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Operação Lava Jato

Em recurso para Temer ser preso, MP diz que grupo destrói provas desde 2017

Temer e Moreira entraram em contato um com outro "em horário bastante inusual", segundo o MP - 12.mai.2017/AFP
Temer e Moreira entraram em contato um com outro "em horário bastante inusual", segundo o MP Imagem: 12.mai.2017/AFP

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

03/04/2019 04h00Atualizada em 03/04/2019 12h42

Ao pedir ao TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) que o ex-presidente Michel Temer (MDB) volte a ser preso, o MPF (Ministério Público Federal) na segunda instância apresentou evidências de que provas estariam sendo destruídas desde 2017 e que dois dos investigados teriam se comunicado no dia em que foram presos: o ex-presidente e seu ex-ministro Moreira Franco (MDB). Os dois e outras seis pessoas foram soltos quatro dias depois.

Ontem, a Justiça Federal do Rio de Janeiro tornou Temer réu em duas denúncias apresentadas pela força-tarefa da Operação Lava Jato no estado: uma por corrupção e lavagem de dinheiro e outra por peculato (desvio de recursos públicos em benefício próprio) e lavagem. Os processos investigam um suposto esquema de propinas em obras da usina nuclear de Angra 3.

Outra ação derivada desta virou denúncia em São Paulo também ontem. A Lava Jato paulista diz que a reforma na casa de uma das filhas de Temer, Maristela, foi paga com dinheiro de propina dos desvios em Angra 3. Ele, ela e mais duas pessoas foram denunciados por lavagem de dinheiro.

Destruição de provas em 2017

Em maio de 2017, a Polícia Federal e o MPF conduziram a operação Patmos, dias depois de ser divulgado o teor da delação dos irmãos Wesley e Joesley Batista, da JBS, que comprometia, entre outros políticos, o então presidente Temer. Na ocasião, o Coronel Lima, amigo de Temer e dono da empresa Argeplan, foi um dos alvos da operação - ele agora virou réu junto com o emedebista nos dois processos de Angra 3 e também foi denunciado no caso da reforma.

Procurador tirou foto de documento que foi encontrado rasgado na casa do coronel Lima em maio de 2017 - Reprodução/MPF - Reprodução/MPF
Procurador tirou foto de documento que foi encontrado rasgado na casa do coronel Lima em maio de 2017
Imagem: Reprodução/MPF

O procurador Andrey Borges de Mendonça, do MPF em São Paulo, acompanhou o cumprimento de mandados na residência do coronel. Ele relatou que Lima "se mostrou mais agitado do que o normal" quando membros da PF se aproximaram de uma pilha de documentos que estavam em seu escritório.

"Ao se analisar tais documentos, verificou-se que se tratavam de diversos documentos que haviam sido picotados e estavam prontos para serem descartados", escreveu Mendonça, no último dia 22 de março, a seus colegas da Lava Jato do Rio. Um dia antes, Temer e Lima foram presos.

Os documentos rasgados tiveram seus pedaços reunidos novamente e foram fotografados pelo procurador.

"Alguns destes documentos rasgados faziam referência à reforma da casa de uma das filhas do então presidente Temer. Tais documentos rasgados estavam reunidos para serem descartados, a indicar possível destruição de provas", avaliou Mendonça, que se referia à residência de Maristela.

O relato do procurador do MP de São Paulo ajudou a compor tanto as denúncias apresentadas no Rio - que agora foram recebidas - quanto a peça apresentada ontem em São Paulo. Embasaram ainda o recurso da Lava Jato contra a soltura de Temer.

Segundo a denúncia em São Paulo, Temer, com o auxílio do coronel Lima e da mulher dele, Maria Rita Fratezi, pagou em espécie a obra da casa de Maristela no bairro de Alto de Pinheiros, zona oeste da capital paulista, ocorrida entre 2013 e 2015 e avaliada em R$ 1,6 milhão.

A defesa de Maristela diz que "a origem dos valores utilizados para a reforma de sua residência é lícita" e que ela "jamais participou de qualquer conduta voltada à lavagem de
dinheiro".

