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Fósseis de 30 milhões de anos indicam 'Amazônia mineira', descobre biólogo

Do Jornal da Unicamp

26/08/2013 06h00

Para quem conhece o interior "montanhoso" de Minas Gerais, onde a temperatura é amena, até faz frio, fica difícil imaginar uma floresta quente e úmida ali, com características parecidas às da Amazônia. Uma pesquisa do Instituto de Geociências da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) analisou fósseis de plantas que existiram no centro-sul do Estado, para reconstruir como era o clima da região há cerca de 30 milhões de anos. A "Amazônia mineira" que existiu ali pode ter registrado temperatura média anual de até 28ºC e grande concentração de chuvas - ela não é como a floresta Amazônica de hoje, mas uma ancestral da Mata Atlântica.

A descoberta faz parte da tese de doutorado do biólogo Jean Carlo Mari Fanton, sob orientação da professora Fresia Soledad Ricardi Torres Branco, na área de paleobotânica, uma das subdivisões da paleontologia voltada ao estudo dos fósseis de plantas.

Durante a pesquisa, foram analisados 64 fósseis de folhas de 25 tipos diferentes de angiospermas, as plantas com sementes protegidas por frutos, da região das bacias de Gandarela e Fonseca, entre as cidades de Ouro Preto, Mariana e Belo Horizonte, perto da Serra do Caraça. Ele usou tanto os acervos do Museu de Ciências da Terra, e do Departamento de Geologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), como também fez coletas de fósseis na região.

Trata-se de uma região com potencial paleontológico pouco estudada, cujas folhas fósseis ficaram preservadas em depósitos de rios e lagos, resultado de um processo especial e natural de preservação. "Esse tipo de estudo é importante para conseguir entender o nosso clima de hoje e tentar fazer previsões, cenários futuros, sobre as mudanças climáticas. Esta discussão é pertinente, pois a humanidade está queimando combustíveis fósseis em um ritmo acelerado, sem conhecer muito bem as consequências deste aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera."

O biólogo escolheu estudar as angiospermas porque "várias famílias deste grupo estão associadas a condições específicas, tornando-as bons indicadores climáticos, como é o caso das famílias tropicais". As angiospermas formam hoje o maior grupo de plantas, com mais de 250 mil espécies estimadas, vivendo em todos os tipos de ambientes. Mas a sua maior diversidade é encontrada justamente nas florestas da região tropical.

Pistas

Há 30 milhões de anos, na transição do Eoceno para o Oligoceno, a disposição dos continentes era outra, afetando na dinâmica do clima: a Cordilheira dos Andes estava se levantando, importantes rios ainda corriam para o oceano Pacífico, as Américas do Norte e do Sul estavam separadas, não havia tanto gelo nos polos, o mar avançava sobre regiões do Norte e do Nordeste do Brasil e a Antártida tinha acabado de se desconectar da América do Sul. Além disso, havia grande concentração na atmosfera de gás carbônico (CO2), resultado da intensa atividade tectônica daquele período.

Os fósseis coletados foram analisados com estereomicroscópios e microscópios, podendo observar a cutícula das folhas: glândulas e pelos, por exemplo. Verdadeiros "carimbos" e "impressões" foram deixados nas rochas, revelando, em detalhes, a morfologia da epiderme, além da forma de suas folhas. 

"A estrutura auxilia a entender o ambiente no qual a planta habitou. As formas encontradas foram moldadas pela seleção natural, para que a espécie vivesse o melhor possível naquele ambiente", explica o pesquisador.

A existência de folhas grandes e largas, com ápice estreito e alongado, indica que chovia muito na região, segundo comparação com espécies das mesmas famílias - com a evolução, as formas e estruturas mais vantajosas foram sendo selecionadas. Em florestas tropicais úmidas, por exemplo, as plantas têm folhas em formato de "pingadeiras" para conduzir as gotas de água até o solo, para serem usadas depois, diferentemente do que acontece com plantas de regiões mais frias, como as tundras.

O biólogo analisou o tipo morfológico das folhas, as nervuras encontradas, entre outros elementos, para identificar a família à qual pertenceram e, para estimar as temperaturas, comparou essas folhas fósseis com as folhas de outras espécies de angiospermas semelhantes, que existem conforme algumas condições específicas de temperatura.

Ancestrais

Embora as plantas do passado guardem diferenças em relação às de hoje, elas compartilham ancestrais com várias espécies que atualmente povoam a Mata Atlântica, das famílias das mirtáceas (como jabuticabeiras e goiabeiras) e das leguminosas (como o guapuruvu e o pau-brasil), entre outras. "Provavelmente, tínhamos em Minas Gerais uma floresta sempre verde, parecida com a floresta Amazônica, ou com a floresta Atlântica tropical ombrófila que temos na metade Norte do Brasil, em condições quentes e úmidas."

Com a elevação de parte do território brasileiro, entre as transformações registradas ao longo de milhares de anos, essa região de Minas Gerais ficou mais fria e menos úmida. Hoje, a média anual de temperatura ali varia de 17ºC a 22ºC, bem abaixo da possível média de 28ºC de 30 milhões de anos atrás.

"Naquela época, provavelmente, existiram florestas tropicais úmidas na região Sudeste. Isso pelo tipo de folhas que analisei, do mesmo tipo morfológico que encontramos na região Amazônica. Não era a Amazônia moderna, mas, sim, uma floresta com características ambientais semelhantes, em outra região do país, e precursora da atual Mata Atlântica."

O registro mais antigo de angiospermas é de 140 milhões de anos atrás, quando ainda os dinossauros e as gimnospermas, as plantas com semente desprotegida, reinavam absolutos na Terra. Somente entre 100 e 60 milhões de anos atrás é que as angiospermas e os mamíferos passaram a dominar os ambientes.