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Operação Lava Jato

Temer lidera organização há 40 anos, diz MP: "estranho seria não ser preso"

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

21/03/2019 16h56Atualizada em 22/03/2019 10h52

O ex-presidente Michel Temer e seu amigo João Batista Lima Filho, conhecido como Coronel Lima, integram uma organização criminosa que atua no desvio de dinheiro público há 40 anos. A informação foi dada hoje durante entrevista coletiva da força-tarefa da Operação Lava Jato que explicou os crimes que levaram o ex-presidente e seu amigo a serem presos nesta manhã. Outros oito pedidos de prisão foram feitos, entre eles contra o ex-ministro Moreira Franco.

Na entrevista, os procuradores chegaram a dizer que a prisão de Temer não foi surpreendente, mas sim necessária.

Segundo o procurador Eduardo El Hage, a organização criminosa liderada por Michel Temer continuou operando após a Lava Jato, inclusive no ano passado.

Estranho seria se Michel Temer não estivesse preso (...) A forma como ele praticava os crimes é algo que nos causou muita surpresa, mesmo depois de 3 anos da Lava Jato
Eduardo El Hage, procurador da República

Segundo o MPF, Lima atuava desde os anos 1980 junto à Argeplan, embora só tenha formalizado sua participação na empresa no começo dos anos 2000. Para os procuradores, essa atuação oculta de Lima se dava no sentido de esconder a organização criminosa que integrava, além de proteger a imagem pública do ex-presidente Michel Temer.

"Coronel Lima e Michel Temer atuam desde os anos 1980 juntos. Essa amizade começou quando Temer era secretário de Segurança de São Paulo, e Lima era seu assessor militar", disse a procuradora da República, Fabiana Schneider.

Esse grupo criminoso tem atuação há pelo menos 40 anos. Isso ficou muito bem constatado em toda a investigação feita pelo MPF, ao longo de algumas operações que foram deflagradas
Fabiana Schneider, procuradora da República

O MPF notou que a atuação de Temer e Lima se deu paralelamente ao ingresso da Argeplan em contratos com o poder público. "É visível o crescimento exponencial da empresa nos momentos em que Temer ocupava cargos públicos", disse Schneider.

Veja o momento em que o ex-presidente Michel Temer é preso em São Paulo

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Empresa sem capacidade técnica

Sobre o caso específico que levou à prisão de hoje, os procuradores informaram que Temer foi responsável pela escolha de Othon Luiz Pinheiro da Silva para chefiar a empresa Eletronuclear. A escolha teria o objetivo de conseguir contrapartidas para o núcleo criminoso liderado por Temer, segundo o MP.

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Ainda de acordo com a investigação, a Argeplan foi escolhida para participar do consórcio de obras da usina nuclear de Angra 3 mesmo sem ter capacidade técnica para tal.

"Ele [Othon] foi colocado na Eletronuclear e, em contrapartida, foi exigida a contratação da Argeplan. Ela foi subcontratada pela empresa para uma tarefa que ela não tinha capacidade de executar. É uma empresa do Coronel Lima que fazia obras de pouquíssima complexidade, mas foi contratada como forma de verter todo o dinheiro público para Michel Temer", explicou o procurador Eduardo El Hage.

Durante a entrevista, El Hage afirmou que a suspeita contra a atuação do grupo de Temer na construção da usina nuclear Angra 3 ganhou força a partir de uma delação de um funcionário da Engevix, feita após duas operações que investigavam a empresa e a Eletronuclear.

Tanto o ex-presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, o Almirante Othon, quanto sua filha Ana Cristina da Silva Toniolo, são suspeitos de participarem do desvio de recursos públicos. Othon e sua filha foram condenados pela Lava Jato no Rio, mas Othon está solto por um habeas corpus concedido pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

31.mai.2017 - O coronel reformado da PM de São Paulo João Batista Lima Filho, amigo do presidente Michel Temer e acusado de ser "laranja" dele - Jefferson Coppola/Folhapress - Jefferson Coppola/Folhapress
O coronel reformado da PM de São Paulo João Batista Lima Filho, amigo do presidente Michel Temer
Imagem: Jefferson Coppola/Folhapress

O caso

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O ex-presidente foi preso na manhã de hoje sob suspeita de atuar em esquemas de corrupção que envolvem mais de R$ 1,8 bilhão em propinas - pagas e prometidas. Entre as justificativas da força-tarefa da Operação Lava Jato para requisitar a prisão de Temer, estão a de que ele é líder de uma organização criminosa que inclui outros quadros do MDB.

