Matadores usam bilhetes para despistar polícia na fronteira com o Paraguai
Bilhetes deixados em locais de assassinatos atribuídos ao crime organizado são apontados pelas autoridades e por especialistas como um recurso para despistar a polícia nas investigações dessas mortes nos últimos meses na fronteira entre Brasil e Paraguai.
Um levantamento feito pelo UOL identificou ao menos seis crimes com essas características em meio às 28 mortes ligadas ao narcotráfico nos últimos três meses —média de um homicídio a cada três dias.
O último caso ocorreu no dia 17 deste mês, com a localização de um corpo em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, ao lado de uma 'confissão': "Matei 3 meninas inocentes. Fique de exemplo", dizia o texto. O recado fazia referência às vítimas da chacina ocorrida na cidade paraguaia no dia 9.
Especialistas veem relação entre essa prática com uma possível tentativa do PCC (Primeiro Comando da Capital) de desvincular a facção criminosa paulista das investigações relacionadas aos assassinatos na divisa com o Paraguai.
O próprio MP-SP (Ministério Público de São Paulo) informou ter captado uma mensagem por meio do serviço de inteligência do órgão assinada por integrantes do PCC no sistema prisional, que negam ligação nos crimes sob a alegação de que não matam "pessoas inocentes".
Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, vê a escalada da violência como uma consequência de uma guerra travada entre grupos rivais. Entre eles, o próprio PCC, que tem buscado estabelecer um controle na região.
O PCC está querendo consolidar ainda mais o seu domínio no Paraguai. Mas há outras facções tentando se estabelecer. São elementos de conflito que acabam resultando em assassinatos. A utilização desse recurso [uso de bilhetes] é uma forma da facção mascarar a autoria dos crimes. Até que ponto o PCC quer assumir que está comprando uma briga com autoridades paraguaias e com facções rivais?
Rafael Alcadipani, sobre o uso de bilhetes em assassinatos no Paraguai
Contudo, Alcadipani entende que a prática também pode auxiliar a investigação, ainda que o objetivo seja outro. "Com o bilhete, o autor pode ser identificado por deixar um rastro de DNA na cena do crime", analisa.
O juiz federal aposentado Odilon de Oliveira, encarregado por processos ligados ao crime organizado na fronteira entre Brasil e Paraguai por mais de 30 anos, entende que os bilhetes tentam relacionar os casos a um grupo conhecido como "Justiceiros da Fronteira", que assumia assassinatos relacionados a suspeitos de envolvimentos em roubos. "Inicialmente, há essa intenção de despistar as autoridades. Mas a finalidade principal é a intimidação das testemunhas e das próprias autoridades", analisa.
Contudo, vê a conduta também como uma forma de intimidação relacionada à atuação do próprio PCC. "O que está por trás disso não é o crime comum. Essa matança está vinculada ao PCC e a essa violência histórica na fronteira, que sempre foi ligada ao tráfico de drogas e de armas", argumenta.
Assassinatos com bilhetes
- 1º de agosto - Os irmãos Robson e Jeferson Martinez de Souza, de 19 e 21 anos, foram mortos ao serem atingidos por mais de 30 disparos em Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Ao lado dos corpos, a polícia encontrou um bilhete citando "roubos".
- 24 de agosto - Derlis Alen Mendosa, 23, e Guido Villalba Aquino, de 27 anos, foram mortos a tiros em um atentado na frente de uma casa em Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Outras três pessoas ficaram feridas. A polícia uma mensagem: "Não roubar".
- 25 de setembro - Rogério Laurete Buosi, de 26 anos, foi morto com 13 tiros dentro da própria casa em Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Ao lado do corpo, foi encontrado um recado: "Não roubar na fronteira".
- 27 de setembro - O corpo de Carlos Limar de Souza Lima, 38, foi encontrado próximo ao quartel do Exército paraguaio em Pedro Juan Caballero com sinais de tortura e um corte no abdômen. A cabeça foi decapitada e encontrada em um saco plástico perto de um bilhete, que dizia: "Nós do crime estamos deixando claro que não iremos mais admitir covardias cometidas por esses justiceiros".
- 12 de outubro - O policial paraguaio Hugo Ronaldo Acosta, 32, foi assassinado dentro do próprio carro a caminho de casa, em Pedro Juan Caballero. No local do crime, foi deixado o recado: "Para de oprimir a população lá dentro porque vamos pegar vocês como pegamos anteriormente os companheiros seus".
- 17 de outubro - Após uma ligação anônima, a polícia encontrou o corpo do paraguaio Derlis David Sanchez Ayala, de 23 anos, com um ferimento a bala na cabeça em um terreno baldio de Pedro Juan Caballero. Ao lado do corpo, outro recado: "Matei 3 meninas inocentes. Fique de exemplo".
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