Radiografia dos coletes amarelos
Neste sábado (2) ocorrerá o "Ato 12" do movimento dos coletes amarelos que há dois meses e meio, saídos de vários lugares, manifestam em Paris e em várias grandes e médias cidades francesas.
Variados programas de debate da TV e rádios (bastante influentes no país), artigos de jornais e revista, analisam o movimento desde meados de novembro. Paralelamente, o presidente Macron iniciou, pelo país afora, uma série de encontros com os prefeitos para discutir ouvir e discutir as reivindicações de cada um.
Persistem, no entanto, dois problemas correlatos observados desde que os coletes amarelos começaram a manifestar: a ausência de liderança organizada e a multiplicidade de queixas e demandas dos manifestantes.
Nos últimos dias, jornais e revistas apresentam os resultados de investigações extensas de especialistas que oferecem um perfil mais definido dos coletes amarelos e de seus pleitos.
Como outros jornais, o Le Monde publicou algumas dessas análises. No plano social aparecem as características regionais (habitantes de zonas rurais e de pequenas e médias cidades), salariais e profissionais (dois terços dos manifestantes têm renda familiar inferior à renda média nacional, a maioria exerce profissões precárias) e educacionais (a adesão ao movimento é inversamente proporcional aos anos de estudo). Traços consistentes com os números que mostram uma maior representação das mulheres e dos idosos entre os manifestantes.
Em seguida se alinham as particularidades políticas. Assim, 55% dos coletes amarelos estão manifestando nas ruas pela primeira vez e 61% não se situam nem à direita, nem à esquerda. Segundo os especialistas da Universidade de Grenoble que organizaram esta pesquisa, os dados mostram que a maioria dos manifestantes não é manipulada pelos partidos ou organizações sindicais.
Mas também não é despolitizada, visto que a maior parte se interessa "bastante" ou "muito" pela política nacional. Enfim, a maioria dos coletes amarelos é hostil à globalização e pouco interessada pela ecologia.
Em suma, trata-se de um movimento que agrupa setores excluídos e abandonados pelos partidos políticos e pelas instituições tradicionais.
Mais concretamente, os coletes amarelos e Emmanuel Macron se estranham: só 4% dentre eles votaram no atual presidente nas presidenciais de 2017. O restante se absteve, votou na sua adversária, Marine Le Pen, ou votou nele como um mal menor no segundo turno.
O ponto é importante e merece uma análise mais ampla. A 5ª República inaugurada por De Gaulle em 1958 conheceu varias mudanças ao longo dos anos. A partir de 2002, o mandato presidencial passou de 7 para 5 anos, coincidindo assim com o mandato legislativo dos parlamentares e criando a chamada "presidência de legislatura". Realizadas logo depois das presidenciais, as eleições legislativas têm conduzido ao Parlamento uma maioria de deputados favoráveis ao presidente recém-eleito.
Resultado o primeiro-ministro é sempre partidário do presidente e o poder central -- decisivo na França -- fica monopolizado por cinco anos pela mesma maioria política. Chova ou faça sol, com ou sem greves e manifestações, nada mexe em Paris.
Acresce que Macron, apesar de ter sido anteriormente militante e ministro do governo socialista, nunca havia exercido um mandato eletivo antes de chegar à presidência. Eleito aos 39 anos presidente de um dos grandes países ocidentais, Macron durante muito tempo, se achou, pensando que tinha carta-branca para reformar ao seu gosto um país complicado e uma sociedade habituada à revoltas.
Os próximos dias e semanas irão mostrar se Macron aprendeu a lição que lhe está sendo duramente infligida. Há setores que estão descrentes. Na semana passada, o semanário "L'Express" publicou uma capa com título em forma de pergunta: "A França é ingovernável?"
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