sobre suposto financiamento irregular por procuradores de um outdoor de apoio à Lava Jato instalado em Curitiba. A representação foi aberta contra a força-tarefa, e não especificamente contra Deltan.

O corregedor do CNMP, Orlando Rochadel, determinou a instauração de reclamação disciplinar para que a força-tarefa da Lava Jato seja ouvida. Posteriormente, o CNMP deverá avaliar se o caso merece ser investigado e se será aberto um processo.

Como funciona o CNMP

As representações contra qualquer procurador que chegam ao conselho primeiro são recebidas pela Corregedoria do CNMP:

  1. O corregedor decide se há fundamentos na representação
  2. Se houver, pede defesa prévia ao acusado e faz uma apuração preliminar para avaliar se abre processo disciplinar
  3. Decisão de abrir Processo Administrativo Disciplinar (PAD) é levada ao plenário do CNMP
  4. Na tramitação do PAD, o acusado apresenta formalmente a defesa, e conselheiros analisam provas
  5. Eventuais punições são definidas por decisão do conselho.

O CNMP tem 14 conselheiros. Oito deles são membros dos diversos ramos do Ministério Público, dois são juízes indicados pelo STF e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), dois são indicados pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e mais dois indicados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

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