Lava Jato: Cabral diz ter recebido propina e caixa dois de cervejaria
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) disse em depoimento ao juiz federal Marcelo Bretas --responsável pelas ações da Operação Lava Jato na primeira instância no Rio de Janeiro-- que o empresário Walter Faria, dono do Grupo Petrópolis, foi pagador de propina para a organização criminosa chefiada por ele e de caixa dois para ao menos três campanhas eleitorais. De acordo com Cabral, a propina (que não teve valores revelados por Cabral) foi paga pela empresa por intermédio do seu principal operador financeiro, Carlos Miranda.
O Grupo Petrópolis informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não obteve qualquer benefício fiscal ou financeiro durante o governo Cabral. A empresa disse que sempre atuou de acordo com a legislação e que suas relações com o estado do Rio foram pautadas por critérios de geração de empregos, "razão pela qual nunca precisou de qualquer subterfúgio para atuar no estado".
Durante depoimento, o ex-governador chegou a sugerir que Faria fosse convocado para depor ao MPF (Ministério Público Federal).
Em delação premiada, Carlos Miranda já havia dito ao MPF que o Grupo Petrópolis --por meio da Cervejaria Itaipava, que compõe o conglomerado de empresas-- pagava mesadas de até 500 mil à organização do ex-governador em troca de benefícios fiscais. "Era o Carlos Miranda quem fazia artimanhas para justificar esses ganhos", reconheceu.
"Tinha propina. Houve ajuda em campanha eleitoral e, de fato, havia esse recurso, como o Carlos Miranda falou no depoimento dele que parte era para lavagem de dinheiro, outra parte ficava para o Ary [Filho, um dos seus operadores] e outra para gastos do caixa", disse.
Cabral disse, no entanto, não ter conhecimento de pagamento direto de propina para a organização criminosa por meio do Supermercado Prezunic, conforme dito na delação de Miranda. De acordo com Cabral, o grupo repassou dinheiro "apenas para valores não declarados de campanha".
"Em relação ao Prezunic, não houve entrega de propina. Essa relação [dele, com o então presidente do grupo, Joaquim Cunha] começou quando eu era presidente da Alerj [Assembleia Legislativa do Rio] e houve uma tentativa de extorsão ao grupo por parte de alguns deputados e eu intervim. Desde então, o Joaquim ficou muito próximo e começou a ajudar com caixa dois em 2010 e 2006, quando eu fiz campanhas [ambas ao governo do estado]", disse.
De acordo com o ex-governador, é possível que Ary Filho tenha negociado propinas em seu nome, sem que ele fosse previamente avisado. "Talvez o Ary tenha pego, em meu nome, dinheiro nesse supermercado para fins pessoais", disse.
Em nota, o Cencosud, detentor da Prezunic desde 2012, afirma que "desconhece qualquer pagamento feito de forma irregular e está à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento adicional que se faça necessário".
Mudanças na estratégia de defesa
Preso desde novembro de 2016 e condenado a um total de 198 anos e seis meses de prisão, Cabral foi denunciado 29 vezes no âmbito da Lava Jato no Rio. Ele trocou a sua defesa em dezembro. Na época, cogitou-se uma delação premiada do ex-governador. No entanto, o acordo nunca foi confirmado.
Desde então, o que se vê é uma mudança de estratégia da nova defesa. No mês passado, Cabral admitiu o recebimento de propina durante seus dois mandatos e apontou o ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB) como recebedor de valores indevidos.
Cabral definiu a cobrança de propina em seu governo como um "vício" e um "erro de postura" --foi a primeira vez que ele admitiu na Justiça desde que foi preso ter recebido dinheiro sobre contratos.
Na audiência de hoje, ele falou sobre o tema. "Diante da nova postura que adotei, quero reconhecer os meus erros e externar o meu arrependimento", afirmou, na abertura do depoimento.
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