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Operação Lava Jato

Com críticas a Moro, Cunha quer anular processo com mensagens da Lava Jato

O ex-deputado Eduardo Cunha em interrogatório comandado pelo então juiz Sergio Moro - Reprodução - 31.out.2018/JF-PR
O ex-deputado Eduardo Cunha em interrogatório comandado pelo então juiz Sergio Moro Imagem: Reprodução - 31.out.2018/JF-PR

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

11/10/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Advogados usaram reportagens do The Intercept Brasil para pedir anulação
  • Segundo a defesa, mensagens evidenciam que Moro foi parcial
  • Audiência em processo de Cunha foi último ato como juiz do hoje ministro

O ex-deputado federal Eduardo Cunha (MDB-RJ) pediu a anulação do processo em que é réu na Justiça Federal do Paraná e que está pronto para receber sentença.

O argumento do ex-parlamentar tem como base as mensagens interceptadas de procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato e de Sergio Moro, ex-magistrado federal e atual ministro da Justiça. A defesa do político diz que as mensagens "não deixam dúvidas sobre a inequívoca" parcialidade de Moro.

Ex-presidente da Câmara dos Deputados, Cunha foi acusado pelo MPF (Ministério Público Federal) de ter recebido propina de cerca de US$ 5 milhões entre 2006 e 2012. O valor estaria ligado a uma articulação para viabilizar a construção de dois navios-sondas da Petrobras. Os crimes atribuídos ao ex-parlamentar são os de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-deputado, que está preso desde outubro de 2016, já foi condenado em um outro processo na Lava Jato do Paraná. Sua pena nessa ação é de 14 anos e seis meses de prisão sob a acusação de ter recebido US$ 1,5 milhão em propina por um contrato para exploração de um campo de petróleo na África. Cunha nega as acusações nos dois processos.

No documento, apresentado ao juiz Luiz Antônio Bonat em 9 de outubro, Cunha alega que Moro foi parcial na condução do processo. Bonat substituiu Moro no comando da 13ª Vara Federal em Curitiba após o ex-juiz ter aceitado o convite de Jair Bolsonaro (PSL) para assumir o Ministério da Justiça.

O interrogatório de Cunha no processo, aliás, foi o último ato de Moro como juiz, em 31 de outubro do ano passado. Em 1º de novembro, ele se afastou das funções para se preparar para o novo cargo. "Um final de carreira brilhante para o futuro Ministro da Justiça", ironizou a defesa de Cunha na petição a Bonat.

O principal embasamento dos advogados são as mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil em parceria com outros veículos, como o UOL. Os defensores argumentam que elas trouxeram "fatos novos".

Moro e advogado de Cunha discutiram no último interrogatório do juiz

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Defesa aponta 'predisposição em não aceitar' delação

Os advogados utilizaram três reportagens na petição a Bonat. Uma delas aponta que Moro seria contra o acordo de delação de Cunha.

"Rumores de delação do Cunha... Espero que não procedam", escreveu Moro ao coordenador da força-tarefa no MPF em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, em julho de 2017. Os advogados dizem que a relação entre os dois é "promíscua", "ferindo de morte o sistema acusatório". "A conversa evidencia um nítido e desproporcional desequilíbrio na balança da Justiça."

Para a defesa, "o que salta aos olhos na mensagem trocada é que, mesmo sem saber o eventual conteúdo e elementos de corroboração a serem apresentados, já havia uma predisposição em não aceitar o citado acordo". Os defensores apontam que isso comprova "que o ex-juiz Moro era o verdadeiro chefe da força-tarefa".

'Estratégia persecutória'

Uma segunda reportagem apontou que o ex-juiz instruiu a força-tarefa a não apreender celulares de Cunha. A defesa dá a entender que isso poderia levar o processo para o STF (Supremo Tribunal Federal), já que, como político, o ex-deputado mantinha contato com pessoas com foro privilegiado. As mensagens foram trocadas um dia antes de Cunha ser preso, em 2016.

"Agindo como parte interessada (algo que jamais deveria ser), o juiz fez claramente uma estratégia persecutória, uma gestão de riscos: era melhor não apreender o celular, para não correr o risco de perder a competência", escreveu a defesa.

A terceira reportagem mostra que a Lava Jato sugeriu "vazamento seletivo" de informações para a imprensa para tentar barrar uma possível soltura de Cunha pelo STF. Em mensagem, Moro teria apontado preocupação com o tema. "Não sei se é verdadeira que haveria uma articulação no STF para soltura do Cunha", disse o juiz em mensagem de dezembro de 2016.

A defesa faz, então, uma relação com o fato de, no dia seguinte, o ministro Teori Zavascki, então relator da Lava Jato na Corte, ter retirado o pedido de soltura de Cunha da pauta.

Os advogados também comentaram se as mensagens envolvendo Moro seriam verdadeiras ou não. "[A tese] é inábil, pois as provas estão à disposição da Suprema Corte", disseram. "Convém ressaltar que nenhum procurador realizou uma confrontação séria do conteúdo das conversas, o que, por si só, evidencia que, independentemente da eventual origem ilícita, o conteúdo é íntegro."

A reportagem procurou Moro para comentar a posição dos defensores de Cunha, mas não obteve retorno até o momento. A força-tarefa da Lava Jato disse em nota apenas que "se manifestará nos autos e dentro do prazo legal". Em posicionamentos anteriores, ambos sempre colocaram em xeque a veracidade das mensagens e ressaltavam que a conduta nos processos era imparcial.

Com o pedido de anulação, a defesa de Cunha, na prática, quer que o processo seja reiniciado. Não há prazo para que o juiz Bonat se manifeste a respeito da petição do ex-deputado. Nas alegações do processo, a Lava Jato pediu a condenação de Cunha.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado no último parágrafo, Luiz Antônio Bonat é juiz federal, e não ministro. O texto foi corrigido.

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