Marielle: Bate-boca marca reunião de família com governador do RJ e polícia
A primeira reunião de parentes da vereadora Marielle Franco —assassinada há quatro anos no Rio de Janeiro— com o governador Cláudio Castro (PL) e o secretário da Polícia Civil, Allan Turnowski, na última segunda-feira (14), foi marcada por bate-boca no Palácio Guanabara, sede do governo fluminense.
As autoridades foram questionadas pela família —sem acesso às investigações e aos autos do processo— por que ainda não se conhece o mandante e a motivação do crime. Em um dos momentos mais tensos, Turnowski foi perguntado se a polícia seria "incompetente ou corrupta" em razão da falta de respostas.
Exaltado, o secretário reagiu, dizendo que as investigações não estão paradas e citou a prisão em 2019 dos ex-PMs Ronnie Lessa e Élcio Queiroz —acusados de serem os executores do crime.
O governador do Rio teve então que intervir e pediu que Turnowski "se acalmasse" para que a reunião pudesse continuar.
O UOL apurou junto a quatro pessoas que participaram do encontro que Castro e Turnowski ficaram "na defensiva" ante as cobranças sobre o caso.
Em nota, a Polícia Civil afirmou que não houve embate na reunião, "pois todos têm o mesmo desejo de sucesso na investigação". A polícia definiu o atrito como uma "discordância" e afirmou que "o secretário lembrou que os dois autores foram identificados e presos".
O UOL também procurou o Instituto Marielle Franco. Sem dar detalhes sobre o encontro, a advogada Brisa Lima, que assessora juridicamente o instituto, limitou-se a dizer que o principal desejo das famílias é ter acesso aos autos das investigações para poder acompanhá-las e saber quem é o mandante do crime.
Além de Castro e Turnowski, estavam presentes na reunião a vereadora Mônica Benício (PSOL), viúva de Marielle, os pais, a filha e a irmã da vereadora assassinada, a esposa do motorista Anderson Gomes e representantes das ONGs Anistia Internacional Brasil e Justiça Global.
Tom de Castro incomoda familiares
Para marcar o dia 14 de março, o Instituto Marielle Franco organizou uma série de atividades, entre elas, uma missa em homenagem às vítimas e um encontro musical no Circo Voador.
A comitiva de Castro chegou 50 minutos após o horário marcado (15h), o que atrasou a programação preparada pelo instituto.
Em sua primeira fala, Castro afirmou que era a pessoa mais interessada em desvendar o caso. A frase foi vista como "vazia" e desrespeitosa com os parentes, que convivem há quatro anos com a falta de respostas. Para um dos presentes, o incômodo se agravou a partir da declaração.
A expectativa era de que —após um ano de espera pela reunião— os parentes de Marielle e Anderson fossem ouvidos, mas isso não aconteceu, segundo apurou a reportagem.
Ao ser questionado sobre o rumo das investigações, Castro afirmou que "o caso já está metade concluído" em alusão à prisão dos ex-PMs acusados de serem executores.
O governador disse também que sua gestão é a que mais prende milicianos na história do Executivo fluminense, o que, segundo ele, o leva a ser perseguido e "compreender" o sentimento dos familiares.
Para as fontes ouvidas pelo UOL, Castro adotou um tom de declaração à imprensa, e não de escuta das famílias de duas pessoas assassinadas.
O governador afirmou ainda que tem investido mais recursos na Polícia Civil, o que segundo ele ajudará nas investigações do Caso Marielle.
Secretário descarta componente racial e causa desconforto
Turnowski chegou a afirmar que o assassinato de Marielle não tinha o componente racial e que, "independentemente de qualquer coisa", trata-se da morte de uma parlamentar.
Os parentes não se manifestaram sobre a declaração, mas houve desconforto.
Criada no Complexo da Maré, Marielle era uma vereadora negra e bissexual que focava sua atuação política em defesa de causas relacionadas à sua identidade. A família procura manter tais credenciais associadas à imagem de Marielle.
O secretário justificou que a demora em chegar aos mandantes significa que a procura está sendo realizada de forma correta, senão "já teriam botado qualquer um [como culpado]".
Marielle Franco (PSOL) foi a quinta vereadora mais votada nas eleições de 2016 no Rio de Janeiro, com 46.502 votos. Ela foi assassinada na noite do dia 14 de março de 2018, junto de seu motorista Anderson Gomes, dentro de um carro na região central da capital. Marielle deixou esposa e uma filha. Anderson também era casado e deixou um filho, na época com 1 ano de idade.
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