Lava Jato abre nova frente e mira bancos em investigações de corrupção
A 61ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada hoje (8), foi a primeira voltada a apurar crimes praticados por um novo alvo das investigações da força-tarefa: os bancos. Nesta manhã, pela primeira vez, integrantes da operação cumpriram mandados de busca e apreensão na sede de uma instituição financeira do país. Horas depois, indicaram em entrevista coletiva os próximos passos da maior ação de combate à corrupção do país, iniciada em 2014.
"Esta fase [da Lava Jato] marca o início de um processo de responsabilização de agentes do mercado financeiro que permitiram ou participaram de atos investigados na operação", afirmou o procurador Julio Motta Noronha, na Superintendência da PF (Polícia Federal) em Curitiba, cidade em que as investigações da Lava Jato começaram.
Nesta fase, o Banco Paulista S.A., de São Paulo, foi o alvo da Lava Jato. Criado em 1990 e especializado em operações de câmbio, o banco teria sido usado por executivos do esquema de distribuição de propinas da Odebrecht para lavagem de dinheiro.
De acordo com investigações, os executivos movimentavam contas no exterior a pedido da empreiteira e ganhavam comissões pelas transações. Essas comissões eram pagas pelo Banco Paulista por meio de contratos falsos firmados com empresas de fachada abertas por esses mesmos executivos no Brasil.
Só entre 2009 a 2015, mais de R$ 48 milhões foram distribuídos pelo banco desta forma, de acordo com a PF e o MPF. Os órgão, entretanto, apontam que outras empresas de fachada, cuja ligação com o esquema da Odebrecht não está comprovada, receberam outros R$ 286 milhões.
Essas transações, assim como outras transações do Banco Paulista e de outros bancos, cujos nomes ainda não foram divulgados, ainda vão ser analisadas e verificadas pela Lava Jato.
Na Suíça, o Ministério Público local já investiga dois bancos por suspeitas de envolvimento com crimes da Lava Jato. Mais de mil contas em 42 instituições financeiras do país já foram congeladas a pedido da operação brasileira.
Operação suspeita de R$ 14 bilhões
O procurador da República Roberson Pozzobon, também integrante da Lava Jato, disse que uma operação específica do Banco Paulista receberá atenção especial de investigadores. O banco, entre 2007 e 2009, importou R$ 14 bilhões em espécie de outros países. Na prática, o banco solicitou que instituições financeiras estrangeiras enviassem em carros-fortes em outros meios de transporte notas de reais para sua tesouraria.
Essa operação foi registrada pelo Banco Paulista no Banco Central, conforme determina a regulação bancária. O banco ainda afirmou que parte dos recursos que pagou a empresas de fachada investigadas na Lava Jato foram uma comissão pela intermediação dessa importação.
Acontece que um delator da Odebrecht, Olívio Rodrigues, indicado pelo banco como um dos recebedores da comissão, negou ter prestado qualquer serviço ao banco. Apuração do Banco Central também verificou que não há indícios de que essa importação de recursos realmente ocorreu.
"Essa operação [de importação de valores] ainda está sob investigação na Lava Jato.", afirmou Pozzobon. "Chama muita atenção a importação de valores bilionários em espécie."
Diretores promovidos após suspeitas
Pozzobon lembrou que suspeitas sobre a atuação do Banco Paulista são apuradas desde 2016. Naquele ano, executivos da Odebrecht que firmaram acordos de delação premiada com a Lava Jato citaram o banco como parte do esquema de corrupção existente na empresa.
Após a citação, o Banco Central chegou a cobrar explicações do banco sobre as suspeitas. O banco prestou informações aos órgãos de fiscalização, mas não afastou diretores envolvidos nas operações sob investigação. Dois diretores, inclusive, foram promovidos pelo Banco Paulista e passaram a responder pela instituição aos questionamentos feitos por autoridades a respeito das operações suspeitas delatadas pela Odebrecht.
De acordo com o MPF, Tarcísio Rodrigues Joaquim, foi diretor da área de câmbio do Banco Paulista durante o funcionamento do esquema investigado. Depois, virou diretor de Operações Internacionais, supervisionando assim a área de câmbio do banco. Já Gerson Luiz Mendes de Brito era diretor-geral do banco na época dos fatos. Virou chefe da controladoria do banco, respondendo pela área de controle da corrupção envolvendo a instituição, ou seja, área de compliance.
"Compliance não é brincadeira", reclamou Pozzobon. "Nos surpreendemos quando vimos que os próprios executivos que estavam sendo investigados estavam respondendo pelo banco pelos atos ilícitos que teriam cometido."
Tarcísio e Gerson foram presos preventivamente nesta manhã a pedido da Lava Jato. Além deles, Paulo Cesar Haenel Pereira Barreto, funcionário da mesa de câmbio do Banco Paulista, também foi preso.
Contrato com empresa de fachada
O delegado da PF, Alessandro Netto Vieira, coordenador desta fase da Lava Jato, afirmou que as buscas realizadas em sedes de empresas com as quais o Banco Paulista fez negócios comprovam que contratos falsos foram fechados com empresas de fachada.
Segundo Vieira, uma joalheria do Rio de Janeiro firmou um contrato com o banco para venda de R$ 100 milhões em ouro durante três anos. Essa joalheria, entretanto, funciona num pequeno escritório no subúrbio do Rio de Janeiro, tem capital social de apenas R$ 30 mil e todas as notas fiscais que emitiu foram por conta de serviços prestados ao Banco Paulista.
"A joalheira funciona num sobradinho. Não tem estrutura para justificar um contrato deste tamanho", afirmou ele. "Outras seis empresas visitas sequer existem fisicamente."
Em nota divulgada à imprensa, o Banco Paulista informou que sua área de câmbio foi surpreendida com uma operação da Polícia Federal. "A instituição está colaborando com as autoridades e retomando suas operações regulares", complementou.
Importância do Coaf e da Receita Federal
Durante a coletiva referente à 61ª fase da Lava Jato, membros do MPF aproveitaram para destacar a importância do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da Receita Federal para apuração de casos de corrupção e lavagem de dinheiro. Ambos os órgãos estão envolvidos em polêmicas relacionadas a sua participação em investigações.
O governo federal discute a transferência do Coaf do Ministério da Justiça para o Ministério da Economia, que comandou o Coaf em gestões anteriores. O ministro da Justiça, Sergio Moro, que já foi o juiz responsável pelo julgamento dos casos da Lava Jato, vê o Coaf como um órgão estratégico para o combate à corrupção e defende que ele permaneça no seu ministério.
O procurador Noronha disse que o Coaf é muito importante para investigações como as realizadas pela Lava Jato. Segundo ele, agentes corruptos sabem que o órgão consegue detectar operações suspeitas e, por isso, não comunicam algumas transações ao conselho, mesmo sendo obrigados por lei a fazê-lo. "Os executivos sabem que uma comunicação ao Coaf vai levar a uma investigação", disse Noronha. "Aí vemos a importância do órgão."
Já Pozzobon destacou a importância do compartilhamento de informações obtidas pela Receita Federal com o MPF e PF. Recentemente, a Justiça julgado como irregular que esse compartilhamento seja feito sem a autorização expressa do Judiciário. Para Pozzobon, isso só atrapalha investigações.
"A quem interessa que crimes de corrupção de lavagem de sejam mantidos em segredo para que não possam ser investigados? Se isso interessa a alguém, é a quem foi flagrado nesses delitos."
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