Ao todo, o juiz federal Marcelo Bretas expediu dez mandados de prisão. Os envolvidos no esquema também são suspeitos de produzir documentos falsos para dificultar as investigações.

No pedido de prisão, o MPF listou 16 áreas em que os esquemas de Temer tiveram influência. Na lista, estão citadas estatais como Eletronuclear, Petrobras, Caixa, além da Câmara dos Deputados e outras instituições públicas.

Na entrevista coletiva, a Polícia Federal informou que a investigação é baseada em ao menos nove pontos:

  • irregularidades em processos licitatórios
  • participação de empresas sem qualificação técnica em processos licitatórios
  • contratações superfaturadas
  • sofisticado esquema de lavagem de dinheiro para distanciar o produto do crime de seus autores
  • existência e simulação de contratos de prestação de serviços sem efetiva prestação de serviço
  • emissão de notas frias
  • utilização de empresas de fachada, inclusive sem funcionários, que recebiam milhões em contratos fictícios
  • empresas offshore no exterior
  • pagamento de vantagens indevidas em espécie

O que dizem os suspeitos

Em nota, o advogado de Michel Temer, Eduardo Carnelós, classificou a operação como um dos "mais graves atentados ao Estado Democrático e de Direito no Brasil"; além disso, o criminalista disse não haver nenhum "elemento de prova" sustentado a prisão. Veja a nota na íntegra:

"A prisão do ex-presidente Michel Temer, que se deu hoje, constitui mais um e dos mais graves atentados ao estado democrático e de direito no Brasil.

Os fatos objeto da investigação foram relatados por delator, e remontam ao longínquo 1° semestre de 2014. Dos termos da própria decisão que determinou a prisão, extrai-se a inexistência de nenhum elemento de prova comprobatório da palavra do delator, sendo certo que este próprio nada apresentou que pudesse autorizar a ingerência de Temer naqueles fatos.

Aliás, tais fatos são também objeto de requerimento feito pela Procuradora-Geral da República ao STF, e o deferimento dele pelo Ministro Roberto Barroso, para determinar instauração de inquérito para apurá-los, é objeto de agravo interposto pela Defesa, o qual ainda não foi julgado pelo Supremo.

Resta evidente a total falta de fundamento para a prisão decretada, a qual serve apenas à exibição do ex-presidente como troféu aos que, a pretexto de combater a corrupção, escarnecem das regras básicas inscritas na Constituição da República e na legislação ordinária.

O Poder Judiciário, contudo, por suas instâncias recursais, haverá de, novamente, rechaçar tamanho acinte."

A defesa do Coronel Lima também se manifestou sobre a prisão e se disse perplexa com a prisão decretada. "A própria Procuradoria-Geral da República manifestou-se em relação aos mesmos fatos e concluiu que não havia elementos para a prisão do meu cliente. Surpreendentemente, 2 meses depois, contrariando o entendimento da PGR, a prisão é decretada pela 1ª instância, sem a existência de nenhum fato novo".

A defesa do ex-ministro Moreira Franco vê "inconformidade" na prisão cautelar. Segundo seus advogados, o ex-ministro "encontra-se em lugar sabido, manifestou estar à disposição nas investigações em curso, prestou depoimentos e se defendeu por escrito quando necessário." Além disso, questionam a competência do juiz Marcelo Bretas: "Causa estranheza o decreto de prisão vir de juiz de direito cuja competência não se encontra ainda firmada, em procedimento desconhecido até aqui.", Disseram os advogados, em nota.

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