Destruição de provas em 2019

Ao reforçar o pedido de prisão de Temer, o procurador Eduardo El Hage, um dos comandantes da Lava Jato no Rio, indicou que novas tentativas de destruição ou ocultação de provas se verificaram no dia em que o ex-presidente e outras nove pessoas foram detidas.

Ele escreveu, no recurso ao TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região), que o coronel Lima "tentou ludibriar a equipe responsável pela busca e apreensão, escondendo dois aparelhos celulares sob a almofada do assento do sofá em que se encontrava".

31.mai.2017 - O coronel reformado da PM de São Paulo João Batista Lima Filho, amigo do presidente Michel Temer e acusado de ser "laranja" dele - Jefferson Coppola/Folhapress - Jefferson Coppola/Folhapress
31.mai.2017 - O coronel reformado da PM de São Paulo João Baptista Lima Filho, amigo deTemer
Imagem: Jefferson Coppola/Folhapress

O MPF diz ainda que Lima se recusou a informar a senha dos aparelhos. "Tratando-se de nova tentativa de um integrante da organização criminosa de suprimir provas à instrução criminal, fundamento suficiente para a decretação de prisão preventiva."

Uma funcionária de Vanderlei de Natale, outro empresário próximo a Temer que foi preso, também escondeu um notebook durante a ação de busca e apreensão em 21 de março. "Naturalmente, a funcionária, ao tentar dificultar a coleta de provas pela equipe, não agia apenas em nome próprio, tendo sido provavelmente orientada por seu patrão para tanto", escreveu o procurador.

Conversa na madrugada

Temer e Moreira também saberiam antecipadamente da operação que os prendeu, suspeita o procurador. Ele cita que, na madrugada de 21 de março, "em horário bastante inusual", eles entraram em contato um com o outro.

"Não se sabe se conseguiram se falar naquela madrugada por meio de outros aparelhos celulares ou outros meios de comunicação", ressalta o procurador.

Contato entre Temer e Moreira foi registrado na madrugada de 21 de março - Reprodução/MPF - Reprodução/MPF
Contato entre Temer e Moreira foi registrado na madrugada de 21 de março
Imagem: Reprodução/MPF

Entre 26 de dezembro e o dia em que foram presos, Temer e Moreira nunca se falaram após as 22h, indica o MPF, lembrando que a maioria das 27 comunicações ou tentativas no período aconteceram à tarde.

Sobre os contatos entre os dois emedebistas na madrugada de 21 de março, a defesa de Temer declarou ver a situação como "natural", por eles serem do mesmo partido.

Em nota, o advogado Eduardo Carnelós disse que a relação entre os políticos "nada tem de ilegal ou ilegítima". "São ambos quadros importantes do MDB, sendo Temer o seu presidente licenciado, e Moreira, o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, e é absolutamente natural que mantenham contatos frequentes, sem que isso indique alguma atitude escusa. Mais uma vez, pretende-se tornar criminosa a prática política no Brasil, o que é inadmissível!"

Já a defesa de Moreira diz que, "se o Ministério Público Federal precisa de conjecturas sobre uma ligação telefônica, posterior ao pedido de prisão cautelar, para subsidiar seu recurso, vê-se que estão em desespero processual." A nota é assinada pelo advogado Antônio Sérgio de Moraes Pitombo.

Réu no "caso da mala"

Além da denúncia apresentada em São Paulo e dos casos em que virou réu no Rio, Temer também já tinha se tornado réu em outra ação na semana passada, no processo que apura se ele era um dos beneficiários de propina da empresa JBS. É o "caso da mala", em que o ex-assessor de Temer e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (MDB) foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil das mãos do executivo da companhia Ricardo Saud.

A denúncia foi apresentada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot em 2017. Como Temer ainda era presidente e detinha foro privilegiado, o STF (Supremo Tribunal Federal) submeteu a investigação ao crivo da Câmara dos Deputados, que barrou a denúncia. Com a saída de Temer, a denúncia foi encaminhada à primeira instância.

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